Hannah Miranda começou a vender miçangas com apenas R$ 50 Renan Areias / Agência O Dia

Que o Brasil leva jeito para empreender, ninguém pode negar. Seja pela falta de oportunidade no mercado formal ou vontade de trabalhar para si, cada vez mais pessoas estão arregaçando as mangas e tirando as ideias do papel. No entanto, o sonho de ter o próprio negócio, muitas das vezes, esbarra na falta de recursos e de orientação. O DIA ouviu especialistas e outros empreendedores que já estão no mercado para entender como o caminho para ser o próprio patrão pode ser menos difícil.
De acordo com dados do Sebrae, somente nos primeiros cinco meses de 2024, 1,6 milhão de pequenos negócios foram abertos no Brasil. O Rio de Janeiro, ocupou a terceira posição no ranking nacional, com 128 mil novas empresas, representando 8% do total. O resultado ficou atrás apenas de São Paulo (30%) e Minas Gerais (11%).

Cinco municípios concentraram 61,5% dos pequenos negócios abertos no estado: Rio de Janeiro (43%), São Gonçalo (4,9%), Nova Iguaçu (4,8%), Duque de Caxias (4,8%) e Niterói (4%).

Segundo Antonio Alvarenga, diretor-superintendente do Sebrae Rio, os pequenos empreendimentos dominam as estatísticas. "De janeiro a maio, 97% das empresas fundadas no Rio de Janeiro são pequenos negócios. É importante que o empresário procure capacitações e tenha consciência sobre a importância da educação empreendedora, que vai trazer novos conhecimentos e oportunidades para os seus projetos", destacou.

Outro dado apresentado no relatório do Sebrae apontou que os setores que mais se destacaram foram logística e transporte, serviços de alimentação, casa e construção, estética e beleza, e moda e confecção.

Competição acirrada
Renan Kaminski, CMO e sócio fundador da 4blue, empresa que auxilia pequenos e médios empresários a gerenciar seus negócios, acredita que o futuro empreendedor deve estar pronto para uma competição acirrada.
"Hoje você não concorre mais com alguém ao lado. Você concorre com quem está na internet, do outro lado do País, com quem importa direto da China, entrega na porta da casa da pessoa. Então o nível de competição está cada vez maior e tende a piorar", afirmou.
O especialista em gestão de empresas Renan Kaminskim recomenda profissionalismo - Divulgação
O especialista em gestão de empresas Renan Kaminskim recomenda profissionalismoDivulgação
Para ele, o pequeno empresário deve buscar entender como oferecer o melhor produto. "A pergunta central de quem está abrindo o negócio é, por que e como os meus clientes deveriam comprar de mim? Além disso, qual é a proposta para quem é aquele cliente potencial que vai irresistivelmente querer comprar de mim e não do concorrente?", questionou.
Kaminski destacou os dois maiores desafios para quem deseja empreender.
"As duas maiores reclamações dos nossos clientes sempre estão na gestão de pessoas e financeira. A dificuldade da maioria das empresas é conseguir atrair boas pessoas e fazê-las performar mesmo quando o empresário não está por perto. Outro ponto importante é ter um bom controle financeiro, precificar certo e ter lucro. De um lado, se você não consegue fazer as pessoas trabalharem direito e terem performance, e do outro você está com o balde furado, com gastos desnecessários ou preço errado. É prejuízo na certa. Prejuízo financeiro e prejuízo operacional", alertou.
Kaminski acredita que a chave para um negócio duradouro é o profissionalismo. "Hoje, você está competindo literalmente não só com o Brasil mas com o mundo inteiro, em alguns tipos de negócio. Se você não tiver um diferencial claro, uma proposta clara de valor para um cliente específico e estratégia de marketing. Por outro lado, se você não tiver uma operação, uma gestão financeira, de processo e de pessoas bem feitas, significa que você vai começar com boas chances de dar errado, assim como, infelizmente, 60% das empresas quebram em menos de cinco anos", ressaltou.

