Com a regulamentação da lei das apostas de cota fixa, também conhecida "Lei das bets", a procura pela modalidade tende a aumentar. Para especialistas, a mudança faz com que o mercado fique mais seguro. Já os apostadores acreditam que terão menos ganhos com a regra de tributação, que começar a valer a partir deste mês.
Primeiro, é importante entender o que passou a ser permitido. Apostas virtuais, apostas físicas, eventos esportivos reais, jogos on-line e eventos virtuais de jogos on-line passaram a ser regulamentados.
As apostas de cota fixa são aquelas em que o apostador sabe exatamente o possível retorno no momento da aposta.
Lei para empresas
A empresa que quiser prestar o serviço precisará pagar por uma outorga de até R$ 30 milhões expedida pelo Ministério da Fazenda. Além disso, precisarão ser pagos 12% de imposto sobre a arrecadação dessas casas de aposta.
O valor arrecadado pelo governo federal com o mercado será dividido da seguinte forma: 36% para a pasta de Esporte, 28% para Turismo, 12,6% para Segurança Pública, 10% para Seguridade Social, 10% para Educação, 1% para Saúde e os 2,4% restantes vão para a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial e para o Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-Fim da Polícia Federal.
Todas as casas de aposta precisarão fornecer informações claras e transparentes, como o número e a data da portaria de autorização, o endereço físico da sede, contatos para atendimento ao consumidor e ouvidoria.
São proibidas práticas que levem a ideias enganosas sobre as chances de ganhar ou que as apostas podem ser uma alternativa ao emprego, uma solução para problemas financeiros ou forma de investimento. Também é proibido que os agentes de operadoras adquiram direitos de transmissão de eventos esportivos.
Todas as empresas que atuam no Brasil deverão se adequar a esse modelo regulatório. Ainda está pendente a regulamentação do tema pelo Ministério da Fazenda. As empresas não autorizadas estarão automaticamente impedidas de atuar no país.
Quem pode apostar e quanto de imposto deve ser pago?
A aposta é permitida para todos os adultos e proibida para estes grupos: pessoas com influência significativa na operadora de apostas, agentes públicos relacionados à regulação e fiscalização da atividade, pessoas com acesso aos sistemas informatizados da loteria, pessoas que possam influenciar o resultado do evento (como atletas, árbitros e dirigentes esportivos), além daqueles diagnosticados com transtorno do jogo patológico.
Os apostadores também terão que pagar impostos sobre cada prêmio ganho. São taxados 15% dos lucros. Um exemplo. Se a pessoa colocar R$ 100 em uma aposta com fator de multiplicação 1.5. O prêmio bruto será de R$ 150, representando um lucro de R$ 50. Os 15% de imposto incidirão sobre esses R$ 50, sendo equivalente a R$ 7,50.
Questionado, o Senado afirmou que "é preciso aguardar a regulamentação do Ministério da Fazenda sobre o tema para saber como será o recolhimento desse imposto".
A Lei nº 14.790, que torna a regulamentação possível, foi sancionada pelo presidente Lula em dezembro de 2023 e as regras tributárias passam a valer a partir de abril.
Desafios pela frente e mais proteção jurídica
O DIA conversou com Plínio Lemos Jorge, presidente da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL). O representante afirmou que a entidade participou ativamente da construção dessa nova legislação e que ainda há muito a ser feito.
"Ainda teremos um longo caminho pela frente, até que todas as portarias e regulamentos sejam criados, mas o importante é que o governo vem avançando dia após dia na criação dessas normativas infralegais", disse.
Apesar de a ANJL ter participado da elaboração da lei, a organização não é favorável a todos os pontos da medida.
