Volta do Horário de verão divide opiniõesfoto de arquivo EBC

Mais uma estação se foi sem a companhia do Horário de Verão, mas essa dissociação está com os dias contados. Assim como outras medidas adotadas por Jair Bolsonaro, deve ser revogada pela gestão Lula. Antes de assumir, logo após vencer no segundo turno, o atual presidente fez uma enquete entre seus seguidores do Twitter, em que 66,2% foram favoráveis ao retorno. Ainda como presidente eleito, disse que seria uma das primeiras medidas que tomaria. No entanto, seria inviável a adoção imediata já que a transição de poder ocorreu em pleno andamento desse período especial. 

Ao contrário de outras medidas que garantem e reforçam a popularidade do petista, essa divide a opinião da população. Embora enquetes apontem um pequeno favoritismo pelo Horário de Verão, um pouco menos da metade odeia essa medida.

O adiantar e atrasar o relógio em uma hora tem como justificativa econômica economizar energia e evitar apagões em períodos de pico. Porém, com investimentos no setor elétrico e fora de uma crise hídrica pela seca, já não se faz mais tão necessária como anteriormente ou como ainda se faz presente na realidade de outros países.

Pouca economia
As regiões que adotavam a faixa horária diferenciada ganhavam adicional de luminosidade no fim da tarde, com lâmpadas acesas mais tarde e o acionamento de eletrodomésticos no retorno para casa. Historicamente, a economia era de cerca de 4% a 5% da demanda no horário de pico.

O governo Bolsonaro argumentou, com base em dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que a alta da demanda no verão mudou ao longo dos anos deslocando do fim da tarde para o meio dia, devido ao acionamento dos aparelhos de ar-condicionado nas empresas. Outro estudo do ONS divulgado no ano passado dizia que não foi identificada economia significativa, pois a redução observada na ponta noturna (das 18h às 21h), é compensada pelo aumento do consumo em outros períodos do dia, especialmente no início da manhã.

Histórico do Horário de Verão no Brasil
Foi instituído no país em 1931, sendo repetido algumas outras vezes durante o período Vargas, mas sem a regularidade sazonal. Diante de uma seca radical e com interrupções no fornecimento de energia, voltou em 1985, vigorando até o decreto ser revogado por Jair Bolsonaro em abril de 2019.
Naturalmente, o Brasil, devido às suas dimensões continentais, adotou fusos horários diferentes. Anteriormente, essas diferenças eram ignoradas e o horário da Capital Federal (na época, o Rio de Janeiro) era imposto independentemente da posição geográfica do sol. Somente a partir de 1913, com a assinatura do decreto n° 2.784 pelo presidente Hermes da Fonseca, os fusos começaram a ser respeitados e quatro horários diferentes foram instituídos no país. Durante o horário de verão, as regiões mais extremas, como os estados de Roraima, Rondônia e Amazonas, ficam duas horas à frente de Brasília e o Acre, com três a mais.
Porém, o apelo para a volta do horário de verão nas últimas décadas ganhou outros argumentos além do econômico, principalmente nos segmentos do turismo, entretenimento, comércio e segurança.
Benefícios ao Turismo Relâmpago e Corporativo
O chamado turismo corporativo, que inclui congressos, seminários e encontros profissionais, está voltando a crescer após o fim das restrições da pandemia da COVID-19. Esse tipo de turismo apresenta maior ganho quando sediado em regiões com horário de verão, permitindo aos profissionais aproveitarem as atividades turísticas da cidade com o aumento do tempo de luminosidade. Para os visitantes em lazer, ter mais tempo para aproveitar um país ensolarado pode ser um critério adicional na escolha do destino, principalmente considerando que uma parte dos visitantes pratica o chamado turismo relâmpago. São aqueles que passam apenas um dia, ou metade dele, em uma localidade, geralmente transportados por navios de cruzeiros ou aproveitando as horas entre uma escala e outra de avião.

