A vereadora Thais Ferreira (PSOL) foi eleita este mês líder da bancada do PSOL na Câmara Municipal do Rio. Criada no bairro de Irajá, na Zona Norte, defende a MÃEDATA, movimento liderado por mães para propor políticas públicas desde a primeira infância, assunto da qual é especialista. Preside a Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente e a Comissão Especial de Combate à Violência e ao Racismo no Ambiente Obstétrico e é autora do Estatuto da Igualdade Racial no Rio, que está em fase de implementação.
SIDNEY: Exemplos de crimes raciais têm se repetido no mundo todo. O que é preciso para que o Estatuto da Igualdade Racial seja respeitado?
THAIS FERREIRA: O Estatuto da Igualdade Racial só vai sair do papel quando houver compromisso político real com a luta antirracista. Isso significa investimento prioritário e significativo em políticas públicas de reparação, fiscalização rigorosa contra o racismo institucional e formação antirracista em todos os níveis — da educação até a alta gestão. Não basta ter lei se não é aplicada com seriedade. Enquanto mulher negra, vereadora e ativista, tenho feito da minha atuação um instrumento para combater de forma irrestrita o racismo e cobrar que a cidade respeite a dignidade do nosso povo.
Além de apoio às famílias pobres, o que é necessário para melhorar a primeira infância?
Melhorar a primeira infância é garantir o direito ao cuidado desde o começo da vida. Isso passa por creche de qualidade, saúde integral, apoio à parentalidade, combate à fome e ambientes seguros para crianças crescerem com dignidade. A cidade ainda falha muito com suas crianças. É por isso que nossa luta passa também pela valorização das mães, da amamentação, da saúde mental perinatal e pelo fortalecimento da atenção básica, com acolhimento real às famílias com doulas atuando nas clínicas da família, por exemplo. Infância precisa ser prioridade de verdade não só no discurso.
O seu partido prioriza o social, mas afinal quais são as propostas objetivas para educação e cultura?
Na educação, defendemos valorização dos profissionais, estrutura digna nas escolas e ensino com inclusão de verdade, liberdade e diversidade. Educação não pode ser instrumento de controle, tem que ser de emancipação. Na cultura, lutamos por orçamento justo, descentralização dos recursos, apoio a artistas periféricos e por um Plano Municipal de Cultura que hoje ainda não existe. Cultura não é luxo, é sobrevivência e é fundamental para formar um povo crítico e consciente.
Fala-se muito em "economia criativa". O que é isso exatamente?
Economia criativa é quando a arte, a cultura, o design, a moda, o audiovisual e outras expressões viram fonte de renda, emprego e desenvolvimento. E o melhor: com identidade, com raiz, com diversidade. No meu mandato, defendemos uma economia criativa popular e periférica, onde o saber das favelas, das feiras, dos coletivos culturais possa ser valorizado e financiado sem precisar se encaixar em moldes elitistas.
A senhora preside a Comissão da Criança e Adolescente e a Comissão Especial de Combate à Violência e ao Racismo no Ambiente Obstétrico. Quais são os problemas mais sérios nestas áreas?
Os problemas são muitos e urgentes. Crianças seguem sendo vítimas de abandono institucional, falta de acesso à saúde básica, violência nas comunidades e negligência do poder público. No parto e no pós-parto, mulheres negras são maltratadas, têm suas dores ignoradas, são impedidas de ter acompanhante ou doula e, muitas vezes, sofrem violência institucional e até perdem seus bebês por negligência. Por isso, fiscalizamos maternidades, escutamos mães e seguimos denunciando. A vida das crianças e das mães precisa ser prioridade real nas políticas públicas.
Qual é a sua avaliação sobre a atuação da Câmara de Vereadores na formulação de leis de qualidade. Ela funciona bem?
A Câmara ainda está muito distante da realidade do povo. Temos projetos importantes sendo ignorados, enquanto propostas que atendem aos interesses da especulação e da velha política andam rápido. Mas, nossa presença aqui também é resistência. É enfrentamento. Temos conseguido aprovar pautas que fortalecem os direitos sociais, mas sabemos que ainda há muito o que mudar. Por isso, seguimos firmes: ocupando, fiscalizando e enfrentando as estruturas que travam o progresso da cidade.
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