Comece com o que tem hoje
Hannah Miranda, 38 anos, passista da Mangueira, vivia de eventos de ligados ao samba e ficou em apuros quando a pandemia de Covid-19 impôs medidas de isolamento social. Impossibilitada de realizar shows, viu no artesanato a possibilidade de realizar um sonho de infância: ser empresária.
"Eu fiz bijuteria minha vida inteira, desde criança. Com o passar do tempo fui melhorando. Comecei com miçanga e elástico, que era mais barato e daí fui crescendo para as bases prontas, montando brinco e outras peças mais pesadas", disse.
No entanto, com poucos recursos, ela precisou adequar as contas para iniciar o negócio.
"Cada vez eu ia, comprava material em torno de R$ 50 por vez. E assim foi. Na pandemia, eu estava vivendo de auxílio emergencial. Consegui dar uma segurada nas despesas, reduzir o aluguel. E conforme eu fui metendo a cara nas vendas, eu consegui montar um computador, porque eu tinha um laptop bem antigo", disse.
Após mergulhar nas vendas, Hannah investiu na profissionalização - Renan Areias / Agência O Dia
Após mergulhar nas vendas, Hannah investiu na profissionalizaçãoRenan Areias / Agência O Dia
Após algum tempo, ela decidiu investir no negócio e pegou dinheiro emprestado para profissionalizar a produção. Surgiu o Maria Pulseira. "Peguei R$ 9 mil reais com o banco para comprar uma mesa e uma máquina de corte a laser", contou.
Hannah, que hoje realiza cerca de 80 vendas por mês, conseguiu alugar um escritório no Centro do Rio e dá uma dica para quem está iniciando o próprio empreendimento.
"Comece com o que você tem. O caminho é importante, é necessário entender o erro para saber como consertá-lo e analisar se está na trajetória certa ou não", aconselha.
A paixão por empreender levou a passista a se aprofundar no tema. 
"Conforme a gente a gente consome todo tipo de podcast, entrevista, curso on-line, ebook, começa a aparecer mais conteúdo gratuito. Passei a me apaixonar pelo assunto e a estudar todo tipo de estratégia para vender mais", disse.
Ela acredita que o conhecimento é fundamental para fazer o produto ou serviço se destacar. "É muito difícil vender somente pela foto bonita no feed da internet, a gente tem que acompanhar o fluxo, mostrar de maneiras diferentes, criar dinâmicas de compra e levar ideias para que o cliente faça a sua propaganda", destacou.
Hannah também apontou um ponto como crucial para quem pretende oferecer um produto ou serviço: a credibilidade. "Pessoas compram de pessoas. Autoridade não é somente o quão conhecida você é, mas o quão confiável, o que é o mais importante. Muita gente é desconfiada com internet. Então é importante passar a confiança de 'se não der certo, eu estou aqui e vou dar um jeito'", concluiu.
Reunião virou grupo de empreendedoras
A paixão por empreender uniu mulheres para trocar ideias e aprimorar os negócios. O "Nossa Conversa", grupo que surgiu como uma reunião de empreendedoras, virou uma ferramenta de apoio para compartilhar experiências.
Grupo de empreendedoras Nossa Conversa - Arquivo Pessoal
Grupo de empreendedoras Nossa ConversaArquivo Pessoal
"A gente começou trocando ideias umas com as outras. Aí organizamos um café da manhã para nos conhecermos pessoalmente e a procura foi muito alta. Então criamos esse grupo, no qual vamos nos fortalecendo umas com as outras, tanto como cliente, e como empresária, dando opinião", diz Hannah.
Atualmente com 16 membros, o Nossa Conversa possui empreendedoras de diversas áreas. Segundo Hannah, essa variedade permite uma visão mais abrangente dos desafios enfrentados pelas empresárias.
"Nós temos fisioterapeuta, maquiadora, agência de turismo, produtora artística, coach de emagrecimento, analista de coloração pessoal, profissional de estética, manicure, semijoias e outras. Nós sempre dizemos que quando o cliente não acha alguma coisa no mercado é onde você vai crescer o seu negócio. Então a troca de ideias nos permite enxergar uma possibilidade que não vimos antes", falou.
Estética em alta
Foi o que a Karina Viana, 26 anos, percebeu quando decidiu abrir um espaço de bronze no Galeão, na Ilha do Governador, em fevereiro do ano passado. Na falta de opções para o procedimento no bairro, utilizou o quintal para iniciar o negócio. "Meu namorado tinha um espaço grande no quintal de casa que pegava muito sol durante o dia todo. Fiz um curso para confecção dos biquinis com fita e comecei com cinco cadeiras", disse.
Segundo Karina Vianna, fitas para bronze custam em torno de R$ 5 - Paulo Sergio Costa / Agência O Dia
Segundo Karina Vianna, fitas para bronze custam em torno de R$ 5Paulo Sergio Costa / Agência O Dia
Com a popularização da técnica no Rio, a procura aumentou, e ela investiu na característica "praiana" do local. "Melhoramos o paisagismo com areia e coqueiros, para as clientes se "sentirem na praia". Deu certo e hoje o Praia Bronze já tem dez cadeiras", celebrou.
Segundo Karina, o negocio é acessível para quem está começando a empreender. "Uma fita custa, em média, R$ 5, e o sol está brilhando para todos. Se a pessoa se dedicar a aprender a técnica de montagem de biquíni, protocolos de produtos e fizer uma boa divulgação, consegue abrir seu próprio espaço sem gastar muito", afirmou.
Apoio
O Sebrae pode ser o primeiro passo para tem vontade de empreender mas não sabe por onde começar. Segundo o Gerente de Atendimento do Rio, Leandro Marinho, a entidade realizou mais de 1,8 milhões de atendimentos a mais de 200 mil empresas em todo o Estado.
O gerente de Atendimento do Sebrae Rio Leandro Marinho recomenda analisar bem o tipo de negócio antes de abrir - Divulgação
O gerente de Atendimento do Sebrae Rio Leandro Marinho recomenda analisar bem o tipo de negócio antes de abrirDivulgação
A primeira dica de Leandro é analisar bem o tipo de negócio. "Ter identificação e gosto pela atividade que vai ser desenvolvida é essencial. Se a pessoa não tem apreço pelo serviço ou produto, vai ter dificuldade para lidar com isso no dia a dia", explica.
Marinho ressalta que a falta de recursos não deve ser um empecilho para procurar orientação: "O papel do Sebrae é capacitação e unir com outras empresas para atrair parcerias. Além disso, ele consegue aproximar com instituições financeiras para auxiliar na elaboração de projetos e tentar um financiamento junto ao banco”.

