Sabem, amigos, aqueles dias em que a gente já amanhece discutindo com a mesinha de cabeceira? Foi o que aconteceu com o vizinho de boreste. Na quinta-feira, bem cedo, eu varria o quintal quando ouvi a discussão de uma só voz, passando bem rente ao muro do quintal e trovejando provérbios pelos cantos. Ao perceber que ele falava sozinho, ainda arrisquei um bom dia, mas ele retornou com frase uma frase pronta:

- A cobra tá fumando, amigo.

- Mas o que houve?

- Vou pedir asilo na embaixada do sossego. Mas alerto, é bom não cutucar onça com vara curta, porque sou como rapadura, que é doce, mas não é mole.

- Calma aí amigo, vamos conversar....

- Não posso, estou preso a compromissos.

E lá se foi o vizinho, soltando fumaça pelas ventas....

Eta, essa coisa de proverbiar pega!

Terminei os afazeres do lar e pensei: está na hora de convocar o Conselho do Principado pra entender o que tanto está aporrinhando o vizinho.

Usei a sirene olfativa: preparei um café fresquinho e fiz a primeira fornada de rosquinhas. Foi o suficiente. O aroma atraiu a confraria e, logo, os primeiros amigos chegaram ao portão.

Expliquei o problema. Foi Nelson quem tinha alguma pista:

- O que acontece é que o amigo apostou parte do salário naquelas apostas bets, e acabou ficando sem l’argent. Essas apostas viraram febre e hoje tem muito aposentado perdendo o benefício pelo celular. Além do risco de endividamento, não vejo graça nenhuma nisso – comentou.

- Eu gosto mesmo é da brincadeira na praça: porrinhas, jogos de baralho ou damas, entre conhecidos. Tem até mesmo torcida cercando a mesa. Você pode até perder dinheiro, mas é pouco e leva o tempo da brincadeira - comentou Ibiapina.

Mas, nem todo apostador é sério, lembrou Bira, que já ouviu de um perdedor aquela resposta de calar a cuíca: devo, não nego, pago quando puder.

Nessas horas, amigos, é preciso ter nervos de aço.

Ainda estávamos degustando o café com rosquinhas, quando Júlio chegou trazendo ovos de codorna e refresco de groselha. Batata: era aniversário dele e, tradicionalmente, não sei por que, nesse dia, o amigo sempre traz ovos de codorna pra comemorar!

Logo, um assunto juntou com o outro e apostamos quem de nós era o mais velho: deu empate!

Fred, o suíço mais carioca do grupo, mudou o rumo da conversa e contou que gosta mesmo é das apostas no Jockey.

- Eu sempre preferi as corridas de cavalo. Mesmo que não ganhasse um tostão, tinha sempre a adrenalina de acompanhar o páreo.

Isso me fez lembrar o amigo Edu do turfe. Sempre tem um bom palpite para dar aos amigos. Soube que a égua dele anda enamorada por um garanhão cinco estrelas.
Teve um outro amigo, bem mais antigo, do tempo do Derby Club, lembram? Aquele clube de turfe que funcionou no terreno onde hoje está o Maracanã, que, de tanto frequentar aquela arena, resolveu investir em cavalos. Mas só comprava pangaré. Um dia, ao ouvir um apostador caçoar do seu investimento, respondeu: “Não me importa se a mula é manca, o que eu quero é rosetar! ”

Dei corda no gramofone, botei Enrico Caruso, apesar de já saber que não iria agradar. Mas, pelo menos, o povo todo reunido prestaria mais atenção nas conversas.