Postagens foram classificadas como enganosas pelo ComprovaArte/Comprova
O artigo citado não passou pelos protocolos básicos para ser definido como um estudo acadêmico científico, como a submissão aos comentários e observações de colegas da área.
Procurado pelo Comprova, o deputado federal disse que ele e sua equipe apenas publicaram uma matéria de uma revista. Já a página Brasil Sem Medo não respondeu aos nossos questionamentos por e-mail até a publicação desta verificação.
O Comprova classificou a postagem como enganosa por atribuir de forma incorreta dados sem comprovação a uma instituição renomada, com a intenção de distorcer a realidade e levar o leitor a uma conclusão equivocada.
O Comprova buscou a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), especialistas em pesquisas científicas, para analisar a maneira como o estudo foi produzido e também dados oficiais sobre os resultados de medidas sanitárias divulgados.
“As opiniões expressas neste documento são dos autores e não necessariamente das instituições às quais os autores são filiados”, diz a abertura do artigo. Dos três autores, apenas um, Steve Hanke, tem relação com a universidade como professor de economia. Os outros dois, Jonas Herby e Lars Jonung, também economistas, são membros de instituições na Suécia e Dinamarca sem relação com a universidade Johns Hopkins.
O fato de um autor trabalhar para uma instituição de ensino não garante que esta apoie todo e qualquer material que ele venha a produzir, como explica o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Renato Janine Ribeiro. “Para você dizer que é um estudo de uma determinada universidade você tem que ter o aval dessa universidade. Não basta apenas ter alguma relação com essa universidade.”, afirma o professor.
“Você faz um estudo, ele é proposto a alguma revista ou algum periódico, depois ele é avaliado, eventualmente surgem críticas, pedem para o autor refazer ou analisar e responder as críticas e somente depois, no final disso, o estudo é publicado. E somente nessa altura você pode dizer que o estudo está terminado e que é efetivamente um estudo terminado e publicado”, como explica o professor Renato Janine.
Mesmo descrevendo o artigo como um “trabalho em andamento”, os autores foram criticados por pesquisadores cujos estudos serviram como base para a pesquisa. Proposto como uma meta-análise, ou revisão de literatura, onde o autor se propõe a condensar uma grande quantidade de dados e informações coletados por outros autores a fim de obter um dado definitivo, ou pelo menos fazer uma análise dos dados coletados em comparação aos demais estudos, o trabalho citado na postagem tem pouca amplitude e diversidade. Dos 34 estudos usados como base, 12 têm o mesmo status de “trabalho não finalizado”, 14 foram feitos também por economistas sobre um tema de saúde pública e sete usam a mesma base de dados. O principal artigo usado na pesquisa, na verdade, aponta benefícios para o lockdown.
Nas redes sociais, a autora desse estudo base principal disse que os três “já tinham a tese pronta” e que apenas colocaram dados e pesquisas para confirmar essa tese sem realmente ir a fundo nos trabalhos.
Outro problema apontado nas redes sociais por especialistas em análises de dados é a forma como os autores da pesquisa usaram tabelas e dados. Economista da Universidade de Munique, Andreas Backhaus escreveu que “deram peso desproporcional aos trabalhos com o resultado que eles queriam” distorcendo o número final, informação que o próprio autor reconhece nesse documento com respostas sobre questionamentos que ele publicou em suas redes.
A exclusão de dados sem um critério técnico claro também chamou a atenção do epidemiologista da Universidade de Wollogong, na Austrália, Gideon Meyerowitz. Ele trabalha com doenças crônicas em Sydney e ponderou que os autores “excluíram todos os trabalhos robustos conhecidos sobre lockdown, deixando apenas trabalhos obscuros”, o que também mostra uma disposição dos autores em usar números que chegassem a um resultado determinado antes da análise.
Um estudo de 2020 do Imperial College, de Londres, já apontava que cerca de 120 mil vidas haviam sido salvas com as medidas de restrição na Europa. No mesmo ano, a Organização Mundial da saúde também divulgou um estudo com os benefícios do lockdown em todo o mundo.
Já a revista Nature publicou um extenso material em que aponta que os lockdowns reduziram em média 80% das transmissões do vírus. Dois professores de matemática da Universidade de Barcelona estimaram uma queda no número de casos e de hospitalização como efeito das medidas restritivas, incluindo o lockdown. Produzido por especialistas de diversas áreas, este estudo calculou o impacto do lockdown dependendo da intensidade e da duração. Todas as publicações foram submetidas aos pares e somente depois de revisadas foram publicadas.
Em uma carta conjunta, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e a Associação Médica Brasileira (AMB) abordaram a efetividade das medidas restritivas impostas em outros países e a necessidade de se repetir no Brasil. Já o International Journal of Infectious Diseases, publicou um estudo mostrando a redução no números de casos graças ao uso de máscaras, ao distanciamento social e o lockdown.
Em outras oportunidades, o Comprova mostrou como as medidas sanitárias foram efetivas no combate a proliferação do coronavírus, como ao mostrar que vídeo usava informações falsas sobre lockdown, ou quando verificou vídeo divulgado que atribuiu falsamente suicídio ao lockdown. Também checamos informações sobre o distanciamento social e a efetividade das máscaras aqui, e também nesta e nesta checagem do Comprova sobre o uso e eficiência das máscaras.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
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