Café Lamas é o restaurante mais antigo do Brasil em atividade ininterruptaDivulgação/Riotur
Lojas centenárias se reinventam e movimentam a economia carioca
Trajetória desses lugares está diretamente ligada à memória da cidade
Em meio às transformações ao longo dos anos, tradicionais lojas do Rio de Janeiro encontraram formas de se reinventar e continuam presentes há mais de um século na Cidade Maravilhosa. Estabelecimentos clássicos como Bar Brasil, Café Lamas, Nova Capela, Confeitaria Colombo e Drogarias Pacheco são parte do legado econômico e da história local.
A trajetória desses lugares está diretamente ligada à memória da cidade. Fundado em 1874, o Café Lamas foi palco de um evento histórico brasileiro, conforme conta o sócio majoritário, Milton Brito, ao jornal O DIA.
"O Clube de Regatas do Flamengo foi fundado no Lamas. Foi um grupo dissidente do Fluminense que se desentendeu e fundou o time rubro-negro em 15 de novembro de 1895", diz Milton Brito. O Café Lamas é o restaurante mais antigo do Brasil em atividade ininterrupta.
Brito também lembra de importantes figuras nacionais que costumavam frequentar o local. "Naquela época, o Lamas era praticamente o único restaurante que ficava aberto 24 horas, e políticos, jornalistas, artistas, executivos e empresários frequentavam. Eram figuras como Grande Otelo, Carmem Miranda, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Carlos Drummond de Andrade, Eurico Gaspar Dutra e Itamar Franco", recorda.
Ele conta que o Lamas ainda é um sucesso e mantém um público muito fiel. O restaurante hoje conta com 35 funcionários. Apesar disso, o sócio também afirma que durante a pandemia enfrentou prejuízos financeiros. "O que ajudou a segurar a casa durante a pandemia foi o delivery, porque o restaurante ficou totalmente fechado e não havia como trabalharmos", lembra. "Mas conseguimos manter o funcionamento durante esse período e, embora no prejuízo, continuamos", pontua.
Outro estabelecimento muito famoso no Rio é a Confeitaria Colombo, que se mantém como um elo entre o passado e o presente. A famosa frase "o freguês tem sempre razão" foi criada por Manoel Lebrão, fundador da Confeitaria Colombo, após um desentendimento de Olavo Bilac com outro restaurante sobre o recheio de uma empada. Bilac foi convidado por Lebrão para ir até a confeitaria, e foi nessa época que a Colombo se consagrou na cidade.
Fundada em 1894, a Confeitaria Colombo conta hoje com lojas no Centro (a matriz), CCBB, Ipanema e Forte de Copacabana. O interior da matriz é conhecido por sua decoração luxuosa, com detalhes em mármore, vitrais coloridos e espelhos dourados. Foi essa estética que chamou a atenção da carioca Natália Sobral, de 25 anos, quando frequentou o local pela primeira vez.
"É um ambiente muito bonito e confortável", diz. Apesar de ter gostado da experiência, Natália conta que o lugar estava cheio por ser véspera de uma data comemorativa. "Eu recomendo que a pessoa chegue um pouco mais cedo se for véspera de feriado ou fim de semana, para evitar o lugar lotado", explica.
Antes, a carioca visitou a loja do CCBB, mas conta que o ambiente não teve a mesma graça que a loja matriz. "Eu indicaria a loja principal pela experiência do ambiente", recomenda.
Prezar pela tradição e qualidade também está nos objetivos do Bar Brasil. Gustavo Marins, proprietário do restaurante de comida alemã localizado na Lapa e que trabalha no local há 24 anos, conta que o restaurante conserva as mesmas características de quando foi fundado.
"Quando temos que fazer alguma reforma, tentamos preservar ao máximo o ambiente que temos desde 1907, quando o restaurante foi fundado. É impossível manter exatamente o mesmo ambiente, porque agora, por exemplo, há computadores no meio do salão, mas tentamos não descaracterizar o espaço. Isso faz com que as pessoas venham aqui não só pela comida, mas também pela nostalgia daquela época", conta Gustavo.
