Parece até que nós, quase todos aqui, somos eremitasArte: Kiko

Nesses dias, manhãs e madrugadas de chuvas intensas, os pássaros acumulam comida, assim como os amigos. Afinal, todos têm receio da covid, do mosquito da dengue e de outras mazelas, mas os telefonemas não param. Tanto é que resolvemos falar sobre a barreira natural que o principado possui, que é a Serra dos Pretos Forros. Do lado de cá de Água Santa é rocha pura e o capim colonial, o popular, serve de cobertura para algumas residências humildes. Já do outro lado da serra, do lado de Jacarepaguá, é mata fechada, onde há riscos de deslizamentos e desmoronamentos.
Para nós, essa barreira é muito importante. Tanto é que do lado de cá não tem nenhuma desgraceira. O problema aqui - e agora meu pensamento é desviado por conta disso - vem sendo essas casas de festa, que estão invadindo essa área estritamente residencial e desmoralizando a lei do silêncio. Sim, porque essas pessoas acham que a lei do silêncio tem folga de sexta para sábado e de sábado para domingo. Pois eu digo que não tem.
Mas, voltando à chuva e ao isolamento temporário que ela provoca, enquanto isso, tentamos ver qual o melhor jogo para fazer por telefone, além da batalha naval, claro. Resolvemos que, com uma pitada de picardia, na atual conjuntura, nada melhor do que o xadrez. Afinal, nós temos aqui do lado, o presídio Ari Franco, que há muito tempo não é badalado, não é notícia. Não se sabe por quê, mas ainda bem, a área anda calma por ali.
Parece até que nós, quase todos aqui, somos eremitas. Menos o Júlio, que sai para trabalhar de segunda a sexta. O resto é eremita. Aprendemos a fazer compras pelo aplicativo para não ter que ir na rua. Quem me ensinou a usar essa tecnologia foi uma amiga vizinha logo ali do Leblon. E assim, continuamos eremitas.
Agora, tudo vem até nós. Pelo menos aqui em casa, desde o tempo da geosmina, só usamos a agua mineral Santa Cruz, que para chegar aqui basta um simples telefonema, assim como o botijão de gás.
Mas a unanimidade geral aqui da turma é a ausência do carteiro. Nunca mais vimos um carteiro. Esses profissionais deveriam ser os mais saudáveis porque eles andavam diariamente quilômetros e quilômetros. Não sei se ainda são tão saudáveis.
Bom lembrar que o eremita de hoje em dia é bem moderninho porque ainda conta com a internet. Capenga, mas ainda assim, internet.
Ontem, bem cedinho, resolvemos abusar da modernidade: usamos a chamada de vídeo. Oito caras falando quase ao mesmo tempo. Legal. Lembramos que, para além das Divisas do Principado, existem a violência, os furtos, roubos, e por aí afora. Mas, claro, os maus elementos também estão por aqui. Ah, são hóspedes do Presídio Ary Franco. Aí, o Adilsinho pulou nas tamancas:
- Melhor não espalhar a tranquilidade daqui da área, ou a especulação imobiliária vai trazer muita gente para morar por essas bandas.