Tamires é auxiliar de cozinha em Niterói, Região Metropolitana do Rio de JaneiroArquivo Pessoal

A empresa Cupom Válido realizou um estudo que aponta que o Brasil possui o quinto pior salário mínimo da América Latina, atrás de países como Equador, Guatemala, Paraguai e Bolívia. Na pesquisa, os mínimos nas moedas locais foram convertidos para real para efeito de comparação. A colocação pode impactar alguns, mas a realidade é que o piso salarial brasileiro apresenta perdas graduais desde o início dos anos 2010.
Conforme previsto na Constituição, em seu artigo 7º, o salário mínimo deve atender às necessidades vitais básicas do trabalhador e de sua família — com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social. Além disso, a o texto constitucional estabelece que o mínimo deve ser reajustado periodicamente, de modo a preservar seu poder aquisitivo, conforme a inflação e o aumento da produtividade.
A remuneração mínima, no entanto, não teve o seu valor conservado. Com base na Constituição, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) realiza estudos e compara o salário-mínimo real e o salário mínimo considerado necessário de cada mês e ano.
Em janeiro de 2010, o salário mínimo era de R$ 510, e o considerado necessário na época era R$ 1.987,26. Ou seja, a remuneração recebida pelo trabalhador era 25,6% do que o Dieese entende como suficiente para suprir as demandas básicas dos brasileiros.
Este é o melhor número desde o início do Plano Real. Por outro lado, em fevereiro de 2023, o valor julgado necessário é de R$ 6.547,58 e o salário mínimo está em R$ 1302, apenas 19,8% do considerado ideal pelo Dieese. Ou seja, ele perdeu poder de compra nos últimos 13 anos.
Em julho de 1994, quando o real foi instituído como a moeda brasileira, o valor do salário mínimo era de R$ 64,79, enquanto o julgado necessário era de R$ 590,33. A remuneração básica era cerca de 11% do que um brasileiro precisaria receber, de acordo com o Dieese.
Comparado com o período de implantação do Plano Real, houve um aumento do poder de compra. Contudo, verificou-se queda na comparação com janeiro de 2010, considerado o melhor período econômico do país pelo economista e coordenador acadêmico da Fundação Getúlio Vargas, Mauro Rochlin.
Impacto fiscal
O especialista conversou com O Dia a respeito da atual situação do salário mínimo. Ele garante que um aumento real traria consequências fiscais ao país: ''Impacto fiscal não seria dos melhores. O governo tem despesas vinculadas ao salário mínimo, como os benefícios do INSS. Aumentos de salário mínimo representam uma despesa maior'', explicou.
Ele também ressaltou que a condição de um baixo salário mínimo se relaciona com o excesso de mão de obra no país. ''Salário baixo é uma questão socioeconômica. Quando se tem pouca mão de obra, como em países desenvolvidos, a tendência é que os salários aumentem'', completou.
Tamires Tavares, auxiliar de cozinha, de 21 anos, trabalha em Niterói, na Região Metropolitana do Rio, e recebe um salário bem próximo à remuneração mínima. Ela, que é mãe e sempre teve o sonho de ter uma família, revela que atualmente enfrenta dificuldades financeiras.
''O salário que ganhamos (ela e o marido) não consegue suprir todas a necessidades que uma família brasileira precisa. Compramos o básico no mercado, pagamos as contas e não sobra nada. Está cada vez pior. Para corrigir isso temos que nos virar para ter uma renda extra'', revelou.
O salário mínimo até o fim do ano passado era de R$ 1.212. O valor foi reajustado para R$ 1.302 em janeiro.
O que o governo diz?
O ministro de Trabalho e Emprego, Luiz Marinho (PT), disse em fevereiro que o governo buscava uma solução fiscal para um aumento real do salário mínimo.
“Nós conseguimos mostrar que era possível controlar a inflação, gerar empregos e crescer a renda, crescer a massa salarial dos trabalhadores do Brasil inteiro, impulsionado pela Política de Valorização do Salário Mínimo, que consistia em, além da inflação, garantir o crescimento real da economia para dar sustentabilidade, para dar previsibilidade, para dar credibilidade acima de tudo para todos os agentes. É importante que os agentes econômicos, o empresariado, os prefeitos, os governadores, saibam qual é a previsibilidade da base salarial do Brasil, e o salário mínimo é a grande base salarial do Brasil”, disse à TV Brasil.
Dias depois, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou o aumento do salário mínimo para R$ 1.320 a partir do dia 1º de maio, feriado do Dia do Trabalhador. O valor do aumento corresponde a 20% da correção de 2022 para 2023. O presidente se comprometeu em elevar o mínimo todos os anos e disse que usará o crescimento do PIB para esse aumento.
"O salário mínimo terá, além da reposição inflacionária, o crescimento do PIB. É a forma mais justa de você distribuir o crescimento da economia. Não adianta o PIB crescer 14% e você não distribuir. Ou seja, é importante que ele cresça 5%, 6%, 7% e que você distribua isso com a sociedade. É isso que vai acontecer. Nós vamos aumentar o salário mínimo todo ano. A inflação será reposta e o crescimento do PIB será colocado no salário mínimo", garantiu.
O DIA tentou contato com o Ministério da Fazenda para que a Pasta analisasse os impactos a longo prazo do aumento do mínimo para a economia. O órgão público, no entanto, não respondeu até o momento do fechamento do texto