Arte coluna Bispo Abner 02 novembro 2025Arte Paulo Márcio

 Vivemos exaustos e confusos: tratamos descanso como prêmio, não como pilar. A agenda voa, a cabeça ferve, os afetos ficam no modo rascunho.
Descansar, no entanto, não é fugir; é recuperar nitidez. É quando a alma volta a caber no corpo e a gente enxerga com clareza o que vale e o que pesa. Jesus faz um convite que não ficou no passado: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei” (Mt 11:28). E o profeta traduz isso em ritmo: “Na calma e na confiança está a vossa força” (Is 30:15). Força não nasce de correria; nasce de ritmo.
O descanso é parte do projeto original da vida. Na criação, Deus descansa (Gn 2:2–3) e mais adiante aprendemos que “o sábado foi feito por causa do homem” (Mc 2:27) — não para nos prender, mas para nos proteger. hoje: pausas não são luxo, são engenharia.
Quando insistimos em ignorá-las, a conta chega no humor, na decisão e nas relações. Dormir bem, por exemplo, é higiene da coragem. O salmista lembra que é inútil madrugar sem medida, “pois aos seus amados Ele dá enquanto dormem” (Sl 127:2); e a sabedoria promete suavidade ao travesseiro: “quando te deitares, o teu sono será tranquilo” (Pv 3:24). A gente não perde tempo dormindo; a gente ganha condição de ser inteiro quando acorda.
Ao longo do dia, pequenos respiros devolvem o eixo: levantar, alongar, beber água, pegar um pouco de sol, olhar a rua sem tela. O corpo avisa antes da alma falhar. Jesus, no meio de gente, demandas e milagres, chamou os seus: “Vinde repousar um pouco, à parte” (Mc 6:31). E Ele mesmo se retirava para orar (Lc 5:16). Se o Mestre pausa, por que nós não pausaríamos? Dizer “não” ao excesso é dizer “sim” ao essencial: família sem interrupção, leitura que alimenta, silêncio que organiza. Há “tempo para todo propósito debaixo do céu” (Ec 3:1). A vida floresce quando respeita seus tempos.
No trabalho, descanso não atrasa projeto; qualifica decisão. Equipes que protegem intervalos erram menos, criam melhor e conversam com mais respeito. Lideranças que cuidam de pausas criam cultura de confiança. Uma casa que aprende a parar vive menos reativa e mais presente.
Descansar, aqui, é um gesto ético: reconhece limites, cuida de pessoas, honra processos. É também um ato de fé. Dormir em paz é dizer com o salmista: “Em paz me deito e logo pego no sono, porque Tu, Senhor, me fazes habitar em segurança” (Sl 4:8). E quando a fadiga pesa, o Pastor não apenas conduz — refrigera: “Faz-me repousar em verdes pastos, guia-me às águas de descanso; refrigera a minha alma” (Sl 23:2–3). Quem confia aprende a parar sem culpa e volta com uma qualidade de presença que nenhum café entrega.
Não precisamos de fórmulas complicadas para recomeçar um ritmo mais humano. Precisamos de decisões pequenas e consistentes: proteger a última hora da noite do brilho das telas; acordar sem mergulhar direto nas notificações; caminhar quinze minutos para lembrar que temos corpo; sentar à mesa para ouvir quem amamos sem pressa.
Quando a rotina estiver apertada, comece minúsculo, mas comece: uma conversa inteira com o celular longe, uma página lida com atenção, um pedido de perdão feito de verdade, um agradecimento dito pelo nome. O descanso mora nesses gestos discretos que afinam o coração.
No fim, descansar é um jeito de honrar o tempo e reconhecer quem somos. Eu não sou máquina, sou pessoa — e pessoas têm ciclos. Quem respeita seu ciclo volta mais humano, mais criativo, mais justo. Volta capaz de fazer o que é certo quando o mundo precisa. Entre produzir sem alma e pausar para voltar inteiro, escolha voltar inteiro.
E guarde esta lembrança no bolso: o mundo quer seguidores no feed; Jesus quer discípulos na vida. Ele não nos convoca a um ativismo sem respiro, mas a um caminho onde amor e verdade se sustentam por muitos anos — com lucidez, ritmo e paz.
Vamos Orar:
Senhor, hoje eu desacelero diante de Ti. Entrego minhas pressas e preocupações, e peço: dá-me descanso no corpo, lucidez na mente e paz no coração. Ensina-me a dizer “não” ao excesso e a viver no Teu ritmo. Em nome de Jesus, amém.