Para os interessados em começar a empreender, o Sebrae oferece suporte desde o início. "A pessoa deve entrar em contato pelos canais da entidade e explicar sua ideia. A partir daí, um consultor vai auxiliar na estruturação do projeto para entender a melhor forma de desenvolver os negócios. A instituição também promove a Sessão de Negócios, uma atividade que aproxima diversos empreendedores para que possam encontrar soluções em conjunto", esclarece.
Olho nas oportunidades
O Sebrae nacional destacou algumas opções que podem ser atrativas para quem quer empreender mas está com pouco dinheiro disponível.

- Venda de produtos digitais: E-books, cursos on-line ou áudios;
- Dropshipping: Revenda de produtos de outras empresas sem necessidade de estoque;
- Serviços de cuidador de animais: Passeios e cuidados com pets;
- Serviços de limpeza e jardinagem: Limpeza residencial e manutenção de jardins;
- Venda de produtos artesanais: Roupas, bijuterias ou artigos de decoração;
- Consultoria de moda ou design de interiores: Serviços de consultoria personalizada;
- Venda de comida: Lanches, bolos ou doces caseiros;
- Serviços de tradução ou revisão de textos: Tradução de documentos e revisão de conteúdos;
- Venda de cosméticos naturais ou orgânicos: Produção e venda de cosméticos artesanais;
- Serviços de fotografia e edição de vídeos: Fotografia profissional e edição de vídeos.