A advogada Fernanda Pereira é especializada em Direito PrevidenciárioDivulgação

Uma das autarquias mais importantes do país, o Instituto Nacional do Seguro Social é também um dos órgãos federais sob mais pressão nos últimos anos. Se não bastasse o aumento da demanda causado pela reforma da previdência, a pandemia também impôs uma série de novos desafios. Em entrevista a O DIA, a advogada Fernanda Pereira, responsável pela área previdenciária do escritório Stamato, Saboya e Rocha fala sobre as dificuldades que os clientes têm enfrentado: "temos ações cuja tutela foi deferida pelo juiz em setembro, para implementar, com urgência, o benefício acidentário do trabalhador e até agora não foi cumprida".
O DIA: Qual é o cenário atual dos atendimentos a demandas no INSS?
Fernanda: Pesquisas realizadas pelo próximo governo, que assume em janeiro, estimam que haja atualmente mais de 5 milhões de processos administrativos aguardando conclusão – já fora do prazo estipulado por lei, ou seja, já em atraso.
Fala-se em acumulação de processos depois que a análise passou a ser centralizada. O que mudou e a partir de quando?
As diversas mudanças no país desde 2017 — a reforma trabalhista, a reforma da previdência em 2019, e o impacto nas aposentadorias dos servidores públicos — fizeram com que muitas pessoas se aposentassem em um curto período. Isso sufocou drasticamente o sistema, por causa do déficit de pessoal para atender ao aumento da demanda. Na sequência, vivemos o caos da pandemia, que suspendeu as perícias administrativas e os atendimentos presenciais, obrigou a adequação do sistema do INSS e os servidores a trabalharem de forma remota, sem estrutura e treinamento adequados. Tudo isso, somado à greve dos servidores e peritos federais, por três meses este ano, provocou o acúmulo de processos administrativos. E como consequência da paralisação de um grande número de processos administrativos, tivemos um crescimento exorbitante de demandas judiciais.
O INSS passou a ter uma superintendência no RJ apenas em abril. Como está a situação atual no estado?
O direito previdenciário é o tema mais judicializado em varas e tribunais federais de todo o país. Mais da metade do volume processual da Justiça Federal tem essa natureza, colocando o INSS no ranking dos maiores litigantes do país. Conclui-se, portanto, que ainda não ocorreram mudanças ou evolução com relação aos pleitos administrativos dos segurados, sendo a justiça o único caminho. E, mesmo recorrendo à Justiça, há uma grande demora para cumprimento das decisões. Temos ações cuja tutela foi deferida pelo juiz em setembro, para implementar, com urgência, o benefício acidentário do trabalhador e até agora não foi cumprida pelo INSS. No escritório existem processos que estão com mais de quatro meses sem que o INSS tenha cumprido o determinado pela justiça.
O que acontece quando o próprio instituto descumpre uma decisão judicial?
Normalmente, o judiciário aplica multa. Mas isso já não tem surtido o efeito esperado, que é o cumprimento da decisão pelo INSS. O órgão tem ignorado as determinações judiciais, deixando o decurso dos prazos sem nenhuma justificativa para isso.
O governo federal instituiu várias mudanças para coibir fraudes. Qual foi o impacto?
Em 2020, o Regulamento Geral da Previdência foi alterado de forma a criar um programa permanente de revisão da concessão e manutenção dos benefícios. Entretanto, com o atendimento impessoal, dificuldades nos agendamentos presenciais e diminuição dos servidores públicos, acredito que o procedimento, mesmo que obrigatório, não está integrado à rotina administrativa do INSS.
O que acontece com quem precisa recorrer à Justiça para tentar resolver problemas com o INSS?
O volume de processos se reflete em decisões superficiais e na demora extrema na tramitação do processo. E quando se trata de processos previdenciários, estamos falando do bem mais precioso: a vida, a saúde, a verba alimentar. É a dignidade da pessoa, princípio constitucional, que está sendo ferido.
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