Rio - O procurador-geral da República, Augusto Aras, defende a continuidade de duas ações em trâmite na Justiça do Trabalho, que buscam assegurar o cumprimento da cota mínima legal de contratação de aprendizes. Em ambos os casos, as empresas tentam suspender o trâmite de ações ajuizadas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), que requer o cumprimento da norma.
As reclamações alegam que a questão está pendente de análise pela Suprema Corte, em um outro caso com repercussão geral, em que se discute a validade de norma coletiva de trabalho limitadora de direito trabalhista não assegurado constitucionalmente. Para o PGR, no entanto, as matérias não guardam relação, visto que a aprendizagem é um direito garantido pela Constituição Federal.
O instituto da aprendizagem está previsto em diversos artigos da Constituição, assim como em dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O texto constitucional é claro ao proibir o trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos, além de qualquer trabalho a menores de 16 anos. Prevê, ainda, a contratação de pessoas na condição de aprendiz, a partir de 14 anos. Já a CLT estabelece que empresas devem contratar um número mínimo de 5% e máximo de 15% de aprendizes do seu quadro de funcionários, cujas funções demandem formação profissional.
Apesar da previsão constitucional, duas empresas buscam no STF suspender o trâmite de ações contra elas ajuizadas, em razão do descumprimento dessa cota mínima de contratação. Elas argumentam que, em junho de 2019, o ministro Gilmar Mendes determinou a suspensão de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, relacionados ao Tema 1.046, que ainda está pendente de análise na Suprema Corte e possui repercussão geral.
O tema trata da validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado na Constituição. A decisão acerca da matéria deverá ser seguida por todas as demais instâncias da Justiça em casos similares.
Para o PGR, no entanto, a matéria debatida nas ações ajuizadas pelo MPT não guarda relação com o Tema 1.046, não havendo justificativa para o trancamento dos processos. Isso porque o tema pendente de análise no STF é claro ao tratar de direitos não assegurados na Constituição, o que não é o caso da aprendizagem, que é um direito constitucional.
Além disso, a temática submetida à repercussão geral trata da restrição de direitos a integrantes das categorias profissional e econômica, sendo que, a contratação de aprendizes envolve pessoas que sequer chegaram a ter formalizados os contratos de trabalho.
"O objetivo estampado nas ações civis públicas [do MPT] reside em impedir a diminuição do número de beneficiados a serem contratados pelas agravantes. Ele está centrado tão somente na obrigação imposta ao empregador de oferecer, a toda a sociedade, cotas legalmente estipuladas, de postos de aprendizagem”, pontua Aras.
Para o PGR, permitir que a redução da base de cálculo para o cumprimento da cota mínima de aprendizes seja livremente pactuada entre as partes pode levar a uma contratação mínima, esvaziando o direito fundamental à aprendizagem previsto na Constituição.
Entenda os casos
Em uma das ações - a Reclamação 51.061, originária da Justiça do Trabalho no Paraná - o PGR recorreu da decisão do relator, ministro Alexandre de Moraes, que suspendeu o trâmite do processo. O pano de fundo é uma ação civil pública proposta pelo MPT contra a TLSV Engenharia LTDA, com o objetivo de ver respeitada a cota legal de contratação de aprendizes.
Ao apreciar a reclamação da empresa, o ministro julgou procedente o pedido e determinou a suspensão do processo, até o julgamento de mérito da ação na qual se discute o Tema 1.046 da Repercussão Geral. O MPF pede que a decisão monocrática do ministro seja anulada e que o pedido da empresa seja negado.
Já a Reclamação 50.479 envolve uma ação civil pública do MPT contra a empresa Quattro Serv Serviços Gerais LTDA, em tramitação originariamente na 34ª Vara do Trabalho de Salvador (BA), também para assegurar a contratação mínima de aprendizes.
A Justiça especializada negou o pedido formulado pela empresa para suspender o processo. Ao apreciar o pedido no STF, o ministro Luís Roberto Barroso, monocraticamente, negou seguimento à reclamação apresentada por ausência de relação com o Tema 1.046. Nesse caso, o parecer do PGR é para que o recurso da empresa seja desprovido, de forma a manter a decisão do relator.
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