Gastão Reis, colunista de O DIA divulgação

Tive a oportunidade de ler uma interessante matéria de Bruno Alfano, publicada em 30/10/2023, sobre a raridade da nota mil nas provas de redação do Enem - Exame Nacional do Ensino Médio. Das 16,5 milhões de redações corrigidas num período de cinco anos, apenas 190 obtiveram nota mil. Ou seja, uma em cada 82 mil. De um modo geral, boas notas não predominam, revelando falhas graves em nosso ensino da língua portuguesa.
As notas dadas pelos professores que corrigiam as redações do Enem foram tema de muita controvérsia. Não teriam um fio condutor capaz de tornar a correção mais objetiva. Por fim, foi publicada uma cartilha com orientações. São cinco pontos: domínio da escrita formal da língua (gramática e grafia correta); não fugir ao tema proposto; saber organizar as ideias; coesão e coerência; e proposta de intervenção (solução para a questão abordada).
Em linhas gerais, é um bom roteiro para aferir a objetividade de um texto. Além disso, as provas passaram a ser corrigidas por dois corretores. Quando a diferença entre as notas supera 200 pontos, é convocado um terceiro para servir de árbitro. Vale ressaltar que as escolas privadas se saem bem melhor do que as públicas. O que estaria por trás de um desempenho tão pífio?
É público e notório o sucesso do método Kumon japonês nas áreas de matemática e português. Além de trabalhar a disciplina e a autoconfiança dos alunos no processo de aprendizagem, ele enfatiza duas práticas: fazer muitos exercícios em matemática e fazer redações com frequência. Simone de Beauvoir, famosa escritora francesa, afirmava que "escrever é um ofício que se aprende escrevendo". Vale dizer que aprender a pensar é um ofício que se aprende ao redigirmos um texto com nossa visão bem fundamentada sobre um tema.
Nas aulas de língua inglesa em filmes ingleses e americanos, a tônica dos professores é sempre focada na análise e interpretação de textos. E na troca de ideias sobre as redações dos alunos. O primeiro exercício leva o aluno a ter competência para acompanhar o pensamento do autor. O segundo desenvolve sua capacidade de pensar por conta própria.
Uma história da vida real ilustra bem essa incapacidade de produzir gente equipada para a sociedade do conhecimento, de que nos falava Peter Drucker. Foi o caso de uma empresária fluminense que resolveu implantar em sua grande indústria a ISO 9000, um conjunto de normas que formam um modelo de gestão de qualidade em todo o processo produtivo e administrativo.
Em determinado momento, a implantação da ISO 9000 empacou. Levou tempo para que se descobrisse que a maioria das funcionárias era funcionalmente analfabeta, apesar de terem escolaridade mínima de oito anos. A implantação do novo modelo foi suspensa por um ano para alfabetizá-las funcionalmente. E só então
concluir a ISO 9000 com êxito.
Conclusão: uma tristeza e uma alegria. A tristeza foi constatar o grau de incompetência do sistema educacional público, que, após oito anos, não consegue que seus alunos consigam ler e entender um manual de instruções. A alegria é ver que pessoas, já adultas, quando submetidas a um ensino de qualidade, respondem à altura, desautorizando qualquer explicação obtusa de incapacidade congênita de aprender.
Digite no Google "Dois Minutos com Gastão Reis: O Desrespeito aos Professores". Ou pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=wUel-PmuI3c.
Gastão Reis
Economista e palestrante