Pesquisa revela as condições de segurança alimentar nas favelas do Complexo do Alemão William West / AFP

Rio - Um levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) com mais de 8 mil moradores do Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio, aponta que 75% das famílias com crianças de até 6 anos convivem ou já conviveram com a insegurança alimentar nos últimos três anos. Os dados foram divulgados, nesta segunda-feira (16), Dia Mundial da Alimentação.

A pesquisa, realizada de 2019 a 2023, revela as condições de segurança alimentar nas 13 favelas que compõem o complexo. De acordo com os dados, 80% dos moradores convivem com algum nível de insegurança alimentar. Desses, 53% estão em situação grave.

Um dos gráficos mostra, ainda, que mais de 70% dos entrevistados tiveram alimentação insuficiente causada pela falta de dinheiro para comprar alimentos variados e saudáveis. Além disso, 40,3% dos moradores diminuíram a quantidade de alimentos ou pularam refeições por não ter condições de comprar comida.
Em relação à alimentação das crianças na primeira infância, de 0 a 6 anos, os números indicam que quase 69% das famílias precisaram comprar itens de baixo custa para alimentá-las. Entre essas famílias, 41,3% estiveram nessa situação algumas vezes e 27% de forma frequente.

O levantamento aponta também que 11% dos moradores declararam que seus filhos já ficaram um dia inteiro sem comer porque não havia dinheiro para adquirir os alimentos. Desses, 33% ficaram nessa situação por quase um ano e 51% ficaram alguns meses.

De acordo com a diretora de pesquisa do Ibase, Rita Brandão, a falta de alimentação prejudica o desenvolvimento cognitivo dessas crianças. "De 0 a 6 anos é o período de maior desenvolvimento cognitivo das crianças e isso está diretamente ligado ao aprendizado, ao desempenho escolar e às possibilidades futuras. Quando a gente vulnerabiliza as crianças a ponto de não terem o que comer, a gente está condenando toda uma geração futura a ter baixo desemprego e baixa escolaridade. Então, a alimentação está diretamente ligada ao desenvolvimento cognitivo das crianças e por isso, ela é tão importante nessa faixa etária", explicou.

Pesquisas como essa foram realizadas também em outras comunidades do Rio e da Baixada Fluminense. Segundo a diretora de pesquisa do Ibase, os dados serão divulgados em breve. "Pesquisas como a nossa são fundamentais para que as políticas públicas possam ser retomadas e as pessoas parem de passar fome. Nós estamos há 13 anos sem um censo demográfico e nos últimas três anos tivemos descontinuidade de várias pesquisas importantes nas quais as políticas públicas são pautadas", ressaltou Rita.
De acordo com o gerente de campanhas da ONG Ação da Cidadania, Norton Tavares, os números alarmantes do Complexo do Alemão são os mesmo de outras comunidades. "A gente encontra essa realidade em outras comunidades do Rio e isso é resultado de uma posição que o Brasil escolheu enquanto política pública de combate à fome. A gente teve um governo que não tinha a fome como prioridade e agora, estamos vendo o resultado disso na prática. A única coisa para erradicar a fome no Brasil são políticas públicas voltadas para atender as pessoas mais vulneráveis do país", ressaltou ao DIA.

Para ele, a desigualdade social é uma das características mais fortes do Rio. "O Brasil tem muitos lugares com essa característica, bairros pobres ao lado de bairros ricos e isso é um processo de desigualdade social, essa pesquisa é um microcosmo do que acontece no Brasil como um todo. E o Rio é um dos municípios que tem muito dessa mistura de bairros pobres e ricos próximos", explicou.
Natal sem Fome
A campanha de arrecadação de alimentos criada pela ONG Ação da Cidadania, aconteceu no domingo (15) no Aterro do Flamengo, Zona Sul do Rio. As doações podem ser feitas até dezembro.
A campanha, que completa 30 anos, foi criada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. Desde então, a ONG já arrecadou 55 mil toneladas de alimentos, distribuídos para 26 milhões de pessoas. 
A meta deste ano é arrecadar cerca de 400 mil cestas básicas, que serão distribuídas em dezembro. Ano passado, mais de 320 toneladas de alimentos foram entregues para famílias necessitadas.
As doações para o Natal Sem Fome podem ser realizadas no site oficial ou através do PIX: doe@natalsemfome.org.br.