Depoimento de Delgatti Neto na CPMI do golpeLula Marques/ Agência Brasil

Conhecido como "hacker da Vaza Jato", Walter Delgatti Neto, prestou depoimento à CPMI dos atos antidemocráticos do dia 8 de janeiro, nesta quinta-feira, 17. Em meio a declarações polêmicas, ele  citou o envolvimento direto do ex-presidente Bolsonaro, de técnicos do Ministério da Defesa, de Carla Zambelli (PL-SP) e do marqueteiro da campanha eleitoral de 2022 do ex-presidente em articulações para desacreditar o sistema eletrônico de votação; a tentativa de grampear o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes. Delgatti ainda chamou o senador Sérgio Moro (União-PR) de "criminoso contumaz". 
Durante depoimento à CPMI, Delgatti afirmou que se encontrou com Bolsonaro e, na ocasião, ouviu que o governo tinha conseguido grampear o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. No mesmo encontro, segundo o hacker, Bolsonaro teria pedido que ele assumisse a autoria do grampo.
Delgatti disse que a deputada Carla Zambelli intermediou a reunião. "Ela pegou um celular que estava com ela, enviou mensagem a alguém e o presidente da República entrou em contato comigo", afirmou o hacker. "Segundo ele [Jair Bolsonaro], eles haviam conseguido um grampo, que era tão esperado à época, do ministro Alexandre de Moraes. Que teria conversas comprometedoras do ministro, e ele precisava que eu assumisse a autoria desse grampo", acrescentou.
O encontro, segundo o hacker, aconteceu com a promessa por parte de Zambelli de um emprego. "Eu estava desamparado, sem emprego, e ofereceram um emprego a mim. Por isso que fui até eles”, declarou Delgatti. "Lembrando que, à época, eu era o hacker da Lava Jato, né? Então, seria difícil a esquerda questionar essa autoria, porque lá atrás eu teria assumido a 'Vaza Jato', que eu fui, e eles apoiaram. Então, a ideia seria um garoto da esquerda assumir esse grampo", continuou.
Violar urnas
Delgatti afirmou que a deputada Carla Zambelli lhe pediu para invadir órgãos do Poder Judiciário, além de criar um código-fonte falso para abalar a credibilidade das urnas. “Eu faria o meu [código-fonte], não o do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), só mostrando para a população que é possível apertar um voto e imprimir outro. Era essa a ideia”, disse. O objetivo, segundo ele, era apresentar um vídeo com esse conteúdo no 7 de setembro, dia de muita mobilização entre os apoiadores de Bolsonaro.
Esse plano só aconteceu, segundo Delgatti, após o "não" que dado ao então presidente ao ser questionado sobre a possibilidade de invadir o sistema eleitoral de fato. Bolsonaro também teria prometido um indulto caso o hacker fosse pego. O hacker revelou ainda que participou da elaboração do documento das Forças Armadas que questionava o sistema eleitoral. “Eu posso dizer hoje que, de forma integral, aquele relatório tem exatamente o que eu disse, não tem nada menos e nada mais."
Segundo Delgatti, as informações do Ministério da Defesa eram repassadas pelos técnicos da Pasta. “Eles iam até o TSE e me repassavam o que eles viam, porque eles não tinham acesso à internet. Eles não podiam levar uma parte do código; eles acabavam decorando um pedaço do código e me repassando”, explicou.
Sergio Moro: "criminoso contumaz"
Responsável pelo declínio da Operação Lava Jato ao divulgar mensagens trocadas entre Moro e os integrantes da força-tarefa do Ministério Público, Delgatti acusou o ex-juiz de ser um "criminoso contumaz". Moro reagiu dizendo que o hacker é um "bandido" por ter invadido seu celular. O bate-boca começou após o senador citar a condenação de Delgatti por estelionato.
"Relembrando que eu fui vítima de uma perseguição em Araraquara, inclusive, equiparada à perseguição que vossa excelência fez com o presidente Lula e integrantes do PT", rebateu o hacker. Logo depois, Delgatti acusou Moro. "Li a parte privada e posso dizer que o senhor é um criminoso contumaz, cometeu diversas irregularidades e crimes", disse.
Reação de opositores e apoiadores de Bolsonaro
Nas redes sociais, Carla Zambelli se diz feliz ao ver que o tema "proibido da fragilidade das urnas eletrônicas esteja sendo debatido durante todo o dia de hoje na CPMI".
Já Sergio Moro reforçou a condenação por estelionato de Delgatti e disse que se trata de um "indivíduo com extenso histórico criminal".
Os filhos de Bolsonaro — Eduardo e Flávio — e o deputado federalNikolas Ferreira (PL-MG) apontaram a ligação do hacker com a divulgação de uma biografia de Lula, escrita por Fernando Morais. Carlos Bolsonaro não se pronunciou sobre o depoimento. 
O deputado federal Guilherme Boulos (PSOL_SP), apoiado pelo PT na sua pré-candidatura para prefeitura de São Paulo, compartilhou um vídeo antigo em que Bolsonaro fala sobre um "hacker".
Já Lindbergh Farias (PT-RJ) postou um meme do ex-presidente. "Os dias estão contados!"
O ministro da Justiça, Flávio Dino, participou nesta quinta-feira, 17, da primeira reunião dos integrantes do Conselho de Governança da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla). Dino comentou que o depoimento mostrou "várias peças de um quebra-cabeça". "São peças de um quebra-cabeça que estão se apresentando. Eu diria que, tecnicamente, hoje várias peças foram apresentadas a esse quebra-cabeça e essa montagem cabe aos órgãos do sistema de segurança e de justiça, e não a uma ação política".
O deputado federal André Janones (Avante-MG) disse que Moro o surpreendeu. "Estou surpreso que alguém que foi professor de Direito e exerceu a carreira de magistrado não saiba diferenciar calúnia de difamação."
Até o momento, Bolsonaro e o presidente Lula não se pronunciaram sobre o assunto. Alexandre de Moraes também não comentou o depoimento de Delgatti.