Por daniela.lima
'A palavra ‘desistir’ não existe no meu vocabulário. Sou vaso duro de quebrar'%2C afirma Claudia RaiaAndré Luiz Mello / Agência O Dia

Rio - Claudia Raia, quando chega, faz os olhares curiosos procurarem nela algo além de suas pernas de 1,10m de comprimento. Em pouco tempo, eles conseguem detectar uma mulher autêntica, de fibra, com humor aflorado, que é capaz de debochar de si mesma. Ama o belo e o ridículo na mesma proporção. E não tem vergonha de dizer que sua beleza abriu muitas portas ao longo de seus 30 anos de carreira, completados este ano.

“Isso é um pouco a saga das mulheres bonitas, né? As pessoas gostam de dizer que nunca fizeram carreira em cima da beleza. Eu nunca acreditei muito nisso. Porque foi a minha beleza que fez com que eu fosse vista, claro que com meu talento também. Eu tinha duas opções. Ou eu virava a gostosona do Jô Soares e fazia uma carreira só de gostosas e, depois de dez anos, ia acabar, ou eu me tornava uma atriz completa. Fiz a segunda opção”, orgulha-se Claudia, aos 48 anos.

No ar como a paranormal Samantha, em ‘Alto Astral’, a atriz vem conciliando as gravações da novela com o projeto do musical ‘Raia, 30 Anos’, que fala sobre sua trajetória, previsto para estrear em julho, em São Paulo. “Não é um espetáculo de colagem com os melhores momentos, porque eu acho isso cafoníssimo. É, na verdade, uma celebração de momentos-ícones da minha carreira, com meu olhar de hoje”, avalia. Passeando por suas personagens Tancinha, de ‘Sassaricando’; Adriana de ‘Rainha da Sucata’; Tonhão, de ‘TV Pirata’; Engraçadinha, da minissérie ‘Engraçadinha: seus Amores e seus Pecados’; Donatella, de ‘A Favorita’, e Ângela, sua primeira vilã, de ‘Torre de Babel’, Claudia enxerga a animação que tinha aos 18 anos, quando estreou na TV, em 1985 — na novela ‘Roque Santeiro’, na pele de Ninon —, e seu discernimento de hoje em dia. Além de muita determinação, claro.

“Sou uma capricorniana , a palavra ‘desistir’ não existe no meu vocabulário. Eu sou aquelas cabras-montês, que sobem montanhas íngremes demais, que sobem com o casco e com a boca, mas fazem de tudo para chegar no topo dessa montanha. Sou vaso duro de quebrar”, analisa a mãe de Enzo, 17 anos, e Sophia, 12.

Ao fazer uma análise de sua vida, Claudia acha graça quando escuta que suas pernas são unanimidade. “Tem até monumento, perto do Galeão, que chamam de pernas da Claudia Raia”, diz, aos risos. “Eu sei que minhas pernas são quase uma entidade. Mas foi a dança que as esculpiu desse jeito”, completa. As pernas já não estão mais no seguro e não existe nenhum cuidado especial com elas, mas, entra ano e sai ano, elas ainda rendem assunto. “Elas ficaram no seguro por dois anos, na época de ‘Não Fuja da Raia’. Eu acabava não gostando muito, mas achava graça, porque as pessoas curtiam tanto essa história!”, confidencia.

A discrição em relação a sua vida pessoal faz parte da personalidade da atriz. Ela não gosta de se envolver em polêmicas, mas admite que existe sempre alguém de olho em seus passos. “Sou um pouco perseguida, no bom sentido. Mas acho que é porque sou grandona e acabo aparecendo muito.” Seus antigos relacionamentos amorosos também não ganham cartaz em sua vida. Mas a atriz faz questão de enfatizar a boa relação que mantém com o ex-marido Edson Celulari, atualmente seu colega de elenco, e com quem foi casada por 17 anos.

