Ex-presidente Jair BolsonaroAFP
Agora, terá início o trâmite da ação penal contra o ex-chefe do Executivo e demais acusados. Somente ao final de todo o processo, que inclui uma série de oitivas e diligências - que podem ser requeridas tanto pela acusação como pela defesa -, será marcado o julgamento que pode sentenciar Bolsonaro. As acusações podem render uma pena acumulada de cerca de 40 anos de prisão.
O suposto plano incluía medidas como a elaboração de um decreto para justificar um "estado de defesa" e, potencialmente, o assassinato de Lula e do ministro Alexandre de Moraes.
O complô não teria sido consumado por falta de apoio dos principais comandantes do Exército, segundo a denúncia.
A investigação também vincula Bolsonaro aos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, quando milhares de seus apoiadores invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília, uma semana após a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A gravação mostrou, por exemplo, os acampamentos montados em frente a quartéis do Exército e atos violentos no dia da diplomação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo Moraes, "não há dúvida" da materialidade dos delitos, narrados em sequência pela PGR.
"Isso não é violência?", questionou o ministro. "Ninguém estava passeando", seguiu, indicando que é possível ver pedidos de intervenção nas imagens.
Moraes chegou a se referir ao 8 de janeiro como "uma verdadeira guerra campal". "Nenhuma bíblia é vista, nenhum batom é visto. Agora, a depredação e o ataque ao patrimônio é visto", destacou.
O ministro também indicou que servidores, policiais, foram feridos gravemente. "É um absurdo pessoas dizerem que não houve agressão (no 8 de janeiro) e consequentemente não houve materialidade", destacou.
O vídeo mostrado no Plenário da Primeira Turma mostrou o capacete de uma policial ferida no 8 de janeiro, o qual foi classificado por Moraes como símbolo da violência.
Segundo o ministro, houve uma "tentativa de golpe de estado violentíssimo", com "incivilidade total" e "violência selvagem".
O ministro prosseguiu: "Dia 8 de janeiro de 2023 foi uma notícia péssima para a democracia, para as instituições, para todos os brasileiros e brasileiras que acreditam num País melhor". Na sequência, ele disse que esse "viés da positividade" contribui para a relativização dos fatos e para que "esqueçamos que não houve um domingo no parque".
"Não foi um passeio no parque. Ninguém, absolutamente ninguém que lá estava, estava passeando", declarou. Para o ministro, a denúncia da PGR deve "comprovar materialidade dos delitos" e salientou que esses crimes foram reconhecidos pelo STF em 474 denúncias.
"A Procuradoria-Geral da República demonstrou conhecimento de Jair Messias Bolsonaro sobre o plano criminoso Punhal Verde e Amarelo, que tinha como finalidade o monitoramento e a execução de autoridades públicas brasileiras", declarou Moraes.
Na sequência, o ministro afirmou que a denúncia apontou diálogo entre o general Mario Fernandes e o ex-ajudante de Ordens Mauro Cid em 8 de dezembro de 2022, "corroborando o acompanhamento de Jair Messias Bolsonaro sobre essa operação criminosa e violenta"
Na ocasião, Moraes leu uma mensagem de Fernandes em que o militar diz: "Durante a conversa que eu tive com o presidente, ele citou que o dia 12, pela diplomação do vagabundo [Lula], não seria uma restrição. Que qualquer ação nossa pode acontecer até 31 de dezembro e tudo… Mas aí na hora eu disse: pô, presidente, mas o quanto antes… a gente já perdeu tantas oportunidades".
Em relação aos ataques à Justiça Eleitoral, Moraes disse que a PGR demonstrou que Bolsonaro sabia que não havia fraude nas urnas eletrônicas. O ministro lembrou que o ex-presidente convocou uma reunião com embaixadores "para falar mal" e "plantar notícias falsas" sobre as eleições.
"Todos se recordam que, a partir de um determinado momento, o então ministro da Defesa, general Paulo Sergio, passou a comandar no âmbito das Forças Armadas que tinha uma missão dada pelo então presidente Jair Bolsonaro. Essa missão era comprovar fraude às urnas. Era a necessidade de comprovar que a eleição era fraudulenta", disse Moraes.
Na sequência, o ministro disse que, se o golpe de Estado fosse consumado, não haveria viabilidade para a persecução penal, porque não existiria juízo para julgá-lo. Em relação à autoria dos crimes, segundo ele, é preciso aferir os indícios e identificar participação concreta de cada um.
"Penso haver indícios, ao meu ver, razoáveis em relação a cada um dos acusados", afirmou. "Temos que aferir as condutas, uma a uma, independentemente do juízo moral ou de qualquer outra natureza que nós tenhamos sobre essas pessoas. Isso não comparece no tribunal", continuou.
O magistrado acrescentou: "O que nos distingue de ditadores é que a nossa subjetividade é controlada pelas normas jurídicas".
