Diante de um país já polarizado nos últimos anos, tenso pelas atitudes dos extremos e com a população descrente com a classe política, esse tipo de manobra afasta ainda mais o povo, abalando cada vez mais a credibilidade do segmento, diante desse ato corporativista
Aprovações de projetos de lei a toque de caixa ou ao apagar das luzes. Duas ações que sempre foram comuns em nossa classe política, geralmente com temas que são legais, mas nem sempre se enquadram à melhor postura moral que deveríamos ter daqueles que escolhemos, por voto democrático, para nos representar. A mais recente façanha ocorreu nesta semana, com a aprovação de um projeto de lei que torna crime a discriminação contra políticos.
Ainda dependendo da tramitação no Senado e, na sequência, da sanção do presidente, a pretensa lei, cujo projeto é de autoria da deputada Dani Cunha (União-RJ), filha do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (Republicanos-SP), visa a discriminação contra pessoas politicamente expostas. Mas, em verdade e a grosso modo, vai blindar a classe política, o que nos causa estranheza, pois se um cidadão resolve ingressar na vida pública, inevitavelmente se torna alvo de críticas, elogios e opiniões diversas devido a sua exposição.
Além de tipificar crimes que forem cometidos contra pessoas pelo simples fato de serem políticos, a proposta também atinge o Código de Defesa do Consumidor, prevendo punições para instituições financeiras que se neguem a abrir contas ou conceder crédito para políticos.
Diante de um país já polarizado nos últimos anos, tenso pelas atitudes dos extremos e com a população descrente com a classe política, esse tipo de manobra afasta ainda mais o povo, abalando cada vez mais a credibilidade do segmento, diante desse ato corporativista.
Vale ressaltar que existem leis que protegem os cidadãos contra ofensas, calúnias, injúrias, difamações e outras agressões de ordem pessoal. Não faz sentido uma lei específica para uma classe trabalhadora, essencialmente sendo esta, fruto de escolhas democráticas, das quais a população deposita sua confiança para se vê representada nas mais variadas frentes, como Educação, Saúde, Segurança Pública, entre outras.
Outro agravante é o fato de, historicamente, boa parcela dos nossos parlamentares, nas três esferas, responder a algum processo na Justiça ou ser investigada, o que evidencia uma tentativa de protegê-los. Enfim, essa manobra de votação rápida, à noite, pegando todo o país de surpresa, pode estar dentro do regimento, atendendo aos requisitos legais, mas está longe de ser moralmente aceitável, além de, se aprovada, ferir a liberdade de expressão e intimidar a democracia.
Marcos Espínola é advogado criminalista e especialista em segurança pública
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