Brasília - A semana terá uma atração extra no Senado: na quinta-feira a CPI da Previdência vai começar a ouvir os maiores devedores do INSS, entre eles o grupo JBS, que em delação premiada disse ter desembolsado pelo menos R$ 941 milhões em propina a 1.829 políticos, entre eles o presidente Michel Temer, o que fez com que a crise política alcançasse um novo patamar. O dinheiro que sobrou para propinas faltou para a Previdência Social. O frigorífico deve R$ 1,8 bilhão ao INSS.
Segundo levantamento feito pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, responsável pela cobrança das dívidas com a União, o grupo JBS é o segundo maior devedor da Previdência, com um montante de R$ 1.837.489.343,08.
O valor só é superado pela antiga companhia aérea Varig, que faliu em 2006 e que deve R$ 3.713.041.224,05 bilhões. O relator da CPI da Previdência, senador Hélio José (PMDB-DF), pergutna: “Existe o lucro dessa empresa, existe ‘distribuição’ de dinheiro, porque então não pagam à Previdência?”.
Também comparecerão à audiência pública representantes dos frigoríficos Marfrig, Margen e Nicolini, informou ao DIA o presidente da CPI, senador Paulo Paim (PT-RS). Juntos, os cinco frigoríficos devem mais de R$ R$ 3,8 bilhões à Previdência, segundo dados da Procuradoria-Geral de Fazenda Nacional.
“Neste primeiro momento as empresas foram convidadas, mas, se faltarem, serão convocadas”, adverte o relator. “Não é possível que empresas tenham ganhos milionários e não paguem o que devem à Previdência e o trabalhador tenha que pagar essa conta via Reforma da Previdência”, complementa Paim.
Receita de R$ 170 bi
Os números da JBS no ano passado corroboram a afirmação dos senadores. Somente em 2016, o grupo JBS apresentou receita líquida de R$ 170,4 bilhões, segundo informações que constam no balanço da companhia.
A dívida que a Previdência tem a cobrar chega a R$ 426,07 bilhões, quase três vezes o déficit do setor, que foi cerca de R$ 149,7 bilhões no ano passado, segundo informou o senador. O objetivo da CPI, conta, é chamar os devedores à responsabilidade para que paguem o que devem.
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Só que a cobrança desse dinheiro não é tão simples. A procuradoria tenta recuperar parte do dinheiro por meio de ações na Justiça. No ano passado, voltaram aos cofres da União, aproximadamente, R$ 4,15 bilhões, cerca de 1% do total devido.
O procurador Cristiano de Moraes diz que a procuradoria tem desenvolvido projetos para agilizar o pagamento das dívidas, mas programas de parcelamento de dívidas de estados e prefeituras acabam desincentivando o pagamento dos débitos.
Ineficiência na fiscalização impacta a Previdência, com ou sem reforma
Em entrevista ao DIA, o senador Paulo Paim (PT-RS) questiona o déficit que o governo diz existir, segundo ele apenas para justificar a Reforma da Previdência, e afirma que a CPI da Previdência trará à luz a realidade dos números da Seguridade Social. “O problema é de gestão, o que não se resolve com nenhuma ‘reforma’”, defende.
Algumas das razões apontadas pelo senador e por representantes dos procuradores e auditores fiscais da Fazenda que compareceram a audiências públicas da CPI do Senado para explicar o déficit são a não cobrança de empresas com dívidas milionárias, desonerações a setores específicos que provocaram uma renúncia de R$ 80 bilhões entre 2012 e 2016 e contribuições sociais utilizadas em outras finalidades que não na Seguridade Social.
Outra questão levantada é a chamada “pejotização” — a prática de contratar o trabalhador como pessoa jurídica, o que diminui a arrecadação tributária. Para eles, a reforma não resolve os problemas como deveria, entre outros motivos, por não incluir os militares e não equqcionar o financiamento da aposentadoria rural.
De acordo com o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, Carlos Fernando da Silva Filho, somente em 2015, mais de R$ 46 bilhões em contribuições previdenciárias dos empregados não foram repassados pelas empresas à União.
O valor que os empregadores deixaram de pagar entre 2012 e 2015 soma, segundo o auditor, mais de R$ 108 bilhões. “O que assusta mais é saber que o número é conhecido pelo governo, porque é declarado pelo devedor. O devedor informa nas guias aquilo que ele recolheu ou que deve, mas não recolheu”, diz.
As entidades dos auditores afirmam que, com ou sem reforma, osproblemas da Previdência tendem a crescer por conta da ineficiência na capacidade de arrecadação, que saiu de um índice de 22% em 2012 para 35% em 2015.
Paim informou ainda que nas contas da Previdência divulgadas pelo governo não são computadas as contribuições sociais, como Cofins, CSLL, e alíquotas sobre as loterias e sobre o PIS/Pasep. “O desvio desse dinheiro do caixa da Previdência transformaria o rombo que o governo alega existir em superávit”, afirma.
Uma dívida que nunca é cobrada
A dívida ativa da União é um dos pontos em destaque em uma das audiência públicas da CPI da Previdência. O senador Paulo Paim (PT-RS) conta que este valor, que se refere a dívidas não pagas ao governo federal por pesosas e empresas, já soma R$ 1,8 trilhão.
Deste montante, R$ 400 bilhões são valores que deveriam ter sido recolhidos à Previdência. “As receitas que deveriam ser destinadas à Seguridade Social são repetidamente sadas para pagar a dívida pública”, adverte o presidente da Associação Nacional de Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), Vilson Romero.
Dados apontam que se as contribuições fossem repassadas corretamente, o total das receitas em 2015 seria de R$ 694 bilhões. A despesa com a Seguridade Social, por sua vez, seria de R$ 683 bilhões.
Com isso, ao invës do déficit alegado pelo governo, haveria, segundo os nímeros dos auditores, um superávit de R$ 11 bilhões. “Por que não cobrar quem deve à Previdência? A impressão que dá é que existe um ‘pacto’ com devedores”, dispara o senador Paulo Paim.
Achilles Linhares de Campos Frias, do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), levantou, em audiência da CPI, a hipótese de que exista um interesse de “privatizar a dívida”. O meio para isso seria a securitização, processo em que títulos da dívida são vendidos ao mercado. Os compradores seriam, principalmente, os bancos — em sua maioria, alías, grandes devedores.