Dona Ivone Lara, Zeca Pagodinho e Arlindo Cruz - Reprodução / Arquivo Pessoal
Dona Ivone Lara, Zeca Pagodinho e Arlindo CruzReprodução / Arquivo Pessoal
Por RICARDO SCHOTT

Rio - Quem pôde assistir a um show de Dona Ivone Lara tem a consciência de ter presenciado a história diante de seus olhos. E não apenas a história da música brasileira. A própria trajetória de Yvonne Lara da Costa era formidável, incluindo lances como seu pioneirismo na entrada das mulheres no samba. Ou sua convivência profissional com a psiquiatra Nise da Silveira, no período em que foi assistente social e enfermeira, até 1977. O apoio às outras pessoas caminhava lado a lado com o trabalho como compositora, como frisava. "O samba é o sinal de que Deus me deu a oportunidade de ser útil para alguém", afirmou.

DOZE ANOS

Ivone ganhou o "Dona" em 1970 por influência do apresentador Osvaldo Sargentelli, quando contribuiu com duas músicas para o LP 'Sargentelli e o Sambão'. O primeiro samba, no entanto, ela já tinha composto quatro décadas antes. Aos 12, fez 'Tiê', que chegaria ao disco apenas em 1974, na coletânea 'Quem Samba, Fica? Fica!', da Odeon (hoje Universal).

Filha de musicistas amadores, Ivone perdeu o pai aos 3 e a mãe aos 12. Passou a morar com os tios, com quem teve lições de música, e aprendeu canto com Lucília Guimarães. Seus dotes vocais foram elogiados pelo marido dela, ninguém menos que Heitor Villa-Lobos.

Ivone envolveu-se aos 25 anos com a escola Prazer da Serrinha, após o casamento com Oscar Costa, filho de Alfredo Costa, presidente da agremiação. Mas foi no Império Serrano, a partir de 1947, que sua relação com o samba virou caso sério. Passou a dançar na ala das baianas e, em 1965, assinou ao lado de Bacalhau e Silas de Oliveira o samba-enredo 'Os Cinco Bailes da História do Rio'. Tornou-se a primeira mulher a destacar-se na ala de compositores de uma escola. Antes dela, Carmelita Brasil, presidente da Unidos da Ponte, escreveu todos os sambas do grêmio entre 1959 e 1964.

"Dona Ivone é a mais importante representante feminina do samba depois de Tia Ciata", conta Filó Filho, vice-presidente social do Renascença Clube, que a homenageou ano passado na FliSamba Festa Literária do Samba, ao lado de Nelson Sargento.

CARREIRA

Ivone gravou 19 álbuns e também foi cantada por Maria Bethânia e Gal Costa ('Sonho Meu'), Roberto Ribeiro ('Acreditar') e Clara Nunes ('Alvorecer'), entre outros. Boa parte das músicas foi feita com Délcio Carvalho, morto em 2013, seu principal parceiro. Em 2015, a Musickeria lançou um pacote da série 'Sambabook', com livro e DVD/CD com convidados, em sua homenagem. Cinco anos antes, ela foi a homenageada do Prêmio de Música Brasileira, liderado por José Mauricio Machline. Em 2009, lançou CD e DVD gravados no fechado Canecão, com participações de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Beth Carvalho, Zeca Pagodinho, Délcio Carvalho, Arlindo Cruz, Jorge Aragão, Bruno Castro e Velha Guarda do Império Serrano. E em 14 de setembro, ela ganha um musical com sua história, 'Dona Ivone Lara - Um sorriso negro', que estreia no Teatro Carlos Gomes, com texto de Elísio Lopes.

O neto André Lara, também compositor, conta que Ivone deixou muito material. "Há muita coisa já finalizada. Estamos esperando a maré baixar para ver se vamos mesmo abrir o baú", conta.

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