"Os parágrafos 1º e 3º do artigo 31 foram vetados no ato da sanção da lei. Eles definiam que o imposto incidiria sobre o prêmio líquido, sendo esse o resultado positivo resultante das apostas de quota fixa realizadas a cada ano, após a dedução das perdas que o jogador teve no período. O veto a esse disposto permite, na prática, que o Imposto de Renda seja recolhido no ato do pagamento de cada prêmio ao apostador. Se a pessoa acertar uma aposta e ganhar apenas R$ 20, será tributada. Isso não acontece em país nenhum do mundo que tenha o mercado regulamentado. Nesse sentido, a ANJL defende o encontro anual de contas, em que o contribuinte recolherá o devido imposto por meio de declaração de ajustes do tributo", expos.
Para Lemos Jorge, é necessário também que os tributos não sejam exagerados para manter a situação atrativa para as empresas que atuam no mercado.
"O principal desafio é manter um ambiente favorável à atuação de empresas sérias no País, comprometidas com a legalidade, a transparência e a integridade dos jogos. Qualquer medida que dificulte a atuação dessas casas de apostas dá margem para a proliferação daquelas que desejam ficar na ilegalidade", opinou.
Questionado sobre o fato de todas as empresas precisarem ter sede e prestarem contas no País, Luis Eduardo dos Santos de Jesus, professor de Direito da faculdade Anhanguera, entende que as mudanças oferecem mais qualidade jurídica para os apostadores.
"Os apostadores recebem proteção do ordenamento jurídico brasileiro. Assim, caso haja alguma prática ilícita por parte do prestador de serviços, o lesado poderá ingressar com as medidas judiciais cabíveis", opinou.
Apostadores podem sentir no bolso
O DIA conversou com alguns apostadores sobre as mudanças na legislação para entender como o assunto foi repercutido entre as pessoas que costumam apostar. O engenheiro de software Igor Deo, de Niterói, relatou sua experiência com os jogos.
"Aposto puramente por diversão. Essa mudança não me afeta, pois eu não enxergo as apostas como profissão. Mas, com certeza, afetará os apostadores profissionais. Não que isso seja errado, porque todo trabalhador paga imposto; eles não tem razão para não pagar também", opinou.
Ele completa dizendo que o "imposto para a casa de aposta deveria ser maior do que para o apostador, na minha opinião".
O produtor de eventos Filipe Leão Velloso Amaral, morador de Itaipu, não ficou muito satisfeito com as mudanças e afirmou que "diminuirá muito minha participação nesse mercado". "Acho que vão apagar o fogo que virou o mercado de apostas", avaliou.
Já o servidor público Fabiano Duarte, de Vitória, no Espírito Santo, vê a mudança como algo justo, apesar de admitir que isto pode prejudicar seus ganhos.
"Acredito que irá me afetar, tendo em vista que o potencial lucro será um pouco menor. Mas vejo a taxação como uma medida justa. Acredito que seja um processo natural, é um ramo muito novo no Brasil e que movimenta uma quantidade exorbitante de dinheiro", pontuou.
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Vício
Apesar de o mundo das apostas chamar a atenção, é preciso se atentar aos possíveis malefícios. Esse tipo de diversão pode gerar um vício, como explica a psicóloga Danielle de Souza Almeida.
"O vício é um hábito ruim. Então, precisamos entender o que é um hábito e como a gente forma eles: hábito é aquilo que a gente faz com frequência, pois tem uma boa razão para fazer, gera uma motivação para a gente. Essa motivação, quimicamente falando, é a famosa dopamina — neurotransmissor que nos 'empolga' e nos coloca em ação quando enxergamos que algo é valioso, traz benefícios para a gente. Pois bem, os jogos são projetados para viciar, pois a forma como como funcionam mantém a nossa dopamina aumentada. Como? Trazendo sempre aquele 'frisson' de ganhei/bati na trave, agora vai. E o ser humano adora esse sentimento, esse 'frisson' e se vicia nessa sensação", explicou.
Como as casas de aposta podem ser facilmente acessadas pelo telefone, Danielle esclareceu que "quanto mais fácil for o acesso da pessoa a esses jogos e se ela já tem maior dificuldade de autocontrole, mais fácil poderá ficar viciada".
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