Rio - O Governo do Rio vai publicar, na próxima semana, um edital de licitação para a contratação de novas câmeras equipadas com softwares de reconhecimento facial, leitura de placa de veículos e sensores de alarme. A medida dará início ao processo de implantação do Sistema de Videomonitoramento Urbano nas vias expressas, túneis e na orla, e representa um investimento de mais de R$ 84 milhões.
"Essa nova aquisição será fundamental para ampliarmos a estrutura tecnológica voltada para a segurança pública. O novo sistema de monitoramento dará maior efetividade às ações dos nossos policiais, começando pela capital e, em seguida, avançando para outros municípios da região metropolitana e do interior do estado", disse o governador Cláudio Castro.
Na primeira fase do projeto, as câmeras serão instaladas na capital do estado. Todas as novas câmeras estarão interligadas ao Sistema Security Command, adquirido no final do ano passado e já instalado no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC) da Secretaria de Estado de Polícia Militar do Rio.
Além de viabilizar o Sistema de Videomonitoramento Urbano, o Security Command foi concebido para estar conectado a diferentes plataformas tecnológicas empregadas na área de segurança. Entre elas, estão o Serviço 190 e câmeras e sensores de instituições públicas e privadas, que serão inseridas no sistema por meio de chamamento público programado para breve.
A nova tecnologia permitirá que as imagens geradas pelas câmeras, com as respectivas informações adicionais programadas pelos softwares, sejam transmitidas em tempo real para uma central de operação no CICC. Caso as câmeras identifiquem, por exemplo, veículos roubados ou pessoas com mandado de prisão em aberto, o setor de despacho de viaturas do Serviço 190 será imediatamente acionado pelo sistema para agilizar a abordagem.
A licitação
De acordo com as especificações previstas na licitação, as câmeras terão duas finalidades específicas. Um lote estará equipado com software de reconhecimento facial para monitorar a orla da capital, começando pelo Leme, na Zona Sul, e se estendendo até a Barra de Guaratiba, na Zona Oeste.
Ja o outro lote de câmeras, com softwares de leitura de placas de veículos, estará distribuído ao longo de duas vias expressas – linhas Amarela e Vermelha – e em quatro túneis – Santa Bárbara, Rebouças, Alaor Praça (Túnel Velho) e Zuzu Angel.
Os dois grupos de câmeras serão equipados com o software de análise comportamental, dispositivo que emite um alarme quando o sistema identifica situações suspeitas, como, por exemplo, uma pessoa escalando uma cerca ou um poste.
"Este é mais um exemplo da importância do emprego de ferramentas tecnológicas na área de segurança pública. Além das aquisições de novos equipamentos, estamos investindo muito na capacitação da nossa tropa, tanto dos operadores lotados no CICC quanto dos policiais que atuam na ponta", pontua o secretário da SEPM, coronel Luiz Henrique Marinho Pires.
O que dizem os especialistas
Para Wallace Corbo, professor de Direito Constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), o monitoramento de vias contribui para ações de inteligência, mas não é uma solução milagrosa. "O Estado tem ignorado, muitas vezes de maneira inconstitucional, algumas medidas centrais à melhoria da segurança, como a instalação de câmeras em uniformes de agentes de segurança e de viaturas. Sem uma visão global do combate à violência e a grupos criminosos, uma ou outra medida pontual produzirá efeitos típicos de 'enxugar gelo'", afirmou.
Questionado se a gravação viola o direito à privacidade do indivíduo, o especialista pontua a necessidade de um armazenamento seguro dos arquivos. "Haverá problemas, não só para a privacidade, como também para outros direitos fundamentais, se o estado não assegurar a segurança dessas imagens ou se aplicar às gravações mecanismos que já são comprovadamente discriminatórios. O monitoramento deve ser acessado para fins de segurança pública ou para a preservação de direitos de indivíduos", disse.
"A princípio, a gravação não viola o direito à privacidade. Isso se partirmos do pressuposto de que as gravações serão armazenadas de maneira segura, com acesso restrito e sem tratamentos discriminatórios. Exemplo disso são os softwares de reconhecimento facial, que têm gerado preocupação da comunidade científica por, muitas vezes, reconhecerem de maneira inadequada certas pessoas, como pessoas negras, produzindo consequências graves, como prisões indevidas", finalizou Corbo.
O sociólogo e professor do Departamento de Sociologia e Metodologia das Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense (UFF), Daniel Veloso Hirata, analisa que aquisição do Sistema de Videomonitoramento Urbano é uma questão complexa, principalmente no que diz respeito ao reconhecimento facial, pois exige transparência por parte do estado com relação ao que está sendo feito. O professor cita ainda que há uma grande discussão no mundo sobre a maneira pela qual os algoritmos estão sendo usados e as consequências que esse uso tem para determinados estigmas sociais, sobretudo a racismo.
"Seria importante que o governo divulgasse a maneira pela qual o sistema vai funcionar. É uma questão delicada. De maneira ampla, podemos dizer que os algoritmos governam parte das nossas vidas, portanto, a maneira pela qual eles são construídos é uma questão de interesse público. É necessário que a sociedade tenha acesso a todos os critérios pelas quais são construídos", afirma o sociólogo Daniel Veloso.
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