Eu, por exemplo, conto o tempo de muitas maneiras. Sei que o ano está chegando ao fim quando percebo que as ameixas estão surgindo no hortifruti Arte: Kiko

Na porta do estúdio de pilates, o Papai Noel decorativo me lembra do fim do ano enquanto lá dentro outros adereços dão o tom natalino ao ambiente. No comércio de Duque de Caxias, as caixinhas dos funcionários estão expostas no balcão, embaladas em papéis de presente e à espera da colaboração dos fregueses. Assim, a todo instante, a passagem do tempo vai se revelando para mim. Entre uma conversa e outra, também colho relatos que anunciam a chegada de dezembro.
Há quem sorria só de imaginar o ritual da neta de deixar cookies e leite para o Bom Velhinho e quem aceite convite para todas as confraternizações de fim de ano sem saber se sua agenda realmente permitirá tantos eventos. Por outro lado, há quem não veja mais brilho no Natal ou no Réveillon e é preciso respeitar que nem todos os corações sentem uma época da mesma forma.
Assim, entre as minhas andanças, vislumbro o tempo permeando toda a nossa vida: o que já passou, o que está presente ou o que está por vir. Pode ser especial para quem vive o hoje, medicamentoso para quem tem paciência de esperá-lo ou angustiante para quem tem pressa de vê-lo passar.
Na busca eterna por esse equilíbrio, sinto que há várias formas de sentir o funcionamento do relógio, bem diferente da que é mostrada pelos ponteiros. Eu, por exemplo, conto o tempo de muitas maneiras. Sei que o ano está chegando ao fim quando percebo que as ameixas estão surgindo no hortifruti ou quando chegam as nozes no mercado, me lembrando da nossa tradição familiar de quebrá-las na dobradiça das portas.
Também entendi que a vida mudou quando o meu sobrinho mais novo, de 14 anos, deixou o par de tênis no capacho da cozinha e percebi que ele já calça tamanho 42. Aliás, faz um tempo que eu também cresci. Pode parecer que foi uma longa trajetória até chegar aos meus 46 anos. Mas posso sentir que foi ontem que eu era ainda uma menina que ia ao shopping com a minha mãe e os meus irmãos e ficava emburrada se eles escolhessem os presentes antes de mim.
Às vezes, não sei mesmo precisar quantos anos, meses, dias ou horas se passaram. Sei que no início de 2023 os sons da tevê e dos rádios do meu pai pareciam mais altos do que agora. O ano passou e hoje é mais evidente o ritual de todas as manhãs em que ele separa o meu café sem açúcar em uma xícara. Às vezes, o que muda não é a cena, mas a forma como a gente a percebe.
Em outros momentos, a duração de um instante ultrapassa épocas. Como o momento em que a minha mãe fazia os meus sobrinhos acreditarem que o Papai Noel havia passado pela janela. Eles não precisavam ver o Bom Velhinho para ficarem eufóricos de fato. Curiosamente, isso aconteceu há alguns anos, mas o meu coração avisa que essa memória está bem viva em mim. Ainda hoje.