Caixão do jornalista estava com as bandeiras do Vasco, da Mangueira e da PortelaReginaldo Pimenta / Agência O Dia

Rio - Familiares e amigos estiveram na Sede Náutica do Vasco da Gama, na Lagoa, Zona Sul, para se despedir de Sérgio Cabral, nesta segunda-feira (15). O jornalista e escritor estava com a saúde fragilizada desde o início do ano e morreu aos 87 anos, no domingo (14), após ficar três meses internado, por complicações de um enfisema pulmonar. Ele também sofria de mal de Alzheimer desde 2016. Cabral foi cremado no Cemitério Memorial do Carmo, no Caju, na Zona Portuária, nesta tarde.
Além do filho, o ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, a filha Cláudia Cabral, e a viúva, a museóloga Magaly Cabral, nomes da política fluminense também estiveram no velório no salão nobre, entre eles o ex-presidente da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), Paulo Mello, e o ex-deputado Paulo Ramos. O ex-dirigente e o ex-presidente do Vasco, Carlos Osório e Jorge Salgado, também foram ao velório para a despedida.
O cantor e compositor Paulinho da Viola, também esteve na sede náutica do Vasco e relembrou o show, chamado Sarau, considerado um marco para o samba, que fez ao lado de Cabral. "O Sérgio, como tudo mundo sabe, era uma pessoa que conhecia muito a cultura do samba, a cultura brasileira, uma pessoa muito bem humorada, vascaíno como eu. Eu acho que é uma perda muito grande, a gente deve muito a ele, os livros que ele fez sobre a música brasileira, sobre várias figuras da música brasileira, e isso é da nossa história. A gente fica muito triste de perder uma pessoa como o Sérgio", lamentou.
Coroas de flores foram enviadas em homenagem ao jornalista pelo governador do Rio, Cláudio Castro, o atual presidente da Alerj, deputado Rodrigo Bacellar (União Brasil), bem como por personalidades e entidades da cultura, como Zeca Pagodinho, Diogo Nogueira, as escolas de samba Estação Primeira de Mangueira e a Portela, o Teatro Casa Grande, e o Vasco da Gama, time do coração do escritor. A associação Brasileira de Imprensa (ABI) também prestou homenagem.
O ex-governador do Rio destacou a importância do pai como jornalista e sua notoriedade na cultura, ao apresentar, na década de 1960, artistas que viriam a se tornar grandes da música brasileira, como Cartola e Nelson Cavaquinho. Na política, como vereador nos anos 1980, Cabral lembrou que ele se destacou pela criação da lei que constitui o bairro de Santa Teresa em área de proteção ambiental, bem como a medida que obrigou os shoppings a terem cinemas e teatros. O político também descreveu o escritor como um apaixonado por biografias e lembrou que ele foi autor de mais de 20 delas.
"Ele foi um ser humano múltiplo. O Cabral era como Mário de Andrade: eu sou 300, sou 350, variadíssimo (...) Como pai, como chefe de família (aprendi) amor, humildade e fraternidade. Como personalidade da história, a identidade popular, o antirracismo, o amor ao Rio", declarou Sérgio Cabral. Entretanto, para o ex-governador, seu papel mais marcante foi como pai e chefe de família.
"Sobretudo, fica a saudade de um paizão. Eu pulava em cima daquela barriga dele quando era menino, brincava, ia para o jogo do Vasco de mãos dadas. Esse aqui (sede Náutica do Vasco) é um lugar muito significativo para a gente, ele fez aniversário, lançou livro. Mas vamos aqui nos despedir e celebrar o grande serviço que ele prestou ao Rio de Janeiro, ao Brasil e à cultura brasileira", completou.
A filha de Sérgio Cabral, Cláudia Cabral, descreve seu pai como um homem muito amoroso, que sempre esteve presente, e um grande amigo. "Meu pai sempre foi um pai muito amoroso, muito amigo e vai fazer uma falta imensa. Para o país, ele deixa o legado da cultura, do amor à música, ao samba, principalmente, as biografias dele, de Tom Jobim, Elizeth Cardoso, Almirante, Grande Otelo, Nara Leão. Para a gente, ele deixa o legado do amor à música, ao Carnaval, à leitura. Ele dizia: 'quando não tiver nada para ler, leia bula de remédio, mas sempre leia'; à escrita, porque sempre escreveu muito bem, e à família, porque nossa família é muito unida, graças a ele", contou.
