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Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay: A rampa e o sentimento do mundo
"Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca." Darcy Ribeiro
O Brasil amanheceu com novos ares. Foi como afastar uma nuvem densa e sufocante que teimava em tirar nosso fôlego e obstruir nossa visão. Uma nuvem tão espessa que era possível tocar com as mãos e sentir o peso que embaralhava medo, ansiedade, desesperança e tristeza. O país inteiro era refém da mediocridade, do ódio, da violência. Um povo sem autoestima e tendo que conviver com uma seita imbecilizada. Um país que caiu num fosso que parecia não ter fundo. Mas a democracia destampou a porta do fosso.
A cena do presidente Lula subindo a rampa do Palácio do Planalto, acompanhado por pessoas que representam a diversidade brasileira, é, sem dúvida, a mais simbólica deste período de resgate do Estado Democrático de Direito. É o Brasil tomando posse de si mesmo. É a simbolização da pluralidade que faz do brasileiro um povo diferenciado.
Além da cachorrinha Resistência, que subiu no colo da Janja, estavam nos representando o líder indígena Raoni Metuktire, cacique Kayapó; a catadora de resíduos para reciclagem Aline Souza; o menino nadador negro de 10 anos, Francisco; a pessoa com deficiência, que sofreu paralisia cerebral aos 3 anos e é referência na luta anticapacitista, Ivan Baron; o metalúrgico do ABC Weslley Rodrigues; o professor Murilo de Quadros Jesus; a cozinheira Jucimara Fausto dos Santos e o artesão Flávio Pereira. Sem contar que a foto dessas pessoas dava a impressão de que a imensa multidão que acompanhava também subia junto com o Lula a rampa do Palácio.
Imagino o desprezo dos bolsonaristas vendo aquela cena. Eles que detestam tudo que ali estava representado. É muito interessante imaginar o que cada um sentiu ao acompanhar a subida da rampa. Os obscurantistas e preconceituosos certamente viram com um olhar pretensamente superior e sentiram desprezo por todas as pessoas. Eles jamais teriam a capacidade de entender o simbolismo ali presente. Eu sinto orgulho do desprezo deles.
Eu sempre disse que o que define a possibilidade de haver união, amor e afetividade entre as pessoas é existir o que eu chamo de “sentimento do mundo”. É impossível você viver ao lado de alguém que sente o mundo de maneira completamente diferente do seu olhar. É possível a tolerância dos desiguais, o respeito. No entanto, como dividir o dia a dia com quem é racista, despreza o pobre, tem ódio das minorias, é indiferente em relação à fome e à desigualdade?
A maneira de sentir a cena da subida da rampa define muito bem quem é quem. Eu chorei de emoção e me vi invadido por uma felicidade que me abraçava e acarinhava. Eu esperancei. E tenho certeza de que o meu olhar era o mesmo de milhões de brasileiros que se sentiram representados. Não à toa que essa foi a imagem reproduzida no mundo todo como o sinal de um novo tempo. Como se a humanidade voltasse, mais uma vez, os olhos para o Brasil e para o povo brasileiro. Como se esperançássemos todos.
Sempre lembrando Paulo Freire, na Pedagogia do Oprimido: “Palavra não é privilégio de algumas pessoas, mas o direito de todos”.
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay
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