Lara Mara diz que UPM deve continuar com enredos matriarcais e que exaltem mulheresS1 Fotografia e Comunicação

Rio - A Unidos de Padre Miguel agora tem uma mulher na presidência e a mais jovem a assumir o cargo. Antes diretora de carnaval, Lara Mara, de 20 anos, tem como principal missão no novo posto levar a escola da Vila Vintém, na Zona Oeste, de volta ao Grupo Especial, depois do rebaixamento deste ano. O Boi Vermelho havia retornado à elite após 52 anos, mas acabou ficando em último lugar na apuração. Em entrevista ao DIA, a presidente falou sobre os desafios e planos para sua gestão, empoderamento feminino e fez críticas ao resultado do Carnaval de 2026.


Lara afirma que assumir o posto de presidente aos 20 anos é um grande desafio, mas acredita que a escolha seguiu um caminho natural. "Eu acredito que é um desafio, assim como foi assumir a direção de carnaval muito cedo. Mas as coisas seguiram seu caminho natural, não esperava ser tão rápido assim, mas já que fui escolhida, estamos aí", brincou Mara, que atribuiu a confiança para estar à frente da agremiação na presença de mais mulheres na presidência. Quando integrava a diretoria, ela era a única mulher.

"Eu acho que a presidência vai ser um pouco melhor que a direção de carnaval, porque eu era a única mulher no posto. Na presidência, graças a Deus, eu tenho outras companheiras comigo, que eu sei que posso contar, que já vieram me estender um apoio. Tenho certeza de que não estou sozinha". A inspiração para comandar a escola vem de Cátia Drumond, presidente da Imperatriz Leopoldinense, quem considera grande amiga. Filha do ex-presidente da escola de Ramos, Luizinho Drumond, ela assumiu o posto quando o pai morreu, em 2020, e foi reeleita em 2024.

"A Cátia é muito minha amiga, tenho muito o que agradecer a ela, sei que nessa gestão eu posso contar com ela. É uma mulher que sempre me estendeu a mão e, com certeza é minha inspiração como gestora", declarou Mara, que destacou a importância da força e união feminina no Carnaval. "Nesse mundo, para a gente não é fácil, não. Com as mulheres mais velhas, ainda se tem um respeito, mas com a gente que é nova, se a gente não se impor, fica difícil". 
Recentemente, Laísa Lima, de 25 anos, filha do lendário diretor de carnaval Laíla, aceitou ser a nova mestre de bateria da Arranco do Engenho de Dentro. Ela foi diretora de tamborins no desfile da Beija-Flor deste ano, em homenagem ao pai. Apesar do cargo ser tradicionalmente ocupado por homens, ela já comandou o ritmo em agremiações na Intendente Magalhães. Com a escola da Zona Norte do Rio, a jovem fará sua estreia no posto na Sapucaí, pela Série Ouro

Presidente atribui rebaixamento da UPM a 'julgamento vicioso'

No Carnaval deste ano, a Unidos de Padre Miguel voltou a desfilar pelo Grupo Especial na Marquês de Sapucaí, depois de 52 anos afastada da elite. A escola cruzou a Avenida com o enredo "Egbé Iya Nassô", sobre a trajetória da africana Iyá Nassô, fundadora do Terreiro da Casa Branca do Engenho Velho, o mais antigo templo afro-brasileiro ainda em funcionamento, em Salvador, na Bahia. Na apuração, no entanto, a agremiação terminou como última colocada e foi rebaixada à Série Ouro, novamente.

Na tentativa de permanecer no Grupo Especial, a UPM questionou as justificativas dos jurados para a perda de pontos, especialmente a nota reduzida no samba-enredo, por causa do "excesso de termos em iorubá", e em função de uma falha técnica no caminhão de som. Na ocasião, a escola defendeu que as palavras estrangeiras eram cabíveis, considerando que abordou a chegada do candomblé ao Brasil, e que garantir o funcionamento do equipamento sonoro não era sua responsabilidade.

O Boi Vermelho chegou a recorrer, mas teve o recurso negado pelo Departamento Jurídico, Direção de Carnaval e Conselho Deliberativo da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa). A agremiação ainda poderia tentar reverter o rebaixamento com a convocação de uma Assembleia Geral mas, apesar de sustentar que o resultado da apuração "não fez justiça" ao que foi apresentado no desfile, no último dia 27, anunciou que desistiria do que chamou de "luta desgastante", para se dedicar ao Carnaval de 2026.

