Claudia Maria Braga de Mello. Médica e secretária de Estado de Saúde do Rio de JaneiroDivulgação

O recente Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ressaltou, na redação e em questões, assuntos ligados à condição das mulheres. Além da invisibilidade do trabalho de cuidado exercido por elas, abordaram o silenciamento feminino e a violência física, sexual e patrimonial que sofrem. Houve ainda perguntas relativas à amamentação e a conceitos de casamento e de parceria. São temas que tratam de aspectos que afetam a saúde delas. E isso tem importância maior para nós, gestores públicos na área de Saúde no Estado do Rio de Janeiro, já que o Censo do IBGE mostrou que o estado tem o maior percentual de mulheres por habitantes no país (52,8%). São elas que mais vão às unidades de atenção primária, mas é baixa a cobertura de exames preventivos do câncer do colo do útero ou de mamografias, por exemplo. Mudar esse quadro é nosso desafio.
É preciso ampliar o acesso a consultas e exames e garantir melhores condições de saúde e evitar ou tratar doenças que, preveníveis ou com tratamentos eficazes, ainda matam muitas. Uma forma é estender o atendimento clínico às mulheres que vão a unidades básicas como acompanhantes e que podem receber orientações e cuidados oportunísticos. Outra medida é a busca ativa por mulheres em idade-alvo para exames de rastreio, contando com a capilaridade e penetração dos agentes comunitários.
São necessárias políticas públicas que facilitem o acompanhamento às trabalhadoras, ampliando o horário das unidades básicas e mantendo-as abertas nos fins de semana. Um exemplo é o Programa Saúde na Hora, com atendimento fora do horário de trabalho. Outra ação que, no Estado do Rio de Janeiro, tem tido sucesso é o uso de equipamentos móveis em exames fora dos grandes centros. Um é o mamógrafo móvel, que faz também ultrassonografias e que tem garantido a milhares de moradores de pequenas cidades e áreas rurais a prevenção e rastreio do câncer de mama. O equipamento é de grande ajuda até onde há esses recursos, pois amplia a capacidade de atender a demanda. Levar aparelhos aos rincões distantes das capitais é dar alternativas a quem não têm como chegar a unidades de saúde.
É importante ainda que seja respeitado o direito, garantido pela Lei 13.767 de 2018, que permite, sem desconto nos salários, até três dias de falta, em 12 meses, para consultas e exames preventivos. Isso é suficiente para que ao menos mulheres de 25 a 64 anos façam o preventivo do câncer do colo do útero a cada três anos, após dois exames anuais, e que as de 50 a 69 anos façam mamografia de rotina a cada dois anos. É preciso também que parentes e rede de apoio estimulem as mulheres a se cuidarem, já que elas, tradicionalmente cuidadoras, negligenciam, tantas vezes, a própria saúde. É necessário que a rede familiar divida tarefas e adote parâmetros que primem pela colaboração, ensinando a crianças modelos de gestão da vida comum e cuidado compartilhado.
Ainda falta envolvimento dos homens no processo. O Movimento Global de Solidariedade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero, o HeForShe, conclama-os a apoiar as mulheres na luta pela igualdade de gênero. Eles não podem estar à margem da discussão da saúde das mulheres. Ao contrário, precisam trabalhar com elas e entre si na promoção de uma sociedade mais saudável, justa e solidária.
Claudia Maria Braga de Mello
Médica e secretária de Estado de Saúde do Rio de Janeiro
Antonio Braga
Médico e coordenador Estadual da Saúde das Mulheres do Rio de Janeiro