Na ocasião, Dino rebateu o argumento de que "não morreu ninguém" nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. "No dia 1º de abril de 64, também não morreu ninguém. Mas centenas e milhares morreram depois. Golpe de Estado mata, não importa se isto é no dia, no mês seguinte ou alguns anos depois", afirmou.
Em seguida, o ministro citou o filme "Ainda Estou Aqui" e disse que a obra mostra "o caráter permanente e hediondo do desaparecimento de pessoas, de tortura, de assassinatos", que, em suas palavras, derivam de um golpe de Estado.
"É falsa a ideia de que um golpe de Estado ou uma tentativa de golpe de Estado, porque não resultou em mortes naquele dia, é uma infração penal de menor potencial ofensivo ou suscetível de aplicação, até, do princípio da insignificância", disse Dino. "Isto é uma desonra da memória nacional", acrescentou.
Segundo o ministro do STF, episódios que atentam contra a democracia são marcantes e "todos os dias serão dias da lembrança". "Não se pode de forma alguma dizer que não aconteceu nada", em referência ao 8 de janeiro e outros atos antidemocráticos narrados na denúncia da suposta tentativa de golpe gestada no governo Bolsonaro.
Fux destacou que o relator do caso no STF, Alexandre de Moraes, esclareceu, em seu voto, "quem fez o quê" na dinâmica da suposta tentativa de golpe, sendo a materialidade dos crimes demonstrada "até no telão" - em referência ao vídeo que foi exibido pelo relator para mostrar a gravidade dos crimes de 8 de janeiro de 2023.
Ao final de seu voto, Fux destacou ainda que Moraes "não deixou pedra sobre pedra e trouxe a paz necessária para receber a denúncia".
O ministro levantou uma discussão indicando que, se "fosse em tempos pretéritos, jamais se caracterizaria a tentativa como crime consumado", mas, hoje, há essa previsão na lei. "Existe o conjunto de crimes contra o Estado de Direito", apontou.
O ministro Flávio Dino completou a ponderação do colega, indicando que tal discussão, sobre atos preparatórios e atos executórios envolvendo o suposto golpe é um "debate para o final do julgamento".
Fux sinalizou ainda uma discussão sobre dosimetrias de pena. Segundo ele, as penas são tratadas na lei, e pelos bens protegidos, democracia, Estado Democrático, mas "justiça não é algo que se aprende, é algo que se sente".
A ministra frisou, assim como seus colegas, que o julgamento desta quarta, 26, é de recebimento de denúncia e "nada mais". Segundo Cármen, a Corte tem o compromisso de aceitar a acusação e verificar os fatos a partir da ação penal.
A magistrada disse que é necessário permitir que o caso seja investigado e esclarecido, para impedir outra tentativa de golpe de Estado e impedir que "essa máquina de democracia continue a reverberar". Segundo ela, o fato de ter havido mais de uma tentativa de calar as instituições é "gravíssimo". Estas, só permaneceram porque o golpe não teve sucesso, frisou a ministra
Cármen assinalou que a denúncia não é inepta e descreve os fatos criminosos. Ela destacou que a violência do 8 de Janeiro não foi "ocasional". "Impossível não ter sido planejado. Alguém planejou, tentou e executou. É preciso que o Brasil saiba o que aconteceu e quem praticou o crime tem que pagar por ele", defendeu.
"Há fatos típicos criminosos narrados, indícios de materialidade que comprovam pelo menos o conhecimento e a participação. Se essa participação é criminosa para obstar, favorecer ou realmente para ser partícipe é outra história", completou. Cármen Lúcia chegou a indicar que pediu a antecipação da diplomação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva "porque havia alguma coisa que não entendia muito bem".
"O ministro Alexandre de Moraes exibiu documentos e vídeos que mostram fatos extremamente graves e que, em tese, podem configurar os crimes de organização criminosa, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito e golpe de Estado, e ainda dano qualificado e dano a bens protegidos por lei", afirmou.
Zanin prosseguiu: "Estamos aqui diante de fatos, devidamente demonstrados e aptos a configurar, em tese, os crimes que foram narrados pela Procuradoria-Geral da República na denúncia apresentada". Em relação aos denunciados, o magistrado considerou que a Corte deverá observar, durante a instrução criminal, se a prova indiciária vai se confirmar.
O ministro também afirmou que a denúncia está "longe" de ser amparada somente em delações. "Há, sim, uma série de elementos a amparar a denúncia que estamos aqui a analisar. Longe de ser uma denúncia amparada exclusivamente em uma delação premiada, o que se tem aqui são diversos documentos, vídeos, dispositivos, diversos materiais que dão amparo àquilo que foi apresentado pela acusação", afirmou Zanin, que é presidente da Primeira Turma do STF e proferiu o seu voto por último.
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.