Os administradores e empresários que atuam em pontos turísticos também defendem o retorno do horário de verão. Os cartões postais tradicionais, como Corcovado, Pão de Açúcar e as praias, são pontos turísticos diurnos que ganham mais tempo de visitação.
"O horário de verão é, sem dúvida, muito positivo para o turismo. Ele garante uma longevidade ao dia, o que é muito interessante para o turista que visita a cidade e busca por atividades ao ar livre. O Rio de Janeiro tem muito a oferecer nesse sentido", disse o presidente-executivo do Rio CVB/VisitRio, Carlos Werneck.

Além de atrair mais pessoas, adiantar o relógio ainda resulta em outros benefícios para o setor turístico.
"O horário de verão é importante para o nosso setor, pois além de economizar energia elétrica e conscientizar as pessoas sobre o uso dos recursos naturais, traz benefícios para o planeta, novos hábitos de consumo, principalmente em atividades ligadas ao turismo, que contam com uma hora a mais durante o dia para receber turistas e clientes, refletindo positivamente em bares, restaurantes, entretenimento, eventos, meios de hospedagem e outras atividades econômicas", defende Guilherme Abreu, presidente da Federação de Conventions & Visitors Bureaux do estado do Rio de Janeiro.

O horário de verão também é aliado dos esportes, aumentando a prática de modalidades tanto aquáticas, como mergulho, natação e canoagem, quanto aéreas, como asa delta e paraquedismo, e até mesmo terrestres, como como futebol, tênis e muitos outros.
Aumento da Segurança
Embora não haja pesquisas significativas, a sensação de segurança aumenta entre a população que passa a circular mais e de forma mais tranquila pelas cidades com mais tempo de luminosidade. No trânsito, segundo um estudo realizado pela Universidade Federal de Pernambuco, entre 2007 e 2013, aponta quedas de acidentes nas estradas federais em até 10% nas regiões que adotavam o Horário de Verão.
Nos setores de entretenimento, como teatros, cinema, além do comércio, restaurantes e bares, o movimento também aumenta. Tanto que a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes pediu o retorno em mobilização junto com outras entidades afins, como a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) e a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce).

“É importante também para o comércio, especialmente o de rua, além da economia de energia”, explica o Carlos Werneck.

Pontos contrários
Tem a outra ponta. Quem madruga, precisa levantar ainda no escuro tendo que ligar as luzes (podendo aumentar o seu consumo), além de acentuar a sensação de insegurança. “Entendemos, no entanto, que o assunto engloba outras questões que impactam, por exemplo, a circulação do trabalhador, que precisa sair uma hora mais cedo de casa, em um horário ainda escuro”, exemplifica Werneck.

Para alguns, a mexida nos ponteiros demora para ser assimilada mantendo-os sonolentos, com queda de produtividade e mudança de humor. Outros alteram o apetite devido a mudança nos horários das refeições. Embora formem uma minoria, existem aqueles que reagem de forma mais intensa aos processos biológicos regidos pela luz. Isso pode desencadear processos depressivos e até alterações cardiovasculares. Embora boa parte apoie por conta do aumento da agitação, os adolescentes costumam ser a faixa que mais sofre com a dança dos ponteiros. Nessa fase etária precisam de muitas horas de sono. Como boa parte estuda de manhã, o levantar mais cedo é uma tortura, influenciando no desempenho cognitivo negativo.

Queda de audiência
A televisão  perde consideravelmente público. A audiência noturna é a que mais sofre com o telespectador demandando para passeios e atividades externas durante esse período. A matutina também perde devido ao levantar mais cedo. Muitos também consideram estranho assistir às novelas noturnas com o sol ainda a pino ou o Jornal Nacional durante o crepúsculo. Até que Bolsonaro travasse os ponteiros com a suspensão do decreto, os relógios eram adiantados em uma hora já em outubro, mais de dois meses antes da chegada oficial do Verão. Se a entrada desse período era um transtorno para os que possuem maior dificuldade de adaptação, o seu atraso, em fevereiro também provocava mais um sofrido período de readaptação.