São Paulo - Como você contaria a história de sua vida profissional em uma hora e meia de espetáculo? De fato, não é tarefa fácil. Mas Cláudia Raia acerta em cheio ao retomar três décadas de sua carreira no espetáculo "Raia 30 - O Musical", com texto presenteado de Miguel Falabella.
"Quando você tem 48 anos e vai contar a sua trajetória, por onde começa? Qual o caminho que você vai tomar e o que é preciso em termos ingredientes para não ficar um show de vaidades?", questiona a atriz ao iG Gente, enquanto se prepara para subir ao palco do Teatro Net, em São Paulo.
Enaltecer a si mesma não é de seu feitio e isso Cláudia deixa bem claro. "Sou uma pessoa extremamente debochada, adoro não me levar a sério. Gosto de falar das minhas fragilidades e limitações e rir disso. Foi muito difícil achar o tom e o que contar neste espetáculo."Mas ela traçou um caminho e fez um flashback bem-humorado, contando a história de uma menina que nasceu no meio da dança e desde pequena lutou para se tornar a artista completa que é hoje.
Alguns pilares foram selecionados para dar corpo ao musical. "O balé clássico, o teatro de revista, o coreógrafo americano Bob Fosse, que foi minha grande inspiração, e o Lennie Dale, que foi meu mestre, meu mentor, são os fios condutores da peça e dão ritmo à história." Fazer uma colagem de tudo que já fez foi deixado de escanteio. "Acho cafona falar do que já foi visto. Eu queria mencionar os momentos mais importantes da minha carreira de uma maneira diferente."
Lembrar daquilo que está sendo falado, mas com outros números, figurinos e uma nova estética. "Personagens marcantes e teatrais são revisitados por uma artista que hoje eu sou e não era há 30 anos", analisa ela que leva a plateia às gargalhadas com o Tonhão, da TV Pirata, e a inesquecível Tancinha de "Sassaricando".
Ao colocar no espetáculo os musicais estrelados por Cláudia, Falabella teve o cuidado de mudar a letra para contar a história da atriz. "Ele achou um caminho bem sutil para narrar a minha vida e é possível detectar um por um. "Sweet Charity" (2006), "O Beijo da Mulher Aranha" (2000), e assim por diante. Então não ficou pretensioso, não ficou déjà vu."
Claudia ainda encontra tempo para fazer piadas com rótulos que foram estabelecidos durante sua jornada. "Eu era só uma bunda e também já chegaram a pensar que eu fosse um travesti. Era o que as pessoas conseguiam ver. Não é meu caminhar, mas é meu caminho, então fui por aí e mostrei a atriz que eu sou, a bailarina que eu sou, a cantora que eu sou. É mais inteligente lidar assim do que ficar negando."
Seus casos e amores, no entanto, são colocados em segundo plano. "Não interessa falar sobre a minha vida particular. Não quero encher o teatro para fazer fofoca. Contar como eu conheci fulano ou sicrano, estou fazendo 30 anos de carreira, não 30 anos de pares românticos."
E toda vez que surge o assunto no palco, corta para palmeiras balançando ao vento. "A gente achou uma maneira bem humorada de falar sobre isso. A mim não interessa expor meus romances. Até para o público interessaria, mas não é essa a ideia. Sou mais sofisticada do que isso", diz e entrega: "Se um dia eu quiser contar tudo e jogar tudo para o alto, com certeza será aos 80 anos em um livro que vai se chamar 'Ou vai Ou Raia' ou 'A Raia que o parta', aí pronto. Meus filhos já vão aceitar tudo porque vou estar velha mesmo".
Vai dar samba
As celebrações não param por aí. Ainda tem uma exposição itinerante e um livro comemorativo às três décadas de muito trabalho. "A minha intenção é brindar com o público pelo Brasil inteiro, porque foi o público que me elegeu nesses 30 anos." E em 2016, a história de sua vida vai invadir o Sambódromo do Anhembi. A escola de samba Nenê de Vila Matilde vai homenagear a artista com um desfile arrojado. "Fiquei muito lisonjeada e dou meus palpites aqui e ali. Está tudo ficando do jeito que eu quero. O samba enredo é maravilhoso. Popular, fácil e chiclete, que fica na cabeça."
Nova novela
Depois do teatro, Claudia se dedica novamente à televisão. Ela está no elenco da novela das nove "Sagrada Família", de Maria Adelaide Amaral, que substituiria "A Regra do Jogo", mas foi adiada por conta da trama política que coincidiria com as eleições do ano que vem. Na trama, ela dará vida a Salete, dona de um posto de gasolina.
"É uma personagem bem densa e popular. Ela brinca com todos seus frentistas saradões, mas cuida deles, leva ao médico, ao dentista, e quando eles se casam com as meninas mais jovens, ela é madrinha de casamento. É uma figura adorável." Salete terá uma filha biológica que tem vergonha da mãe eestá envolvida com drogas. "É um problema na vida dela, mas há um conflito bem interessante de mãe e filha." A outra filha é adotiva e DJ de música eletrônica. "Salete freqüentará as raves, é uma personagem maravilhosa, de comédia, muito solar, muito alegre."
Maternidade aos 48
Claudia e o namorado, Jarbas Homem de Mello, têm um sonho: aumentar a família. Mas com tanto trabalho, tiveram que adiar esse plano. "Eu sou mãe de duas figuras incríveis e o Jarbas está bem feliz com meus dois filhos, eles se dão superbem." Foi dessa boa convivência que surgiu a idéia. "Adoro ser mãe. Falou comigo de gravidez, eu já estou animada. Eu por mim teria 10 filhos, mas não deu tempo, só isso. Falar disso cria uma responsabilidade em ter um filho. Eu não sei se isso vai dar tempo, se é o momento, eu tenho uma novela pela frente, depois eu continuo com 'Raia' pelo Brasil inteiro. Só aí tenho trabalho até março de 2017, como vou pensar em um filho? Mas a vontade existe."
Raia por Raia
Para encerrar o bate-papo, Claudia faz um apanhado de suas vitórias e particularidades. "Acho que sou diferente, até pelo meu tipo físico. Chegar nessa marca não é fácil, mas é possível. Sempre fui o curingão da Globo. Tinha que apresentar ao vivo eu estava lá, precisavam de alguém para fazer comédia, drama, me chamavam. A vilã, também era comigo. Era meio pau para toda obra." Vai encarar?