“Temos dois filhos, tivemos uma vida feliz e hoje temos uma ótima relação. Já nos escalaram até para ser par romântico depois da separação, mas não pude fazer, porque fui atuar em ‘Salve Jorge’. Para a gente, isso não é problema nenhum”, garante a atriz, que está casada com o ator Jarbas Homem de Mello desde 2010.

“É um megaencontro feliz meu casamento com o Jarbas. Achei uma pessoa que acha graça das mesmas coisas, mesmas referências, é da mesma geração, assistiu aos mesmos filmes. Eu não teria como ser casada com uma pessoa que não admiro”, assegura. Quando fala dos filhos, os olhos ganham brilho especial. Nem mesmo o susto de ver seu filho virar notícia da noite para o dia nos sites de celebridade fez Claudia temer a exposição da cria.

“Sei o filho que tenho e o que foi plantado dentro dele. Ele sabe que isso é efêmero, a notícia de hoje será esquecida amanhã, vai embrulhar peixe. Já a Sophia é exibida, falante, com certeza vai trabalhar com algo em que ela apareça”, opina.

ESCOLHAS E AMULETOS

Com tantos anos na estrada, fica difícil analisar o que ainda falta na carreira, mas Claudia tem algumas certezas de boas escolhas, como a personagem Engraçadinha. “O Carlos Manga não me queria para o papel, alegou que eu era comediante, que não era uma atriz rodriguiana. Ele falava: ‘Ela é bonita demais para as figuras do Nelson Rodrigues. Ela é comediante, não segura um personagem tão dramático’”, rememora. “Eu sei que entrei escondida na Globo, às 23h, porque a diretora Denise Saraceni me mandou ir para lá escondida, e fiz o teste com a Alessandra Negrini. Dias depois, o Manga me telefonou. Eu pensei: ‘Pronto, estou na rua. Vou dançar samba numa churrascaria.’ Quando nos encontramos, ele se ajoelhou e pediu perdão por ter dúvidas da atriz que eu era. Caí no choro. Esse papel era meu”, recorda ela.

Como amuletos, a atriz cita Miguel Falabella, Silvio de Abreu, Jorge Fernando e José Possi Neto. Como gratas surpresas, Thiago Lacerda e Ana Paula Arósio. E fala de Mariana Ximenes, Cauã Reymond e Fernanda Souza como filhos postiços. Mas as pessoas ingratas, essas a atriz faz questão de mantê-las bem longe. “As pessoas que não são generosas são a grande pedra no sapato do ator. Gente mesquinha, que não troca, que não se entrega, é que tornam as coisas mais difíceis, mas isso não tem como administrar.” Claudia também perde a conta de quantos sapos teve que engolir ao longo de sua carreira. “Nossa! Engoli vários. Operei a tireoide, tirei seis nódulos, foram os sapos que engoli, com toda certeza. Não tem o que fazer. Tem gente que é mau-caráter. Aí você vai se decepcionando, se ferrando. Coisas da vida.”

Acostumada a produzir e atuar em diversos musicais, Claudia tem grande insatisfação em relação à meia-entrada no teatro, oferecida a estudantes e menores de idade. “A meia-entrada é uma frustração louca na minha vida. Porque é inacreditável o governo oferecer o benefício e quem paga é o produtor, que não tem meia-luz, meia-iluminação, meio-bailarino para pagar. Desculpa, foi um desabafo”, reconhece.

Apesar de amar todas suas personagens, é por Samantha que o coração de Claudia Raia bate forte. “Ela é superpopular, é a vilã que subverte através do humor. Ela fala coisas inaceitáveis, é uma demônia. Ninguém percebe que ela mandou matar a mãe. Ela é carente, uma coitada. Não sei como as pessoas gostam tanto dela”, questiona. E a atriz ainda afirma que da personagem não quer nem os superpoderes. “Deus me livre dar uma de Samantha! Ela é muito vaidosa, só fala dela, as pessoas que se ferrem, ela é horrível. Conheço um monte de gente assim, que é insuportável. Eu falo com meus amigos que, se eu tiver fazendo isso em algum momento, para eles me darem um toque.”

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