Uma equipe de cirurgia, incluindo o enfermeiro Abdel Baset Khalil, opera uma criança resgatada dos escombros de um prédio no hospital na cidade de HarimAFP
Estragos do terremoto afetam funcionários de hospital na Síria
Tremor sobrecarregou as unidades de saúde que já careciam de funcionários, equipamentos e remédios
O enfermeiro Abdel Baset Khalil não conseguiu salvar sua família, que ficou soterrada sob os escombros de sua casa, mas continua tratando as centenas de feridos pelo terremoto em um hospital de Harim, uma cidade síria próxima à fronteira com a Turquia.
O tremor que atingiu os dois países na última semana e deixou ao menos 35 mil vítimas, sobrecarregou os hospitais desta região, que já careciam de funcionários, equipamentos e remédios.
"Eu estava ajudando pessoas no hospital enquanto minha esposa e minhas duas filhas estavam debaixo dos escombros, não podia fazer nada por elas", contou à AFP o anestesista de 50 anos que trabalha em um hospital de Harim.
No momento do terremoto, Khalil saiu correndo de seu local de trabalho e percebeu que sua casa havia desabado.
Sem conseguir ajudar sua própria família, voltou ao hospital, onde não só pessoas feridas chegavam em grande quantidade, mas também mortos pelos desabamentos, como o diretor administrativo do hospital e o chefe de enfermaria.
"O primeiro dia foi muito difícil, muito difícil, foi como se 50 anos tivessem passado em um só dia", lembra o enfermeiro.
Nos dias posteriores, aproveitava os raros momentos de descanso para ir até o que restou de sua casa com o objetivo de retirar os escombros. Sua esposa e suas duas filhas foram encontradas sem vida dois dias após o terremoto.
Para Khalil, o pequeno "consolo" é poder visitar seus túmulos, ao contrário de centenas de pessoas que ainda têm seus familiares presos nos escombros.
No momento, mal consegue dormir após o "horror das cenas" que presenciou, mas garante que continuará trabalhando no hospital "para ajudar", diz, enquanto vê fotos de sua esposa e suas filhas no celular.
Desde as primeiras horas dos tremores, o pequeno hospital de Harim ficou superlotado com um grande fluxo de vítimas.
"O hospital foi projetado para tratar feridos em ataques aéreos e a capacidade não passa das 30 pessoas", contou o cirurgião Mohamad Al-Badr. "A situação era tão difícil que os pacientes dormiam no chão das enfermarias e nos corredores", descreveu.
Após o terremoto, a unidade recebeu cerca de 2.500 feridos, dos quais 390 não resistiram, segundo Hasan Al-Hamdo, um cirurgião ortopédico. Assim como outros na região, este ambulatório sofre com a falta de suprimentos e equipes.
"O hospital recebeu muitos casos que exigem exames de imagem, que não estão disponíveis" no momento, diz Al-Hamdo.
Em comunicado publicado na última sexta-feira, 10, a ONG Comitê Internacional de Resgate alertou para um risco de colapso no sistema de saúde no noroeste da Síria, uma região sob controle dos rebeldes.
A organização reitera a falta de suprimentos para emergências hospitalares como soros, curativos, analgésicos e "bolsas mortuárias".
"A não ser que obtenhamos urgentemente mais fundos, suprimentos e acesso humanitário sem obstáculos, os resultados serão catastróficos", alerta a ONG.
No hospital de Salqin, outra cidade próxima à fronteira turca, Hasan Julak, especialista em cirurgia ortopédica, conta que entre 800 e mil feridos, a maioria tem fraturas ocasionadas pelos desabamentos.
"Quinze minutos depois do terremoto, os feridos começaram a chegar em grande quantidade, superando a capacidade do hospital", disse.
A guerra civil na Síria, que começou há quase 12 anos, destruiu a maioria da infraestrutura de saúde no país, especialmente nas áreas controladas por rebeldes no noroeste do país.