Limán, Ucrânia - Cerca de cinquenta fiéis desafiaram as bombas, neste domingo (24), em Lyman, para receber a tradicional benção na Páscoa ortodoxa, que os ucranianos celebram neste domingo em meio à tristeza e os danos causados pela invasão russa e pelos dois meses de guerra.
Em um posto militar da cidade oriental de Lyman, na frente de batalha, os soldados trocaram a habitual saudação patriótica de "Glória à Ucrânia!" por "Cristo ressuscitou!". "Realmente ressuscitou!", respondem em coro.
Na pequena igreja ortodoxa do povoado, 50 civis desafiaram os possíveis disparos de morteiro para se reunirem e rezar desde o amanhecer. Os disparos da artilharia ucraniana e russa foram escutados durante o canto dos salmos.
"Se tomamos decisões equivocadas, a escuridão nos destruirá, como a escuridão está nos destruindo durante essa guerra", disse o sacerdote em seu sermão. "Estamos agradecidos pela ajuda humanitária e pela comunidade que cuida dos deslocados", acrescentou.
Dez soldados e policiais uniformizados, alguns com coletes à prova de balas, também assistiram à missa pascoal.
Pães e Kalashinikovs
Após a invasão russa, que hoje completa dois meses, milhares de pessoas foram mortas e milhões se viram obrigadas a abandonar suas casas.
Na cidade ocidental de Lviv, um casal vestido com suas melhores roupas entrava em uma igreja lotada, carregando a tradicional cesta de desjejum da Páscoa, coberta com uma tela bordada, para que o sacerdote a benzesse.
Yuliya, de 27 anos, escutava o sermão na entrada da igreja com uma amiga. "É uma festa que une a família. Agora, estamos em guerra e é mais importante que nunca seguir com nossas tradições", disse, vestida com um sobretudo negro.
As autoridades ucranianas pediram, no sábado (23), para seguir com os serviços religiosos pela internet e para respeitar os toques de recolher noturnos.
Em uma mensagem especial de Páscoa neste domingo (24), o presidente Volodymyr Zelensky pediu para Deus "não esquecer de Bucha, Irpin, Borodianka" e outras localidades que a Ucrânia acusa as forças russas de atrocidades.
"Nossos corações estão cheios de uma ira ardente, nossas almas estão cheias de um ódio ardente contra os invasores e tudo que eles têm feito", disse Zelensky. "Não permitam que a raiva nos destrua por dentro (...) Transformá-la em força benéfica para desfazer as forças do mal", acrescentou.
Resistência
Na frente de batalha da cidade oriental de Severodonetsk, as tropas ucranianas esconderam suas escassas reservas debaixo de uma ponte após terem sido alcançados por disparos de morteiros russos à noite.
Junto com garrafas de água e de Coca-Cola, Kalashinikovs e barras de cereais, lhes esperavam três grandes pães de Páscoa cobertos por cobertura e polvilhados com açúcar de diversas cores entregues por seu comandante.
Em Sloviansk, no oeste, os fiéis se dirigiram, no sábado (23) à tarde, à catedral Aleksander Nevsky com cestas cheias de ovos decorados e pão doce.
Paisiy, um sacerdote de 34 anos, disse que havia ficado na cidade para oferecer consolo aos numerosos residentes que haviam se negado a ir embora. "Meu trabalho é ficar. O povo tem medo e quando vem aqui, vem ao sacerdote, se sente seguro", disse.
Vários residentes recebiam uma benção com água benta e logo voltavam a subir em suas bicicletas e iam embora. Ninguém ficou mais tempo do que o necessário no pátio da catedral de ladrilhos, enquanto o estrondo da artilharia ressoava ao longe.
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