Sepultamento de Alex Souza, baleado e morto na comunidade Kelson's, o sepultamento aconteceu no cemitério de Irajá.Cleber Mendes

Rio – Alex Souza Araújo dos Santos, de 19 anos, foi enterrado nesta tarde de segunda-feira (6), no Cemitério de Irajá. O jovem morreu após ser baleado na comunidade Kelson's, na Penha, Zona Norte do Rio, no fim da tarde de sábado (4). Alex era jogador de futebol e foi campeão pelo Real Maré no campeonato carioca amador.

Parentes e amigos foram ao funeral para se despedir de Alex. Robson dos Santos, de 40 anos, falou sobre o filho com a voz embargada: "É um momento muito difícil. Será que qualquer outra pessoa mereceria morrer do jeito que morreu, com um tiro nas costas? Sem tiroteio, sem nada. Com um monte de populares na rua? O povo estava todo na rua, cheia de crianças. Um garoto de 19 anos, cheio de vida pela frente, será que merecia isso?"

Um dos ex-técnicos de futebol de Alex, Cleiton lembrou a paixão do adolescente pelo esporte.
"Era um rapaz que sempre estava alegre, feliz. A bola era o que ele mais gostava de jogar. A gente via a luta do pai, Robson, indo trabalhar por volta das 6h30, 7h, e acompanhando o filho, no ponto de ônibus, aguardando o ônibus vir. O pai muitas vezes abrindo mão da sua própria vida pelo sonho do filho. Era um rapaz que dentro de campo só vivia feliz e alegre. Ele era tímido, mas dentro de campo a vida dele era aquilo. Se queria achar o Alex, era no campo. Sempre estava ali, envolvido com futebol, com esporte, já estávamos planejando o próximo campeonato", afirmou.

Quando recebeu a notícia da morte de Alex, Cleiton disse que ficou sem chão: "Quando comentaram que tinham baleado uma criança, eu já não fiquei com a cabeça muito boa. Mas quando falaram que foi o Alex, não tive mais chão. Eu e minha mulher trabalhamos juntos com os jovens e vamos intensificar mais ainda. Não podemos salvar todos, mas o que pudermos fazer, faremos para que esse tipo de covardia não aconteça novamente".

Durante o velório, Robson, que diz que chegou no local do crime em menos de 5 minutos após o disparo que matou Alex, desabafou sobre a situação de despreparo da polícia que deixa a comunidade Kelson's em situação de vulnerabilidade: "Acabei de ver o corpo do meu filho em um caixão e gostaria de dizer que os polícias são despreparados e são um grupo de extermínio. A comunidade já vem sofrendo de diversos abusos há uns seis meses. Meu filho agora está deitado em um caixão, falar que tinha arma, que tinha droga é fácil. Quero ver provar. Cadê a arma? Cadê droga? Rádio? A polícia é despreparada. Quem é pago para defender mata mais que defende. Pode puxar quantos jovens já morreram esse ano pra ver se é mentira o que eu estou falando. Nem se fosse bandido merecia morrer do jeito que morreu. Eles são exterminadores. Não é porque mora na favela que todo mundo é bandido".
"Amanhã é aniversário da mãe dele, isso é presente? Se era bandido, por que não prendeu? Cadê a droga? Não são todos que são maus policiais, mas esse grupo já vem executando adoidado e ficando por isso mesmo", completou o pai.

A Polícia Militar afirma que houve confronto na comunidade na manhã da morte de Alex, versão que é contestada pela família. Em nota, a PM informou que policiais do 16º BPM (Olaria) que participaram da ação foram atacados a tiros por criminosos armados e houve confronto. "Após cessarem os disparos, os policiais encontraram um indivíduo ferido. Ainda de acordo com os agentes, o homem portava um simulacro de pistola, dois rádios comunicadores e drogas. Os militares tentaram socorrer o indivíduo, mas, neste momento, populares atiraram pedras e outros objetos na equipe, que foi atacada novamente por criminosos armados", informa o comunicado.

A corporação disse ainda que foi um homem que socorreu o jovem ferido ao Hospital Estadual Getúlio Vargas. A ocorrência foi registrada inicialmente na 22ª DP (Penha).
Já Robson alega que vizinhos que presenciaram o ocorrido não ouviram troca de tiros, que o filho foi atingido a menos de 10 metros de casa e que carregava apenas um celular. "Só ouviram esse disparo que atingiu o meu filho, meu primogênito, pelas costas. Uma covardia sem fim", lamentou.

Após a morte do jovem, um Posto de Policiamento Comunitário (PPC), base policial da Comunidade Kelson's, foi atacado por moradores da região depois de policiais do batalhão serem alvos de criminosos armados. Em vídeos, moradores revoltados com o ocorrido aparecem atirando objetos em uma viatura da Polícia Militar, que trafegava pelas ruas da comunidade. Imagens também mostram a coluna de fumaça causada pelo incêndio na PPC, que gerou grande comoção popular no local.

Os policiais envolvidos na morte do jovem utilizavam câmeras operacionais portáteis no uniforme. Segundo a PM, as imagens estão sendo analisadas pela Corregedoria Geral da corporação.

De acordo com o comando do 16º BPM, os policiais envolvidos na ocorrência foram ouvidos e será aberto um procedimento apuratório para averiguar as circunstâncias do fato.

Em nota, a Polícia Civil informou que o caso é investigado pela Delegacia de Homicídios da Capital (DHC). Os agentes tiveram suas armas recolhidas para perícia. Outras testemunhas também foram intimadas a prestar depoimento. "Diligências estão sendo realizadas para esclarecer todos os fatos", pontuou.