Sete linhas de ônibus — cinco para Campo Grande — foram criadas com a inauguração do terminal, ontemCléber Mendes

Rio - A Prefeitura do Rio inaugurou nesta quarta-feira (20) o Terminal Deodoro, na Zona Oeste, que integra, em um primeiro momento, os trens da SuperVia, ônibus convencionais e o BRT da Transolímpica. No futuro, haverá também a integração com o corredor BRT Transbrasil. Além disso, foram anunciadas a criação de sete novas linhas alimentadoras do novo terminal, sendo que cinco sairão da região de Campo Grande. Essa logística não agradou muito aos moradores da região que reclamaram, seja nas ruas do bairro, ou mesmo nas redes sociais da Prefeitura.

A principal queixa dos usuários é com relação à baldeação em Deodoro, que os fará utilizar até três conduções para chegar ao Centro. Eles alegam que anteriormente utilizavam apenas um ônibus, os chamados expressos ou rápidos, que usavam a antiga ‘pista seletiva’ para ir dos bairros mais distantes da Zona Oeste, como Campo Grande, Santa Cruz e adjacentes para o Centro. E agora terão de pegar um alimentador até o Terminal Deodoro, lá pegar o BRT Transbrasil até o futuro Terminal Gentileza, onde tomarão o VLT até o Centro

De acordo com estimativa da Prefeitura, os passageiros de transporte público de diversas regiões terão o tempo de viagem reduzido em até 30 minutos. "O que estamos fazendo é permitir que o cidadão que se desloca por essa cidade possa ganhar, às vezes, duas horas por dia para ir para casa ver os filhos, namorar com a esposa, ver novela, ir para o culto religioso, ir para o samba e jogar pelada com os amigos em vez de ficar perdendo esse tempo no transporte", disse o prefeito Eduardo Paes.

Mas não é o que acreditam os usuários. No Instagram da Prefeitura, Leonardo Santos reclamou: “Agora o povo da zona oeste que trabalha no Centro, ao invés de pegar somente um ônibus expresso. Terá que pegar um ônibus até Deodoro + BRT (até a rodoviária) e depois que lute com VLT. Resumindo, o que era um transporte, passará a ser 3”.
Edileuza de Lima (esq.) e Maria Cristina criticaram o BRT Transbrasil - Danillo Pedrosa
Edileuza de Lima (esq.) e Maria Cristina criticaram o BRT TransbrasilDanillo Pedrosa
Para moradores de Campo Grande como Maria Cristina, de 58 anos, é difícil ser convencido de que haverá benefícios com tantas baldeações.

"Não vai melhorar, não. Vai ser muito pior para todo mundo. Não vamos ter nenhum benefício, porque vou ter que pegar três conduções para chegar até o meu serviço", disse a técnica de enfermagem, que mudou o horário de trabalho para a noite justamente por causa da demora no deslocamento durante a manhã. O motivo é o desaparecimento das linhas que faziam o trajeto Campo Grande - Tiradentes, como 366 (via Estrada do Mendanha) e 398 (via Estrada da Posse).

"Era muito melhor, a gente ia direto para o Centro. Às vezes, fazia em menos de uma hora. Era muito melhor. Agora acabou. Ou você paga R$ 18 ou faz baldeação. É muito cansativo", relatou Maria.
A diarista Edileuza de Lima, 60, compartilha da indignação. Como exemplo, ela cita o BRT Transoeste, que tornou mais complicada a missão de ir à Barra da Tijuca e ao Recreio dos Bandeirantes desde a sua inauguração, em 2012. Antes, era necessário apenas um ônibus para chegar à praia, o 853. Agora, são três.

"Vai ser muito mais complicado. Já é agora para ir para o Mato Alto. Antes, a gente tinha ônibus direto para a Barra da Tijuca, e agora são três conduções, a não ser que a gente pague quase R$ 20 no Frescão para ir direto. Ninguém aguenta", analisou Edileuza, que hoje mora em Seropédica.

Além da demora no momento de trocar de condução, o estresse de repetir todo o processo tira do sério quem já tem a rotina tão corrida. Para a professora de História Márcia Coque, de 57 anos e moradora de Senador Camará, as baldeações têm tudo para dificultar a rotina de quem trabalha no Centro do Rio.

"Não gosto dessa ideia de parar no meio do caminho para fazer uma baldeação. A gente já está tão cansado e aí tem que descer de um ônibus para pegar outro, fazer todo o processo de novo. Prefiro ir direto. Esse negócio de parar no meio do caminho, enfrentar outra fila e tudo de novo não presta para mim", reclamou.

Por outro lado, há quem esteja otimista com a novidade. É o caso do cozinheiro Victor Senna, morador de Seropédica, que está cansado de levar cerca de duas horas e meia nas idas ao Centro do Rio, principalmente por causa das obras na Avenida Brasil. Com a inauguração do Terminal Deodoro, ele acredita que o trajeto será mais rápido.

"Está piorando bastante o trânsito no momento, com vários pontos em obra, mas acho que futuramente vai melhorar a chegada ao Centro. Vai fazer com que as pessoas não precisem sair tão cedo de casa para chegar ao trabalho", disse Victor., de 27 anos.
Victor Senna, cozinheiro - Danillo Pedrosa
Victor Senna, cozinheiroDanillo Pedrosa
O que diz a prefeitura

Em nota, a Prefeitura do Rio disse, sobre as críticas dos usuários, que “o planejamento operacional da Transbrasil ainda não está concluído. No entanto, sabemos que a redução dos intervalos da ligação, por meio do BRT, assim como a garantia de trânsito livre entre Deodoro e o Terminal Gentileza, sem possibilidade de estar sujeito aos congestionamentos da Avenida Brasil, garante que o deslocamento realizado por meio do BRT representará ganho de tempo para a população”.

Mestre em Engenharia Urbana pela UFRJ e gerente do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), Bernardo Serra destaca que ao promover constantes integrações para os usuários do sistema, é preciso promover conforto nesse processo, evitando problemas como longas esperas, veículos lotados e outros.

“Se você gerar mais integração para o usuário sem conforto, isso evidentemente poderá causar transtorno. Depende muito de como será implantado o Terminal. O usuário que mora na Avenida Brasil a princípio deveria ter um ganho de tempo, quem circula sabe que hoje é algo que demora bastante. O BRT em si deveria ter um ganho de tempo, mas depende da integração nessas pontas”, afirmou.

De acordo com especialista em mobilidade urbana e ex-professor do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe-UFRJ, Ronaldo Balassiano, é preciso uma cooperação entre município e estado para que o BRT atinja todo seu potencial, beneficiando inclusive os usuários vindos da Baixada Fluminense.

“O sucesso do BRT Transbrasil vai depender de como esse novo sistema funcionará. Eu sou otimista, até porque tem o potencial de incluir a massa de usuários que vem da Baixada. Mas a operação não precisa ficar necessariamente com a Prefeitura, o que a gente precisa do monitoramento de um único órgão juntando estado e município. Não precisa ser o prefeito, o governador. Precisa de um órgão que administre toda a malha de transporte da região metropolitana. Ônibus, trem, metrô, BRT”, disse.