Por tabata.uchoa

Rio - Sabe quando temos a impressão de que deveríamos ter conhecido uma pessoa há muito tempo, mas o tempo decidiu ser agora? Sabe quando temos a impressão de que determinada pessoa já passou pela nossa vida devido à intensidade ou a uma rápida intimidade que dispensa palavras? Basta um olhar, uma inflexão na voz, uma respiração, um suspiro para entendermos o outro. Para muitos, esses encontros são divinos, estavam escritos em algum lugar, guardado em algum pote de cumprir desejos e realizar sonhos.

Eu gostaria de pensar assim, de acreditar que algo especial esteve guardado para mim, que o homem do andar de cima olhou para o colunista e disse: “Esse é o cara! Ele bem que merece algo diferente”. Mas acredito apenas no acaso. Talvez num acaso com toques de divino, mas um acaso.

Sempre idealizamos uma pessoa que virá completar o nosso vazio%2C combinar a vida dela com a nossaAgência O Dia

Sempre idealizamos uma pessoa que virá completar o nosso vazio, combinar a vida dela com a nossa, tipo “um mata e o outro recolhe o corpo”. E talvez nossas experiências anteriores sirvam para apontar caminhos. O que gostamos mais no outro, o que não gostamos, seja na maneira de agir, ou no modo de beijar, de amar, no cheiro. E assim formatamos a pessoa ideal. Até que ela vem, aparece de onde não imaginávamos, com o nome, o perfume, o cabelo, o jeito de ser e de se expressar totalmente diferente do conjunto perfeito idealizado.

Não é simples identificar um sentimento, ou a possibilidade dele. O mesmo caminho que fazemos, que nos dá experiência, vivência, é o que cansa, que desilude, que arranha nossa pureza. “Viver não é brincadeira não”, diria Paulinho da Viola.

Sou muito fã da música e da poesia de André Abujamra desde Os Mulheres Negras, passando pelo Karnak, até sua carreira solo, de onde pesquei em ‘Elevador’ a inspiração para o nosso papo de hoje. Entre um andar e outro de sua poesia e suas melodias ímpares, ele cria ótimas imagens dos desencontros da vida, dos momentos do quase, daquelas situações limítrofes entre uma noite vazia a mais e o grande amor da sua vida.

“Essa canção é pra você mesmo antes de eu te conhecer/ Será que a gente já se cruzou?/ Eu agachei, você passou/ Desci no 7, você subiu no 8, no mesmo elevador/ Será que a gente mora perto?/ Será que a gente mora longe?/ Onde você está?/ Por que você se esconde?”

É isso, no vai e vem da vida, no barata-voa cotidiano, quantas vezes desviamos um olhar, deixamos de sentir um perfume, de ver uma beleza tão aparente? Fora os desencontros inevitáveis, as trapaças da sorte, é bom estarmos atentos a quem entra no elevador da alma, que nem sempre tem um ascensorista simpático para nos levar ao andar certo.

O que não dá é para viver apertando o botão de emergência diante do inevitável. Correr para escada de serviço a qualquer solavanco do coração pode nos levar à segurança do térreo, da rua de pedras portuguesas e da brisa fresca desse inverno carioca, mas, definitivamente, nos leva para longe da cobertura, da vertigem da aventura, da chance de ver o mundo sob outra perspectiva e voar por aí.

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