Heliosa Rocha: dicas de look e conteúdos sobre moda inclusiva no blog Moda em RodasDivulgação

Rio - Para alguém que usa cadeira de rodas, o bolso de trás de uma calça é dispensável. Mais do que isso: é incômodo, machuca e pode abrir feridas no corpo. Já para um deficiente auditivo, a lógica se inverte. Quanto mais bolsos, melhor, para que ele tenha as mãos livres para poder se comunicar por meio da linguagem de sinais. Essas são questões que a jornalista Heloisa Rocha, de 38 anos, levanta sobre o segmento da moda inclusiva, o tema do livro "Um olhar diferente sobre a moda", lançado na última terça-feira, na OAB-RJ, por iniciativa da Comissão de Direito da Moda.

Heloisa, que mantém o blog Moda em Rodas, nasceu com uma deficiência rara, a osteogênese imperfeita, que acomete os ossos e limita o crescimento de seu corpo. Ela é cadeirante, mas não por isso deixou de olhar para o universo da moda como um meio de transmitir sua personalidade como mulher e como profissional. Este, ela afirma, passa a ser o seu cartão de visitas, e não a deficiência.

"Eu tenho menos de um metro de altura, mas sou uma mulher de 38 anos. Tenho que adaptar roupas infantis em looks que passem credibilidade. Eu preciso me adaptar à indústria da moda, quando, na verdade, deveria ser o contrário. O universo da pessoa com deficiência é gigantesco. Um caminho para as marcas seria focar em coleções que privilegiem diferentes públicos, como o cadeirante, a pessoa com nanismo, o paraplégico e por aí vai...", aponta Heloisa, que problematiza o assunto em seu blog e em um dos textos que compõem o livro.

'Um olhar diferente sobre a moda' tem 130 páginas, com artigos, estudos e depoimentos de onze profissionais do país ligados ao segmento da moda inclusiva. O livro é uma iniciativa dos institutos Nação Brasil e Hadassa, tem fontes ampliadas e é transcrito em linguagem Braille. A edição pode ser baixada pelo site https://modainclusiva.com.br/ ou solicitada, na versão física, pelo e-mail modainclusiva.sc@gmail.com, gratuitamente.
Automaquiagem para deficientes visuais

Oficial de Justiça em Fortaleza, Themis Briand, de 37 anos, também participa do livro, no qual conta sua experiência no segmento de automaquiagem para pessoas com deficiência visual. Após ter percebido o quanto ter maquiado uma amiga, que foi perdendo a visão ao longo da vida, elevou a autoestima dela, Themis foi à sua estante de maquiagem e apagou as luzes do quarto.
Com o tempo, foi desenvolvendo metodologia para que uma pessoa com pouca ou nenhuma visão pudesse se maquiar sem erros, desde o reconhecimento dos produtos pelo tato e textura até a aplicação no rosto. A técnica foi validada e, em seguida, passou a ser divulgada no canal de Themis no YouTube, 'Beleza para Todos'.

"Nos vídeos, eu explico o passo a passo da maquiagem básica: rimel, base, blush, corretivo, iluminador, batom e sombra. Uma pessoa com pouca visão pode assistir, mas também quem não enxerga nada, já que a narração é muito detalhada, como se fosse um podcast", explica Themis.

Ela dá exemplos. No caso do batom, ao passar o dedo na região da boca, percebeu com o tato a diferença de textura entre a pele dos lábios e do restante do rosto e, ainda, a linha que marca essa divisão. Com o indicador sobre ela, fez uma barreira, sob a qual poderia passar o batom sem risco de errar.

Já no rimel, pela posição das mãos, chega-se ao posicionamento correto da escova diante dos olhos. No caso do direito, a mão direita segura o produto, enquanto o polegar da mão esquerda vai na ponta da escova, que fica fixa na horizontal. Enquanto o olho pisca, o produto vai nos cílios.

"São tipos de maquiagem que fazem parte do dia a dia de praticamente toda mulher, inclusive da deficiente visual. Não é porque ela não enxerga que ela não pode se maquiar. Com essas técnicas, ela ganha independência. Testamos exaustivamente e dá certo. É uma quebra de paradigma", diz Themis.

Adaptações sem perder em estilo e elegância
Estilista de formação, Silvana Louro, de 62 anos, só passou a atuar na área quando, em um ambiente de trabalho, percebeu as dificuldades que pessoas cadeirantes tinham para fazer tarefas do dia a dia, como ir ao banheiro. A roupa era um empecilho. Foi então que passou a frequentar instituições que atendem pessoas com deficiência para pesquisar alternativas para adaptação do vestuário. 
Foi assim que, em 2013, lançou a marca Equal Moda Inclusiva, que produz peças que se adaptam às necessidades da pessoa com deficiência mas sem perder em estilo e elegância. A calça com zíper em toda a extensão lateral é um exemplo. Ela ajuda a vestir quem tem uma prótese na perna, mas também cai bem em mulheres que não têm essa necessidade. 
"Neste caso, ela pode puxar o zíper mais acima, o que vai depender até que ponto quer mostrar sua perna", diz Silvana. 
Outro exemplo são os vestidos para cadeirantes. A parte de trás é mais alongada. Assim, na posição sentada, ele não sobe, evitando que as pernas sejam mostradas demasiadamente. 
"Nas calças, a modelagem é também específica, não havendo aquele excesso de pano na parte de trás dos joelhos, que incomoda e machuca o cadeirante".
Em 2021, a Equal Moda Inclusiva firmou parceria com a Reserva para a criação da linha Adapt& + Equal, que integra o portfólio contínuo da marca.