Rio - Seis policiais que participaram da operação que resultou na morte do menino João Pedro Mattos Pinto, de 14 anos, prestaram depoimento como testemunhas na quarta audiência do julgamento do caso. O caso aconteceu em maio de 2020, no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, Região Metropolitana do Rio. A sessão começou por volta das 11h desta quarta-feira (12), no Fórum Juíza Patrícia Lourival Acioli, e teve cerca de sete horas de duração.
Foram ouvidos pela juíza Juliana Ferraz Krykhtine o delegado Sérgio Sahione Ferreira, responsável por coordenar a operação junto aos policiais da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), o policial Jair Correa Ribeiro, que estava presente no momento dos fatos, dois peritos da Civil que estiveram na casa de João Pedro após a morte dele, e outros dois policiais que pilotaram os helicópteros que tiraram os policiais da comunidade.
O delegado Alan Duarte, na época titular da Delegacia de Homicídios de Niterói e São Gonçalo (DHNSG) e responsável pelas investigações, também era aguardado para prestar depoimento nesta quarta-feira (12). No entanto, ele apresentou um atestado médico e teve a oitiva marcada para o dia 2 de agosto.
Nos depoimentos, alguns policiais que participaram efetivamente da operação afirmaram que houve confronto com traficantes armados durante a fuga no interior do Complexo do Salgueiro. Outros agentes que estavam distante do local dos fatos, disseram terem ouvido tiros, mas não viram a fuga dos traficantes.
Após o fim da quarta audiência, o defensor público Luis Henrique Linhares Zouein disse que o caso começou a avançar e está próximo de ter a decisão final. "Depois de muita demora o processo está avançando. Nós estamos muito confiantes que no dia 2 será encerrada a produção de provas e caminharemos para a decisão de pronúncia e os réus irão a júri popular", afirmou ao DIA.
O defensor também relembrou as orientações da Corte Interamericana de Direitos Humanos, em que não caberia à Polícia Civil investigar crimes que envolvem os próprios agentes em posição de réus.
Antes de iniciar a audiência de testemunhas de acusação, o advogado Marcelo Ramalho, que defende os policiais Mauro José Gonçalves, Maxwell Gomes Pereira e Fernando de Brito Meister, réus por homicídio duplamente qualificado e por fraude processual, disse que os depoimentos desta quarta-feira (12) iriam reforçar que houve troca de tiros com traficantes do Complexo do Salgueiro. "A defesa espera que seja mostrado, através dos policiais que participaram da operação, que houve realmente um confronto no local dos fatos e que o resultado não era esperado pelos policiais", disse Ramalho.
O advogado diz ainda que não é plausível policiais experientes saírem em operação para matar inocentes. "Foi uma fatalidade", completou ele.
O deputado estadual Professor Josemar (Psol) também compareceu à audiência. Atualmente membro da Comissão de Combate à Discriminação da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), o deputado disse esperar que os fatos sejam elucidados o quanto antes. "Esperamos que seja feita a justiça. É um caso que se arrasta há mais de três anos. Esperamos que possamos elucidar ainda mais esse caso", disse.
O professor afirmou também que o caso trata-se de um preconceito racial contra um jovem negro em São Gonçalo. "É um caso emblemático. Está diretamente ligado a um preconceito racial. Se fosse qualquer outro lugar, não teria acontecido isso", completou.
No dia 24 de maio, outros cinco policiais federais também prestaram depoimentos. Eles afirmaram que nenhum policial federal foi à casa onde estava João Pedro, e que ficaram apenas no local apontado pela inteligência como residências dos traficantes.
Nesta mesma audiência, por videoconferência, o delegado da Polícia Federal Carlos Faria, chefe da operação, disse que o destacamento de Brasília foi requisitado pela Superintendência da PF do Rio, com o objetivo de cumprir mandados de busca e apreensão e de prisão contra os traficantes conhecidos como Hello Kity, Faustão e 20 anos.
Segundo o Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), duas audiências de instrução já foram realizadas em 2022, em setembro e novembro, para ouvir testemunhas. No dia 24 de maio, cinco policiais federais foram ouvidos em uma terceira audiência, por videoconferência, também como testemunhas de acusação. Já o interrogatório dos réus está marcado para o dia 2 de agosto.
Relembre o caso
João Pedro jogava videogame com mais cinco amigos na casa do tio, quando, segundo testemunhas, os agentes entraram atirando. O adolescente foi atingido por um disparo de fuzil na barriga e socorrido de helicóptero, mas não resistiu aos ferimentos.
Na ocasião, seu corpo chegou a ficar desaparecido, sendo encontrado horas depois pela família no Instituto Médico Legal (IML). Investigações apontaram ainda que a casa do tio do jovem, onde ele estava quando foi atingido, ficou com mais de 70 marcas de tiros.
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