opina19dezARTE KIKO

Percebe-se que a preocupação em atender a ampla aliança que elegeu Lula está provocando certa confusão na transição, preocupando setores mais responsáveis da sociedade. Um dos mais antigos ditos populares da história é: “Não é possível se atender a gregos e troianos”. E nosso Nelson Rodrigues já dizia que “a unanimidade é burra”.
A eleição de Lula foi construída em parte com base em sua autoridade no conjunto de forças que orbitam na esquerda brasileira. Carrega a experiência de dois mandatos, de liderança partidária, sabe onde acertou e onde errou. Mas o Brasil é outro e ele precisa ter consciência disto.
Não será possível dar uma no cravo, outra na ferradura. Habilidade não falta a ele, sensibilidade política também. Na campanha, quando viu que Bolsonaro era seu grande eleitor, pouco falou e pouco viajou. Detalhe importante foi quando recomendou que seus aliados não respondessem aos ataques de Ciro e Tebet, “pois estes votos virão por gravidade no segundo turno”.
Bolsonaro deixa o maior pacote de investimentos privados de nossa história. Cumprido o acertado em privatizações e concessões, o mandato de Lula será vitorioso. Haverá geração de emprego e renda, qualidade e produtividade. Na infraestrutura, são muitos os gargalos a serem eliminados. Não deve, portanto, mexer em tarifas, aumentar presença do Estado, interromper entrega da gestão do Porto de Santos ao setor privado.
Alterar estes projetos pode ser fatal para o sucesso do governo e consequentemente colocar o país em crise econômica, social e, claro, política. E as contas estão saudáveis e a gestão pública, em bom patamar, com milhares de cargos suprimidos nos últimos anos. Bolsonaro perdeu pelas bobagens que falou, mas fez poucas besteiras em seu mandato.
Lula tem de deixar mais claro que sua ligação com os países bolivarianos não vai levar a repetir financiamentos que não foram pagos, nem a medidas que levam a crises como as que estes países vivem. Evitar mexer em casas de marimbondos.
Considerando a tradição agressiva de alguns segmentos mais à esquerda de seu partido e de aliados, deve agora com autoridade a primeira manifestação na direção contrária do radicalismo. Não vai dar para temporalizar. A posse está garantida, a eleição reconhecida por todos, precisa agora tranquilizar a sociedade.
As manifestações foram reflexo de uma grande preocupação com o futuro por questões ideológicas. E mostram que haverá reação a qualquer ato de fraqueza diante dos seus radicais. Confronto não ajudará o país a sair da crise com sucesso.
Aristóteles Drummond é jornalista