Prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro foi convertida para preventivaAFP

Jair Bolsonaro foi preso preventivamente pela Polícia Federal, depois de tentar violar a tornozeleira eletrônica, neste sábado (22). Horas antes de o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes decretar a prisão, Flávio Bolsonaro, filho do ex-presidente, havia convocado uma vigília na frente do condomínio em que o pai cumpria prisão domiciliar, em Brasília. Para o ministro, os dois fatos apontavam para uma possível tentativa de fuga de Bolsonaro.
Ao DIA, o jurista, professor e advogado Lenio Streck explicou que a prisão preventiva é mais grave que as medidas cautelares impostas anteriormente a Bolsonaro. “A prisão preventiva é exatamente o contrário das cautelares. Ele [Bolsonaro] estava com a cautelar, que é menos grave que a preventiva, mas como tentou romper a tornozeleira e, de algum modo, colocar a população contra o judiciário, em conluio com seu filho Flávio, aí estão os motivos para a preventiva”, disse.
De acordo com Streck, a violação das medidas cautelares faz com que Bolsonaro não tenha mais direito à prisão domiciliar. A defesa do ex-presidente chegou a entrar com o pedido, que foi negado pelo ministro Alexandre de Moraes, neste sábado. “A preventiva pode ser decretada a qualquer momento. Como ela é mais grave, isso faz com que ele já não tenha mais direito à prisão domiciliar”, apontou.
Segundo o jurista, há diversos tipos de prisão. “Existe a temporária, que é por um prazo fixo, renovável, existem as medidas cautelares – apreensão de passaporte, colocação de tornozeleira, proibição de sair do país –, e a mais grave, que é a preventiva. Toda vez que o juiz entende que pode aplicar uma medida mais leve, ele substitui a prisão preventiva pelas cautelares. Porém, quando o sujeito transgride, viola as cautelares, pronto, aí vem a mais grave, que é a prisão preventiva”, explicou.
Para Lenio Streck, a conversão da prisão de Bolsonaro é uma “decorrência lógica” e “não há grande surpresa” com o fato.
“Flávio Bolsonaro, e o próprio Eduardo Bolsonaro, a todo o tempo ficam tensionando e com isso acabam arrastando o próprio pai. Quando o Flávio Bolsonaro hostiliza a Suprema Corte, chama pessoas para imitar aqueles acampamentos, para criar um clima… Isso coloca em risco a ordem pública. Também há risco de fuga, por exemplo, a casa não é longe de embaixadas, como a dos Estados Unidos. Tem vários motivos pelos quais Alexandre de Moraes podia decretar a preventiva. Risco de fuga, garantia da ordem pública e a quebra da das cautelares: esses três elementos tornam a prisão como decorrência lógica. Não há grande surpresa com relação a isso”, afirmou.
“E para o próprio Bolsonaro muda pouco, ele estava preso, só que era domiciliar, agora ele está preso com preventiva. Agora, claro, fica mais grave porque já não é simplesmente estar em sua casa e conseguir receber determinadas visitas. Agora ele não pode mais receber”, acrescentou.
Bolsonaro ficará na sede da PF
O ex-presidente foi levado para a superintendência da Polícia Federal (PF), em Brasília, na manhã deste sábado. Ele deve ficar em uma sala de Estado, espaço reservado para pessoas do alto escalão da política. O espaço tem ar-condicionado, janela, armário e um frigobar.
Para o jurista, Bolsonaro já deveria estar em um presídio. “Legalmente, ele não poderia nem ter prisão domiciliar, do modo como ele teve. Essa é uma construção que foi feita. Legalmente, não há previsão para o caso dele receber aquela prisão domiciliar. Ele já devia estar preso preventivamente antes disso. Mas houve uma decisão do Supremo, que acabou concedendo a ele algo mais benevolente. Nesse momento, ele deveria ir para um presídio”, afirmou.
Segundo Streck, o caso do presidente Lula, que também ficou detido em uma sala de Estado da Polícia Federal, em Curitiba, em 2018, abriu precedentes para que Bolsonaro não fosse encaminhado direto para um presídio.
“Provavelmente por isso que o ministro Alexandre de Moraes tenha determinado que ele fosse para a superintendência da Polícia Federal e não para um presídio, isso quer dizzer que ele não irá para um presídio”, avaliou.
Prisão não conta para pena de 27 anos e três meses
Em setembro deste ano, Bolsonaro foi condenado pela Primeira Turma do STF a 27 anos e três meses de prisão em regime fechado por liderar uma organização criminosa em uma tentativa de golpe de Estado para se perpetuar no governo. A preventiva decretada neste sábado ainda não marca o início do cumprimento da pena de reclusão.
“A prisão preventiva não tem nada a ver com a pena. O Bolsonaro estava em prisão domiciliar não por causa do processo que ele está respondendo pela tentativa de golpe de Estado. Ele estava por outro imbróglio ligado ao Eduardo Bolsonaro. O processo grande, que ele está condenado a 27 anos e três meses, vai transitar em julgado em breve. É quando ele tem que cumprir, de fato, a pena. Coincidiu agora que ele vai emendar a prisão preventiva por um tipo de processo com o cumprimento definitivo da pena do outro processo”, explicou o jurista.
Para Lenio Streck, no caso de Bolsonaro, não cabe mais uma prisão domiciliar, mesmo que o ex-presidente esteja com a saúde debilitada. O jurista, inclusive, citou como um erro o processo do ex-presidente Fernando Collor de Mello, que foi autorizado a cumprir pena de 8 anos e 10 meses em casa sob a justificativa de problemas de saúde crônicos, além da idade avançada.
“O caso Collor está errado, é ilegal. Ele, em regime fechado, não poderia receber prisão domiciliar. Esse é um abacaxi que o Supremo vai ter que descascar. O caso Collor acaba beneficiando o Bolsonaro. O Color cumpre pena em sua casa. Não poderia! Pela lei brasileira, não existe prisão domiciliar para regime fechado”, enfatizou.
Segundo ele, os problemas de saúde não são justificativa para a prisão domiciliar. “Quando o réu está doente, as soluções são: ou um presídio com médicos, ou questão hospitalar, mas não em prisão domiciliar. Não existe essa previsão legal”, reforçou.