Márcio de Jagun é pós-doutor em Ciência da Religião, Professor de cultura e idioma iorubá e autor de oito livros publicados sobre cultura afro-brasileiraDivulgação

O casamento inter-reliogioso em um país laico como o nosso deveria ser a celebração do amor na sua plenitude, com o respeito às diferenças de crença acima de qualquer ideia preconcebida de fé. O preconceito étnico-religioso explica por que os relacionamentos entre casais de religiões diferentes ainda é fonte de discórdia nas famílias. Desde 1890, com a publicação do Decreto 119-A, o Brasil é um Estado laico, contudo, ainda somos um povo extremista em termos de religiosidade. Basta observar que a intolerância religiosa ocorre aqui desde a chegada do colonizador. Indígenas, africanos, asiáticos e europeus não católicos foram e ainda são discriminados por suas crenças.
No período em que o Brasil era ainda um Estado Confessional - antes da laicidade - adotava a religião católica como oficial. Nesta época, casamentos acatólicos não eram civilmente reconhecidos e os não católicos tinham o sepultamento proibido nos cemitérios. Houve avanços, mas temos ainda um longo caminho a percorrer para superarmos mais de meio século de ideias preconceituosas. A dramaturgia tem sido um importante instrumento para desconstruir estereótipos e preconceitos. No teatro, na televisão e no cinema, a temática da diversidade de fé é abordada em produções que levam o público a refletir e repensar comportamentos.
Em quaisquer relacionamentos afetivos, assim como em todos os convívios sociais, precisamos perceber e evitar que preconceitos, discriminações e intolerâncias interfiram nas relações. O amor verdadeiro respeita a liberdade de escolha. Essa é a busca de todos que lutam por um final feliz também na vida real. Casais que se unem em matrimônio, apesar de terem crenças diferentes, precisam exercitar dentro de casa o respeito. Reclamar ou mesmo tentar impedir que o companheiro ou companheira participe de um ritual religioso gera desentendimentos, que poderiam ser evitados.
A liberdade de crer e de não crer é um direito fundamental e está diretamente associada à dignidade humana. Como pensar uma relação de namoro ou casamento sem que a dignidade de um dos parceiros seja considerada? A felicidade do relacionamento será sempre abalada quando a liberdade de crer não fizer parte da equação. Companheirismo está atrelado à respeito e compreensão. Ninguém precisa trocar de time ou da religião para se relacionar. Isso é anulação e não amor. Compreender o outro é fundamental para a boa convivência. A meta é o altruísmo e não o egoísmo. Aliás, quando o casal pratica religiões distintas, não há necessidade de encarar esse fato como "divergência", mas como natural "diversidade". As pessoas são diversas, logo os casais jamais serão idênticos. Os grandes ícones religiosos jamais brigaram por seguidores. Jesus, Buda, Alá, só para citar alguns, nunca incentivaram conflitos. As maiores guerras a serem vencidas dizem respeito à ignorância, ao preconceito, ao egoísmo e ao desamor. Neste Dia dos Namorados, vamos celebrar a união de almas e do respeito às diferenças. O amor sempre vence!
* Márcio de Jagun é pós-doutor em Ciência da Religião, Professor de cultura e idioma iorubá e autor de oito livros publicados sobre cultura afro-brasileira