Por precisar acompanhar os acontecimentos históricos, Gustavo Marins explica que uma das transformações que ocorreram no Bar Brasil ao longo do tempo foi a mudança de nome do restaurante, que originalmente se chamava Zeppelin. "Aconteceu com o Bar Brasil a mesma coisa que aconteceu com o Bar Luiz e o Bar Lagoa; os dois também tinham outros nomes. E, por conta da Segunda Guerra, sendo um bar alemão, achavam que era um local que fazia apologia ao nazismo, quando na verdade era apenas uma relação com a comida", diz.
O restaurante, que hoje conta com 14 funcionários, também enfrentou problemas durante a pandemia. "Nós tivemos dificuldade com os aplicativos no começo, então precisávamos fechar por um bom tempo. Quando as coisas começaram a voltar ao normal, conseguimos adotar os aplicativos, mas muita gente ficou com medo de sair de casa. Como nosso público é mais velho, por ser um restaurante tradicional, essas pessoas foram as últimas a sair de casa, o que impactou muito o Bar Brasil", explica Gustavo.
Mas o delivery, apesar de ser requisitado, não supera a movimentação do salão, que é de onde vem a maior parte da receita atualmente, de acordo com os donos.
Também de tradição alemã, foi fundada no Rio a confeitaria Itajaí, por Silvério Vidal, que veio para o Brasil fugindo da segunda guerra. Inaugurado em 1932, há quase um século, o restaurante conta hoje com duas lojas no Rio, no Centro e na Barra da Tijuca. O sobrenome Vidal é conhecido entre os jovens cariocas. Os netos de Silvério, Pedro e Ana Vidal, fundaram a hamburgueria "Seu Vidal" em 2016. A nomenclatura foi uma homenagem ao avô, que introduziu a família no ramo gastronômico.
Atualmente, a Itajaí diversifica sua oferta de produtos, incluindo não apenas doces e sobremesas, mas também uma ampla gama de opções de almoços executivos e até frango assado.
Mas os restaurantes não são os únicos que fazem parte de mais de um século de história da Cidade Maravilhosa. Um dos maiores nomes do varejo farmacêutico no Brasil surgiu em 1892, na região central. A Drogarias Pacheco teve sua primeira loja na Rua dos Andradas, no Centro. O lugar foi revitalizado e funciona até hoje com o layout e os objetos da época.
O CEO do Grupo DPSP, Marcos Colares, conta que os maiores desafios enfrentados pela Drogarias Pacheco foram em relação à "expansão da rede e à modernização dos processos logísticos e operacionais". "A modernização dos serviços foi uma das principais mudanças, com a expansão das lojas físicas, o investimento em canais digitais e a criação de serviços de saúde, como salas de vacinação e exames", acrescenta.
“Atualmente, a Drogarias Pacheco conta com mais de 500 lojas em operação, sendo que 73% delas estão localizadas no Estado do Rio de Janeiro”, explica Colares.
Outro ícone do comércio carioca é a Farmácia Granado, inaugurada em 1870. A loja original, ainda em funcionamento, está localizada no Centro, na Rua Primeiro de Março, antiga Rua Direita, 14/16. Fundada por José Antônio Coxito Granado, ela vendia produtos com extratos vegetais de plantas, ervas e flores brasileiras, que eram cultivadas no sítio de seu fundador, em Teresópolis, na Região Serrana.
Em 1880, Dom Pedro II concedeu à Granado o título de Pharmácia Oficial da Família Imperial Brasileira. A loja também é responsável por um dos mais famosos produtos brasileiros de perfumaria, o Polvilho Antisséptico. A fórmula foi desenvolvida por João Bernardo Granado, irmão de Coxito, em 1903, e teve o registro aprovado por Oswaldo Cruz. Hoje, a rede conta com mais de 90 lojas em todo o Brasil e incorporou a Perfumaria Phebo em 2004.
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