Caracas - As novas cédulas de bolívar sem cinco zeros entraram em vigor nesta segunda-feira na Venezuela, a primeira medida de um questionado plano de reforma econômica do presidente Nicolás Maduro ante uma crise devastadora que levou milhões de venezuelanos a abandonar o país.
Tomados pela incerteza, muitos comerciantes fecharam suas lojas no fim de semana em Caracas e em outras cidades, depois de meses de uma economia atingida por uma hiperinflação projetada de 1.000.000% para 2018 pelo FMI, e longas filas nos postos de gasolina ante um anunciado aumento dos preços.
Maduro, confrontado com uma enorme insatisfação popular, garante que a emissão de novas cédulas será o ponto de partida para "uma grande mudança".
A maior nota será de 500 bolívares (cerca de sete dólares no mercado negro).
No entanto, os especialistas consideram inviável um programa que inclui um aumento do salário mínimo de quase 3.500% a partir de 1o. de setembro, um novo sistema cambiário que resultará numa macrodesvalorização e altas do combustível e impostos.
Maduro anunciou que o governo assumirá por 90 dias o aumento salarial que deverão realizar as pequenas e médias empresas.
"É uma coisa de louco", declarou à AFP Henkel García, diretor da consultora Econométrica, ao considerar que o reajuste dos salários implicará um novo aumento da massa monetária, raiz da hiperinflação.
Com uma indústria do petróleo em queda vertiginosa e sem financiamento internacional, o acesso a dinheiro fresco é inviável.
A produção de petróleo - fonte de 96% das receitas - desabou de 3,2 milhões de barris diários em 2008 a 1,4 milhão em julho passado, enquanto que o déficit fiscal se aproxima dos 20% do PIB, segundo consultoras privadas.
"Se você mantém o déficit e a emissão desornada de dinheiro para cobrir esse déficit, a crise continuará se agravando", destacou o economista Jean Paul Leidenz à AFP.
A nova emissão chega apenas 20 meses depois que o governo lançou cédulas de alta denominação, diluídas pela inflação e a desvalorização acelerada.
A reconversão desta segunda é a segunda em uma década, depois que o falecido presidente Hugo Chávez (1999-2013) eliminou, em 2008, três zeros da moeda e criou o "bolívar forte", que agora se chama "bolívar soberano".
Crise regional
A aplicação do programa de Maduro coincide com graves tensões migratórias e o êxodo em massa de venezuelanos. A ONU avalia que 2,3 milhões de venezuelanos imigraram para fugir da crise.
O Brasil enviará tropas a sua fronteira depois que, em reação ao assalto de cidadãos venezuelanos, os moradores da cidade Pacaraima, na fronteira, queimaram no sábado os acampamentos de imigrantes venezuelanos, que chegaram em massa no último ano a Roraima.
A Venezuela exigiu que as autoridades brasileiras protejam seus cidadãos.
O Equador começou no sábado a bloquear a passagem de venezuelanos em suas fronteiras, exigindo passaporte invés de carteiras de identidade.
O Peru adotou medida similar e, em função disso, a Colômbia teve que milhares de venezuelanos tentem entrar em seu território.
Ante o aumento das tensões, o secretário-geral da Organização de Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, pediu para que se "mantenha as portas abertas ao povo da Venezuela, vítima da pior crise humanitária que o continente já viu".
Protestos
Em protesto pelo plano econômico de Maduro, três dos principais partidos de oposição convocaram uma greve de 24 horas para esta terça-feira.
"É um primeiro passo", declarou Andrés Velásquez, da agrupação Causa R, ao assegurar que o objetivo é começar a unificar o protesto social.
Manifestações por direitos trabalhistas, contra a falta de alimentos e medicamentos e as falhas de serviços como água e luz se multiplicam, com uma oposição dividida e fragilizada.
Não está claro como a greve será articulada sem a participação de outros partidos opositores.
O setor privado, além disso, trabalha apenas a 30% de sua capacidade devido ao colapso da economia, enquanto o governo exerce um férreo controle sobre o funcionalismo público.