STF sanciona decisão que obriga governo federal reedite notas sobre vacinação infantilMarcello Casal Jr / Agência Brasil

Brasília - O Supremo Tribunal Federal (STF) sancionou, nesta sexta-feira, 18, a decisão do ministro Ricardo Lewandowski que determinou que o governo Jair Bolsonaro (PL) reedite duas notas técnicas sobre a imunização infantil contra a covid-19, abordando a obrigatoriedade da vacina. Além disso, o colegiado também reafirmou a decisão que proibiu o Executivo de usar o canal Disque 100 para propagandear mensagens contrárias à vacinação contra a doença causada pelo Sars-cov-2.

A discussão sobre o tema só foi finalizada às 23h59 no Plenário Virtual, ferramenta em que os ministros depositam seus votos à distância, longe dos holofotes da TV Justiça. Acompanharam integralmente o voto de Lewandowski as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber e os ministros Dias Toffoli, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux. André Mendonça e Kassio Nunes Marques apresentaram ressaltas e divergências ao entendimento de Lewandowski, mas, ao fim, também seguiram o relator.
Em seu voto, Lewandowski destacou que as medidas consideram, especialmente, a necessidade de esclarecer, "adequadamente", os agentes públicos e a população brasileira quanto à obrigatoriedade da imunização contra a Covid-19. O Supremo decidiu, antes mesmo do desenvolvimento de um imunizante para a doença, pela possibilidade da vacinação compulsória, "implementada por meio de medidas indiretas", como a restrição de certas atividades ou ao acesso a determinados lugares.
Levando em conta que a vacina é principal instrumento do controle da pandemia, Lewandowski afirmou em seu voto que "cabe ao governo federal, além de disponibilizar os imunizantes e incentivar a vacinação em massa, evitar a adoção de atos, sem embasamento técnico-científico ou destoantes do ordenamento jurídico nacional, que tenham o potencial de desestimular a vacinação de adultos e crianças contra a Covid-19".
O ministro ainda registrou que o Brasil "ainda apresenta uma situação epidemiológica distante do que poderia ser considerada confortável, inclusive em razão do surgimento de novas variantes do vírus".

Ao defender a reedição de duas normas editadas pelo Ministério da Saúde, chefiado por Marcelo Queiroga, e pelo Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, titularizado por Damares Alves, Lewandowski destacou a "ambiguidade" com que foram redigidos os textos quanto à obrigatoriedade da vacinação. Segundo o ministro, as notas podem ferir os preceitos fundamentais que asseguram o direito à vida e à saúde, além de afrontarem entendimento consolidado pelo Plenário do Supremo sobre a vacinação compulsória.

"Com efeito, a mensagem equívoca que transmitem quanto a esse ponto, em meio a uma das maiores crises sanitárias da história do país, acaba por desinformar a população, desestimulando-a de submeter-se à vacinação contra a Covid-19, o que resulta em um aumento do número de infectados, hospitalizados e mortos em razão da temível moléstia", ressaltou o ministro.

Na avaliação de Lewandowski, as notas técnicas, com informações "dúbias e ambivalentes" sobre a compulsoriedade da imunização, "prestam um desserviço ao esforço de imunização empreendido pela autoridades sanitárias, contribuindo para a manutenção do ainda baixo índice de comparecimento de crianças e adolescentes aos locais de vacinação".

"Não se mostra admissível, pois, que o Estado, representado pelos Ministérios da Saúde e da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, agindo em contradição com o pronunciamento da Anvisa, a qual garantiu formalmente a segurança da Vacina Comirnaty (Pfizer/Whyet) para crianças, além de contrariar a legislação de regência e o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal, venha, agora, adotar postura que desprestigia o esforço de vacinação contra a Covid-19 , sobretudo porque, com tal proceder, gerará dúvidas e perplexidades tendentes a impedir que um número considerável de menores sejam beneficiados com a imunização", registra trecho do voto do ministro.

Em relação ao Disque 100, que passou a ser usado para reclamações sobre a exigência do passaporte da vacina, Lewandowski classificou como "grave" a possibilidade de "desvirtuamento" do canal para denúncias de violações de direitos humanos. Segundo o ministro, a nota técnica do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos que permitiu o uso do Disque 100 para as reclamações sobre exigência de comprovante de imunização vai na contramão do que o Supremo declarou constitucional: "a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares" imposta àqueles que se negam, sem justificativa médica ou cientifica, a tomar o imunizante ou a comprovar que não estão infectadas".

Ressalta e divergência

Os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça apresentaram seus votos sobre o caso pouco tempo antes de o julgamento ser encerrado. Nunes Marques votou com ressalvas e Mendonça com uma divergência em relação ao entendimento de Lewandowski. Ambos os ministros foram indicados recentemente à Corte pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), que trava embates contra as vacinas da covid-19

Kassio registrou que acompanhava o relator, mas registrou em voto-vogal que "as informações acerca da matéria ainda são incipientes e não permitem uma conclusão exata". O ministro não detalhou a quais "informações" se referia. O Supremo já fixou decisão sobre a compulsoriedade da vacina. Os imunizantes são aplicados em todo mundo, com segurança e eficácia comprovadas, após intenso trabalho de diferentes cientistas.

Em outro trecho de seu voto, Kassio disse que vive-se "um momento de incertezas em que o medo de errar se sobrepõe à cautela necessária para a análise de temas tão sensíveis". Com relação ao Disque 100, o ministro afirmou que o uso do canal para casos relacionados a covid-19 poderia gerar "eventual congestionamento" do serviço público. O voto de Lewandowski destacou que o que o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos classificava como possível violação aos direitos humanos, no caso, a exigência do passaporte da vacina, já foi validado pela Corte máxima.

Já Mendonça apresentou divergência com relação a uma questão técnica e preliminar, analisada antes do mérito do caso, defendendo o não-conhecimento da ação analisada pelo STF. Por outro lado, o magistrado ponderou que, casos os demais colegas de corte chegassem a apreciar a ação em si, votava no sentido de confirmar a medida cautelar por Lewandowski.