"Acho que ficou muito claro quando negaram o recurso, que a gente não ia ter uma resposta positiva. Estava atrapalhando o nosso projeto para o Carnaval de 2026, a gente não sabia como ia fazer as contratações, porque tem uma diferença do Grupo de Acesso (Série Ouro) para o Grupo Especial, e toda a logística do trabalho. Então, a gente falou: "se é isso, vamos aceitar e fazer um ótimo trabalho para voltar em 2027", apontou Lara. 
"Tudo estava sendo muito demorado, a gente não poderia esperar mais um mês por uma resposta (...) O que me basta como gestora é aceitar, mas engolir fica muito difícil. Só espero que não aconteça mais com nenhuma coirmã, porque é muito triste você ver o trabalho de um ano todo ser jogado no lixo, por causa de uma incapacidade", continuou. 

Para a presidente, a apuração dos desfiles tem se baseado no que chamou de "julgamento vicioso", que trata com diferença as escolas que ascenderam. Assim como aconteceu com a Unidos de Padre Migual neste ano, em 2022, o Império Serrano venceu o Carnaval da Série Ouro, mas acabou rebaixada do Grupo Especial em 2023. Já a Unidos do Porto da Pedra, que ganhou no Acesso em 2023, terminou em último lugar entre as escolas da elite, em 2024.

"Eu acho que o julgamento ainda é muito vicioso na questão da escola que sobe ser vista com outro olhar. Acho que tem que ser revisto, senão vai acontecer o que tem acontecido todo ano: a escola que sobe é a escola rebaixada no ano seguinte. Eu acho que a Liga tem que rever essa questão do julgamento vicioso. Em questão do regulamento, não tenho muito o que falar, porque está uma coisa no regulamento, o jurado faz outra, e a Liga diz que o jurado é soberano. Fica muito complicado", criticou Mara.

Carnaval de 2026 e futuro da UPM

Passados os problemas com os resultados de 2025, a agremiação prepara seu desfile para 2026. De acordo com Lara, o enredo do Boi Vermelho para o retorno à Série Ouro já está sendo desenvolvido e a escola pretende permanecer nos temas matriarcais e que exaltem mulheres. O objetivo, contudo, continua sendo o mesmo dos outros anos: "independente do grupo, o foco é continuar fazendo grandes Carnavais, tenho muita fé que a gente vai continuar mostrando um belo Carnaval para o povo do samba".

Para além da passagem pela Sapucaí, os planos para os próximos anos também estão focados no futuro e legado da agremiação e em contribuir mais com a comunidade da Vila Vintém. "A gente está com um projeto querendo fundar o Instituto UPM, voltado para mais ações sociais dentro da escola. Também estamos querendo fundar a Boizinhos da Vintém, que é um sonho de muito tempo meu e da minha família, que é a escola mirim da UPM", contou.

Neta de Celso Luís Rodrigues, o Celsinho da Vila Vintém, ex-chefe do tráfico, que atualmente está em liberdade condicional, e filha de Cícero Costa, um dos dirigentes e diretor de carnaval, Lara cresceu na quadra da agremiação, tendo passado inclusive pela ala das crianças. Apaixonada pelo Boi Vermelho, a presidente promete quatro anos de muita dedicação e respeito à comunidade da Vila Vintém.

"A minha comunidade pode esperar um mandato de muito amor, carinho e dedicação. Sei que eles confiam muito no meu trabalho e tudo que eu puder fazer pela UPM, vou estar fazendo. Claro, com muito respeito à minha comunidade, porque se eu estou no lugar que estou, é porque a comunidade me botou ali", destacou Lara, que declarou ainda que sempre vai lutar pela escola. 
"Até para a minha família eu mostrei que sou capaz e pude fazer pela UPM, de não me acovardar e poder 'colocar a cara' pela minha comunidade. A comunidade da Vila Vintém sempre vai ter uma pessoa que vai falar por eles diante de qualquer injustiça. Eu já vinha fazendo esse papel, agora estou à frente. Estou muito feliz, muito grata".