Quebra do contrato de compra de imóvel fica em 10,3% no primeiro trimestre de 2022Freepik
Entre os motivos para a desistência da compra estão as variações das parcelas, que dependem principalmente de duas taxas. Durante a construção, os clientes pagam as parcelas dos imóveis às incorporadoras e o valor devido é calculado com base no Índice Nacional de Construção Civil (INCC), que mede a inflação no setor. Já quando a construtora finaliza a obra e é expedido o habite-se, o cliente precisa procurar um banco para contratar financiamento imobiliário, que varia de acordo com a taxa Selic. Nos últimos anos, no entanto, esses pagamentos têm ficado mais caros. No período de 12 meses, encerrado em março de 2022, o INCC acumulou alta de 11,63%, enquanto a Selic ficou em 11,75% em março.
“Isso quer dizer que uma pessoa que pagaria 6% ao ano, passa a pagar 11%. Considerando que as pessoas financiam imóveis em 20, 30 anos, a gente está dizendo que a pessoa vai pagar 300% de juros ao final desse financiamento, três vezes mais do que o valor do imóvel”, diz Daniel Blanck, especialista em direito imobiliário.
Diante desse cenário econômico, algumas famílias são obrigadas a desistir do negócio, decisão que é regulamentada pela Lei Geral dos Distratos desde 2018. De acordo com o texto, antes do habite-se, todo consumidor, inclusive os inadimplentes, tem direito ao distrato, que deve ser feito por meio de um contrato formal. Acordos verbais não são considerados distratos.
A lei também prevê que o consumidor inadimplente que optar pelo distrato deverá pagar uma multa, que costuma variar entre 15% e 25% sobre o valor pago, não podendo passar disso. As incorporadoras não podem reter todo o dinheiro pago pelos clientes nos casos de distrato.
Legalmente, as construtoras têm um prazo de carência para desistir do negócio, caso analisem que ele não é viável — o que ocorre nas vendas das unidades na planta. “Com as desistências depois do período de carência, as incorporadas tinham que devolver um valor muito alto e começou a ter um desequilíbrio econômico. Se as empresas soubessem o número exato de pessoas que seguiriam com elas até o final, às vezes, as incorporações não se mostrariam interessantes”, explica Sender. “A lei veio para trazer um cenário um pouco mais coerente”, conclui o especialista.
Apesar do resultado do primeiro trimestre de 2022 (10,3%) ainda parecer alto em comparação aos 12 meses do ano anterior (11,3%), o número não é alarmante. Isso porque foram vendidas cerca de 36,9 mil unidades residenciais e comerciais no primeiro trimestre de 2022, o que equivale a um aumento de 6,2% em relação ao volume comercializado no mesmo período do ano anterior.
Já no acumulado nos últimos 12 meses encerrados em março de 2022, os 145 mil imóveis vendidos superaram a quantidade total transacionada nos 12 meses anteriores (+0,7%). Quando são consideradas apenas as vendas líquidas, excluindo os distratos, houve uma alta de compras de 8,3% no primeiro trimestre de 2022 e de 1,9% nos últimos 12 meses.
Embora o número de distratos em si não seja preocupante, Black se preocupa com o cenário nos próximos meses. “Com o aumento da taxa Selic, da taxa de juros e a questão eleitoral no Brasil, que também tem um impacto muito grande, a tendência é que aumente o número de distratos”, prevê.
De acordo com os indicadores da Abrainc/Fipe, os motivos para esse recuo estão nas regras e limites que definem o enquadramento de imóveis, no nível de subsídios e na alta nos preços de insumos da construção. A queda real no rendimento médio das famílias, principalmente as mais pobres, também foi apontado como um dos fatores responsáveis pelo cenário.
Por outro lado, o número de imóveis de médio e alto padrão tiveram um resultado positivo no primeiro trimestre de 2022. Nesse período, foram vendidas um pouco mais de 9,5 mil unidades, o que representa um aumento de 109% em comparação ao mesmo período do ano anterior. Em 12 meses, o segmento acumulou alta de 43,5%, com 32.919 unidades comercializadas. Ao mesmo tempo, a relação distrato-venda apresentou recuo de 4,6 pontos percentuais no período de janeiro a março de 2022 e de 4,4 na média dos 12 meses encerrados em março. Segundo o levantamento da Abrainc e da Fipe, os imóveis de médio e alto padrão foram os responsáveis pelo resultado positivo do setor imobiliário no início de 2022.
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