Isa Colli é jornalista e escritora - Opinião Divulgação

Não sou especialista em assuntos estratégicos, mas sou um ser humano sensível à dor do próximo. E no meu olhar de atenta observadora do cotidiano, me incomodo demais com as guerras. Não avalio aqui a necessidade do país A ou B levar adiante um confronto bélico, ainda que seja por motivo de defesa, para salvar a humanidade ou como caminho para atingir a paz.
A questão é que, independentemente do propósito, as guerras matam, conduzem à fome, provocam miséria e tiram a dignidade de muitas pessoas. Falei sobre isso com um amigo essa semana, Daniel Balaban, e fiquei muito impressionada com os dados e reflexões que ele me trouxe. Resolvi dividir com vocês.

Daniel sabe o que fala: ele é diretor do escritório brasileiro do Centro de Excelência contra a Fome do Programa Mundial de Alimentos (WFP) da Organização das Nações Unidas (ONU). O WFP é a maior agência humanitária do mundo, que fornece em média, a cada ano, alimentos a 120 milhões de pessoas todos os dias em 80 países. Esse programa foi vencedor do Prêmio Nobel da Paz no primeiro ano da pandemia (2020).
Daniel fez algumas avaliações sobre as despesas mundiais com guerra e os gastos para combater a fome. Ele citou dados do mais confiável órgão sobre orçamentos militares – o Instituto Internacional de Estudos para a Paz de Estocolmo (Sipri, na sigla em inglês) – para mostrar que, se parte desse dinheiro fosse destinada ao combate à miséria, o problema da fome estaria solucionado.
Eu fui pesquisar a fonte que ele me passou e constatei que somente em 2021, mais de US$ 2,1 trilhões (cerca de R$ 10,3 trilhões) foram gastos com equipamentos militares em todo o mundo. Estados Unidos, China, Índia, Reino Unido e Rússia concentram dois terços deste montante, segundo relatório do Sipri, que foi divulgado no final do ano passado. Nas contas de Balaban, se 2% desse gasto anual (US$ 40 bilhões) fossem investidos em apoio a políticas nacionais de combate à insegurança alimentar, o problema estaria resolvido até 2030.
O especialista lamentou que a indústria da guerra envolva tanto esforço de determinadas nações. Ele contou que há grupos de cientistas financiados por estes países que se dedicam exclusivamente às pesquisas e desenvolvimento de armas de guerra. Ao longo da última década, por exemplo, os gastos norte-americanos com essas pesquisas aumentaram em 24%, mostram os números do Sipri. Ou seja, não se percebe disposição em mudar o rumo desta realidade. Para Balaban, se essas mentes brilhantes mudassem o foco das pesquisas da guerra para as questões de combate à desigualdade, mudariam o futuro definitivamente.
Daniel compartilhou, por fim, que seu sonho é que o mundo tenha um fundo de combate à fome. Não é uma utopia se levarmos em conta os trilhões que os governos gastam para financiar as guerras. Para que isso se torne realidade, bastava o comprometimento dos líderes mundiais. Não é pedir muito.
Isa Colli é escritora e jornalista