Delegada disse que não se pode afirmar que Arruda foi vítima de crime de ódio Reprodução

O Ministério Público do Paraná pode solicitar mais diligências nas investigações sobre o assassinato a tiros do tesoureiro do PT Marcelo Arruda pelo bolsonarista Jorge Guaranho, e inclusive enquadrar em outra capitulação jurídica a conduta do agente penitenciário indiciado nesta sexta-feira, 15, pela Polícia Civil por homicídio duplamente qualificado. A avaliação é de advogados consultados pelo Estadão, que explicam que o entendimento da Promotoria não é vinculado às conclusões da autoridade policial.
A delegada Camila Cecconello, presidente do inquérito sobre o crime que ocorreu no último sábado, 9, em Foz do Iguaçu imputou ao agente penitenciário homicídio qualificado por motivo torpe e causar perigo comum. Segundo ela, não há provas suficientes de que Guaranho queria cometer um "crime de ódio contra pessoas de outros partidos". Ainda segundo Camila, "é complicado" dizer que o "homicídio ocorreu porque o autor queria impedir o exercício dos direitos políticos daquela vítima".
A investigação foi concluída cinco dias depois da morte de Arruda, sendo que ainda não ficaram prontos resultados de perícias solicitadas pela Polícia. O celular de Arruda foi apreendido somente nesta quinta-feira, 14.
A advogada Carla Rahal Benedetti, professora de Direito Penal e Processo Penal, explica que a confecção relatório pela Polícia Civil, antes do término das perícias "é um tanto contrário às práticas de investigação e conclusão de inquérito". Mas ela alerta que o Ministério Público pode entender que são necessárias mais evidências ou até alterar a capitulação jurídica.
O Ministério Público é o titular da ação penal. Cabe a ele apresentar ou não denúncia contra Guaranho ou, ainda, requisitar novas investigações à Polícia.
Na mesma linha, o advogado Lucas Serafim diz que "não é comum" a finalização de investigações antes da entrega dos laudos policiais, mas indica que, caso a autoridade policial, tenha considerado "suficiente" o conjunto probatório produzido, pode-se dar por encerradas as apurações.
No entanto, Serafim diz que a investigação é preliminar e assim, diante do apurado, o Ministério Público pode pedir novas diligências investigativas, se entender necessário, ou propor a ação penal competente. "O promotor não é vinculado às conclusões da autoridade policial principalmente no que diz respeito ao enquadramento jurídico. Caso entenda haver um conjunto de provas que dê suporte para a ação penal, o MP poderá enquadrar os fatos na capitulação jurídica que julgar pertinente", explica.
Segundo o especialista, a investigação sobre a motivação do crime — se foi praticado em razão de divergência política — "está intimamente ligada" aos fatos que foram apurados antes do homicídio em si.
O advogado Raul Abramo Ariano explica ainda que o objetivo do trabalho de investigação é "trazer contornos mais completos o possível do cenário fático, a fim de subsidiar o Ministério Público com elementos para a conformação da opinião sobre o crime". No entanto, Ariano também lembra que a conclusão da investigação policial não vincula a decisão do Ministério Público sobre a imputação que será feita, apenas a ampara com os elementos indiciários produzidos.
O advogado contesta uma das frases usadas pela delegada Camila Cecconello de que o que há no inquérito é a "alegação da esposa", mas não a "alegação da subjetividade do autor, então é difícil falar que há um crime de ódio".
"A conclusão ignora que a aferição de elementos atinentes à subjetividade de um autor de crime não se faz tão somente por meio de sua própria autoafirmação. Se assim fosse, nenhum crime doloso seria punido quando o autor nega sua vontade de cometê-lo É necessária uma análise de contexto", diz.