O CNA, partido do presidente Cyril Ramaphosa, precisará negociar para se manter no poder Gianluigi Guercia/AFP
Partido de Mandela perde maioria que tinha desde o apartheid e terá de negociar
Partidos da oposição saudaram o novo quadro político como uma mudança muito necessária para o país de 62 milhões de habitantes, que é o mais desenvolvido de África
O Congresso Nacional Africano (CNA), partido do presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, perdeu a maioria parlamentar em um resultado eleitoral histórico neste sábado, 1, que coloca a África do Sul em um novo caminho político pela primeira vez desde o fim do sistema de apartheid de governo da minoria branca, há 30 anos.
Com mais de 99% dos votos apurados, o CNA obteve pouco mais de 40% nas eleições que foram realizadas na quarta-feira, 29, muito aquém da maioria que já possuiu desde o fim do apartheid, em 1994, quando Nelson Mandela — que morreu em 2013 — foi eleito presidente. Os resultados finais ainda não foram declarados formalmente pela comissão eleitoral independente que conduziu as eleições, mas o CNA não pode passar dos 50% e por isso não terá maioria. No início das eleições, a comissão disse que declararia formalmente os resultados até domingo, 2, mas os resultados podem ser anunciados mais cedo do que o previsto.
Embora os partidos da oposição tenham saudado o resultado como um avanço importante para um país que luta contra a pobreza e a desigualdade, o CNA continuou sendo o maior partido. Mas terá de negociar para formar uma maioria e reeleger Cyril Ramaphosa para um segundo e último mandato.
"A forma de resgatar a África do Sul é quebrar a maioria do CNA e fizemos isso", disse o principal líder da oposição, John Steenhuisen. O caminho a seguir promete ser complicado para o país e ainda não há qualquer coligação sobre a mesa.
Oposição
O partido Aliança Democrática (AD), de Steenhuisen, obteve cerca de 21% dos votos. O novo partido MK, do ex-presidente Jacob Zuma, que se voltou contra o CNA que chegou a liderar, ficou em terceiro lugar, com pouco mais de 14% dos votos nas primeiras eleições que disputou. O partido Combatentes da Liberdade Econômica ficou em quarto lugar, com pouco mais de 9%.
Mais de 50 partidos disputaram as eleições, muitos deles com pequenas parcelas de votos, mas o DA e o MK parecem ser os mais óbvios para o ANC abordar para possíveis negociações. O parlamento precisa se reunir e eleger um presidente no prazo de 14 dias após os resultados finais das eleições terem sido oficialmente declarados, e as negociações devem ser complicadas
Steenhuisen disse que seu partido centrista está aberto a discussões. O Partido MK afirmou que uma das condições para qualquer acordo era que Ramaphosa fosse destituído do cargo de líder do CNA e presidente da África do Sul. Zuma e Ramaphosa possuem uma forte briga política e o ex-presidente já anunciou que não deve reconhecer os resultados oficiais do pleito.
Economia
MK e os Combatentes pela Liberdade Econômica, de extrema-esquerda, apelaram à nacionalização de partes da economia. Já a Aliança Democrática é uma legenda vista como favorável aos negócios e os analistas dizem que uma coligação do CNA com a AD seria mais bem recebida pelos investidores estrangeiros, embora haja dúvidas sobre a viabilidade desta aliança por conta da forte oposição da AD ao governo de Ramaphosa nos últimos anos.
Uma coligação CNA-AD "seria um casamento de duas pessoas bêbadas em Las Vegas. Nunca funcionará", afirmou Gayton McKenzie, líder do partido menor Aliança Patriótica, à mídia sul-africana.
Apesar da incerteza, os partidos da oposição saudaram o novo quadro político como uma mudança muito necessária para o país de 62 milhões de habitantes, que é o mais desenvolvido de África, mas também um dos mais desiguais do mundo.
A África do Sul possui grandes níveis de pobreza e uma alta taxa de desemprego, de 32%. A pobreza afeta mais os negros, que constituem 80% da população e têm sido o núcleo do apoio do CNA durante os últimos anos. O CNA também foi responsabilizado - e agora punido pelos eleitores - por uma falha nos serviços básicos do governo que afeta milhões de pessoas e deixa muitos sem água, eletricidade e habitação adequada.
Quase 28 milhões de sul-africanos estavam registrados para votar e a participação deverá rondar os 60%, segundo dados da comissão eleitoral independente.
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