Ex-prefeito de Tamandaré Sérgio Hacker e a mulher Sari Corte RealReprodução

A terceira turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a decisão da Justiça Trabalhista de Pernambuco que condenou o ex-prefeito de Tamandaré (PE) Sérgio Hacker e a mulher Sari Corte Realenvolvidos na morte do menino Miguel Otávio, de 5 anos, em junho de 2020, ao pagamento de R$ 386 mil por danos morais coletivos pela contratação irregular de empregadas domésticas.
O casal era empregador de Mirtes Regina Santana e Marta Santana, mãe e avó do menino Miguel Otávio, que morreu ao cair de um prédio após ser deixado sozinho no elevador quando estava sob os cuidados de Sari, em Recife, em junho de 2020.
Por unanimidade, os ministros do TST rejeitaram recurso protocolado pela defesa do casal, que pretendia derrubar a decisão de primeira instância. 
Segundo a acusação do Ministério Público do Trabalho (MPT), três empregadas foram contatadas para trabalhar na casa do ex-prefeito, pagavam os salários com o dinheiro da prefeitura de Tamandaré, mas não recolhiam o pagamento do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), não pagavam o 13º salário, horas extras ou o respeitavam o direito a férias.

O órgão ouviu pessoas que trabalhavam no prédio e constatou diversas irregularidades na situação das três empregadas domésticas da casa. Além disso, foi constatado que as funcionárias prestaram serviços durante o período da pandemia de covid-19, mesmo havendo infectados no apartamento, sem terem recebido equipamentos de proteção individual, como máscaras.
Com base nas investigações, o MPT ajuizou ação civil pública, alegando que os trabalhadores trabalharam durante anos sem direitos trabalhistas básicos e que sua detenção viola totalmente as normas de saúde pública, colocando em risco a saúde deles e de seus entes queridos.
Por esses e outros motivos, foi pedido que o casal fosse condenado a cumprir várias obrigações e pagar R$ 2 milhões de indenização. O juízo de primeiro grau arbitrou a indenização em R$ 386 mil, e a sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 6ª região.
A decisão do TST que manteve a indenização também ressaltou que, quando Miguel caiu do nono andar, o menino estava sob tutela temporária da patroa. Isso, na avaliação do ministro do tribunal Alberto Bastos Balazeiro, "tratou-se de violência inequívoca à integridade psíquico-social das trabalhadoras, cujo efeito danoso (a morte da criança) vai de encontro aos interesses sociais e aos valores jurídicos mais básicos de todo Estado Democrático de Direito, os direitos à vida, à infância protegida e a um ambiente de trabalho digno e protegido".
O TST também concluiu que o casal reproduzia um padrão social discriminatório e racista associado às empregadas domésticas, cuja contratação era fraudulenta e paga indevidamente pelos cofres do Estado.

Além disso, a exigência de trabalho durante a quarentena da covid-19 e a negligência quanto às normas de segurança do trabalho, que resultou na morte do menino, foram consideradas gravíssimas violações humanitárias trabalhistas que agrediram drasticamente o patrimônio imaterial de toda a sociedade brasileira.
Alberto Bastos Balazeiro, relator do caso, também ressaltou que a morte do garoto Miguel revela uma dinâmica de trabalho permeada por atos "estruturalmente discriminatórios", que "gira em torno da cor da pele, do gênero e da situação socioeconômica” das trabalhadoras domésticas.

O ministro Maurício Godinho Delgado classificou o caso como chocante e desumano. "Lamentavelmente, as elites brasileiras, mesmo após quase 400 anos de escravidão, não retiraram a escravidão dos seus corações e das suas mentes e, por isso, reproduzem o racismo estrutural nas instituições, nas práticas cotidianas e na sociedade civil", afirmou.
Morte de Miguel
Miguel Otávio Santana da Silva tinha 5 anos e morreu ao cair do 9º andar das Torres Gêmeas, prédio de luxo no centro do Recife. A criança havia acompanhado a mãe, Mirtes Renata, que trabalhava como empregada doméstica na residência dos Corte Real.

Mirtes havia descido para passear com o cachorro da família e teve que deixar a criança sob os cuidados da patroa, que estava fazendo as unhas.

A criança sentiu falta de Mirtes e entrou no elevador sozinho para ir atrás da mãe. Imagens capturadas pelas câmeras de segurança mostram o momento em que Sarí desiste de tirar Miguel Otávio do elevador, aperta o botão da cobertura e deixa a criança sozinha. 
Ele então segue para o 9º andar, onde teve acesso ao hall em que ficam as condensadoras de ar-condicionados. O equipamento não aguentou o peso de Miguel, que caiu de uma altura de 35 metros.
Posteriormente, na esfera criminal, a Justiça de Pernambuco condenou Sari a 8 anos e 6 meses de reclusão pelo crime de abandono de incapaz com resultado morte. Liberada após pagamento de fiança, ela recorre em liberdade.
* Com informações da Agência Brasil