A viúva do jornalista, a museóloga Magaly Cabral, destacou que ele era um grande jornalista e escrevia com uma habilidade excepcional. Juntos por 65 anos, ela o descreveu como um homem alegre, tanto com a família quanto com os amigos, e lembrou de sua trajetória. "Ele já escreveu sobre música, futebol e polícia. Vou lembrar dele como um grande carioca e belo jornalista com textos maravilhosos. Ele sempre quis falar sobre sobre a Música Popular Brasileira através dos livros dele, desde o início. Então, ele deixa um legado para esse país e principalmente para o Rio de Janeiro", contou. 
Ao lado de Cabral, a historiadora e presidente do Arquivo Geral da Cidade do Rio, Rosa Maria Araújo criou o musical Sassaricando, que contava a história da capital fluminense a partir das marchinhas que até hoje embalam foliões em todo o Brasil. Para ela, produzir espetáculo ao lado do escritor foi um privilégio.
"Sérgio Cabral era uma pessoa única no Rio, um carioca militante que se preocupava com o povo, foi vereador, foi preso na ditadura por causa do O Pasquim. Ele era um humanista, que gostava de música, futebol, literatura, ópera, jazz, um entendedor de samba e um sujeito muito sério para trabalhar. Aquele jornalista de redação das antigas, que começou como repórter policial, depois foi se especializado em futebol, em música brasileira e em samba. O Sergio era um dos melhores papos do Rio, todo mundo dizia, no botequim, no salão, em qualquer lugar", descreveu Rosa Maria.
Álvaro Lopes, o Alvinho, presidente da Em Cima da Hora, escola de samba de Cavalcante, na Zona Norte, onde Cabral foi criado e tema de enredo em 1997, destacou o escritor como um grande entusiasta e ícone do samba.
"É uma perda lamentável, hoje o samba chora sua ausência (...) Acho que o maior legado que o seu Sérgio nos deixa é a saudade e de como se deve amar uma escola de samba realmente, e de como se deve amar um bairro onde foi criado. Seu Sérgio foi enredo mais do que justo, porque a homenagem é digna de um grande compositor, de um grande escritor, de um grande jornalista, enfático na cultura brasileira, e nada mais justo que a Em Cima da Hora tenha homenageado esse grande homem. Tenho a plena certeza que nosso 'cavalcantianos' estão de luto com a perda desse grande ícone", ressaltou.
O caixão com o corpo do jornalista foi coberto com bandeiras do Vasco da Gama e das escolas de samba Portela e Mangueira. O velório, que começou às 8h e terminou ao meio-dia, foi encerrado com músicas do Vasco, marchinhas, orações e com membros da bateria da Mangueira entoando "Cidade Maravilhosa". O corpo seguiu seguiu para o Cemitério Memorial do Carmo, no Caju, na Zona Portuária, onde foi cremado em cerimônia restrita aos familiares.
Carreira
Nascido em Cascadura, na Zona Norte, Sérgio Cabral começou sua carreira em 1957 como repórter do Diário da Noite. Um dos fundadores do jornal "O Pasquim" e editor de vários jornais e revistas por décadas, ele foi autor de mais de 20 livros, entre eles as biografias de Pixinguinha, Almirante, Nara Leão, Ary Barroso, Tom Jobim e Ataulfo Alves.
Com o livro sobre Pixinguinha, inclusive, o escritor ganhou o concurso de monografias sobre música popular, instituído pela Fundação Nacional de Artes (Funarte), em 1977. Cabral também foi responsável por muito do que se sabe sobre música brasileira. O jornalista foi parceiro de Rildo Hora na composição de diferentes canções como Janelas Azuis, Visgo de Jaca, Velha-Guarda da Portela e Os Meninos da Mangueira.
No mundo do Carnaval, Sérgio trabalhou como repórter nos desfiles das escolas de samba na década de 60. Ele também foi comentarista das apresentações passadas na TVE e na TV Manchete. Cabral até escreveu um livro sobre as agremiações na década de 90.
Vida na política
Assim como o filho, ele também teve carreira na política, sendo vereador do Rio na década de 80, tendo atuado na elaboração da Lei Orgânica do Município e do Plano Diretor da cidade. Entre os projetos de sua autoria transformados em lei, está o que constitui o bairro de Santa Teresa em área de proteção ambiental e o que obriga a construção de salas de espetáculos nos centros comerciais construídos no Rio.
No cargo de Secretário Municipal de Esportes e Lazer (1987/1988) criou a Fundação Rio Esporte entre outras atuações destacadas. Em 1993, teve seu nome aprovado pela Câmara de Vereadores para exercer a função de Conselheiro do Tribunal de Contas do Município (TCM) substituindo o conselheiro aposentado Luiz Alberto Bahia.