Chrystina Barros ? Gestora em saúde, Doutoranda em Administração no COPPEAD/ UFRJ e Profissional certificada em Felicidade pela Universidade de Berkeley. Divulgação

A felicidade é uma experiência individual e subjetiva, mas que depende do coletivo e pode ser vista pelo outro. Aliás, eu só me reconheço diferente porque vivo em uma sociedade onde posso me distinguir dos demais. Eu não sou igual.
Mas será que não estamos perseguindo por sermos iguais, quando falamos de uma receita para “ser feliz”? Até porque isso é “fácil”: basta estar bem na foto, ser forte e resistir a tudo e a todos, alcançar um estado elevado de gratidão e desistir jamais, viver sempre avante!
Atendendo ao que requer o modelo de produção capitalista, temos um sonho de consumo utópico de felicidade a conquistar, que vence à meia-noite de cada dia quando surge uma nova postagem em rede social, com um novo produto exclusivo que acaba de ser lançado.
Sobre o “ser forte e não desistir jamais”, isso também fala com o mesmo modelo econômico que exige isso da gente para que continuemos na nossa posição, porque se não for assim, existe um outro concidadão mais produtivo e resiliente para ocupar nosso lugar. “É a regra da vida”, ao menos nos negócios onde as coisas se substituem fácil.
Essa busca por ficar igual à foto da propaganda e não ficar atrás dos que se apresentam fortes e sorrindo, alimenta a indústria consumista que arrecada dinheiro como se felicidade fosse um plano possível – “compre o kit e siga as instruções, mas não esqueça de comprar mais créditos amanhã”.
Há um grande risco de perdermos a nossa autonomia identitária nesse contexto ditador. Neste ponto vale buscar ajuda na filosofia, com a compreensão dos conceitos de hedonismo e eudaimonia. 
O primeiro, hedonismo, nos fala da felicidade imediata, aquela que consumimos agora e assim traz a sensação de um prazer que se esgota quando o consumo acaba. Estar feliz aqui tem prazo de validade.
O segundo, a eudaimonia, se relaciona com o nosso propósito. É pensar na vida, do que nos faz querer levantar da cama, avaliar o saldo ao final de um período. Balanços de relacionamentos, realizações, construções. Ser feliz é uma jornada que tem altos e baixos.
Pensando no conceito de ditadura, quando há imposição sobre a pessoa sem espaço ao livre arbítrio, vivemos sim uma ditadura da felicidade sem nos darmos conta por vezes, tanto para consumir quanto para sobreviver ao nosso próprio trabalho. Em outras palavras, para estamos incluídos nesta sociedade.
Para ser feliz é preciso liberdade, seja da governança de um povo ou da consciência na escolha que fazemos a cada tempo enquanto pessoa.
Viver em uma ditadura seja qual for e ser feliz são verbos que não cabem na mesma equação.
Entre muitos likes em uma rede social ou um epitáfio sincero, eu prefiro que siga escrito – viveu e foi feliz.
Isso é um exercício de reflexão diária, consciência, escolhas, autenticidade e curadoria de tudo que nossos olhos veem. Com tantos estímulos e inteligência artificial cuidando de pessoas como comportamento de gado, um baita trabalho de encontrarmos este caminho em nós.
* Chrystina Barros é gestora em saúde, Doutoranda em Administração no COPPEAD/ UFRJ e Profissional certificada em Felicidade pela Universidade de Berkeley