Para quem escrevo uma carta perguntando as perguntas que significam a vida?

Para quem escrevo uma carta com as fotografias ou, talvez, os filmes dos dias que vejo?

Vi crianças deixando a vida antes de a vida deixar as crianças viverem a vida. Vidas interrompidas por bombas de ódios que explodem os horrores da ambição desmedida. A insana guerra. A guerra que começa, que desorganiza os dias, que nos inícios traz sensibilidades, incômodos e que, depois, com elas se acostumam os que dela não fazem parte.

Fazemos parte. Fazemos parte da mesma humanidade em que prosseguem irmãos nossos morrendo nas guerras. A medida da vida está no selo da paz que busco para enviar a carta com as perguntas que me perguntam se eu nada posso fazer.
Vi uma mãe gritando a dor mais doída do mundo com o filho se despedindo do mundo. O corpo sem vida. A vida sem o corpo daquele menino. Lágrimas de mães doem em mim e me fazem querer escrever a carta com o selo da paz.
Onde se fabricam os selos que selam as cartas? Onde se fabricam os ódios capazes de selar destinos, de antecipar partidas, de roubar futuros?
As guerras guerreiam de informações incorretas o mundo. Sempre foi assim. Informações que chegam sem o selo da paz. Porque se há alguma coisa que eles não se preocupam é com a paz.
Há outras guerras, nos cotidianos de dor das famílias. O que será dos amanhãs de crianças espancados dentro de casa? Já no broto, o desgosto. Já no broto, a incompreensão do dual do humano.
Porque na carta com o selo da paz também direi do que alimenta de esperança os dias. Das lágrimas de emoção. Das mãos que oferecem ajuda. Dos dizeres que dão aconchego. E dos aconchegos tantos que retiram dores e que oferecem cimento de amor para construção de novas vidas.

Conheci Teresinha e suas crianças, antes desassistidas. Conheci João e seus velhinhos cheios de cuidados. Conheci Priscila e seus alunos com ou sem deficiência vivendo a dignidade e a alegria dos dias. Conheci e conheço fazedores de selos da paz. Em profissões diferentes. Em diferentes lugares do mundo. Do mesmo mundo onde as guerras prosseguem nos convidando a demitir a esperança.
Não demito. Ela mora em mim. E é ela quem me faz querer escrever uma carta. Uma carta em busca de um destinatário. Até sei alguns nomes que gostaria que lessem essa carta. Alguns líderes que não são líderes. Alguns detentores do poder de conduzir nações. Conduzem nada. Ódios não são condutores. São bloqueadores da harmonia do viver.
Para quem escrevo uma carta perguntando as perguntas que significam a vida? Para mim mesmo? Para os que lerão em mim alguma paz? Para as minhas possibilidades cotidianas de levar paz comigo?
Quero a leveza de chegar nos lugares oferecendo vida e não morte. Quero a bondade necessária de não desconsiderar ninguém que vive comigo, mesmo que por alguns instantes. Mesmo que em um lugar de movimentos e de desatenções. Quero ser a atenção que explica os textos mais bonitos que podem uma carta guardar.
Guardo em mim outras cartas que me escreveram e que me fazem querer escrever. As letras de bondade nascidas de tantos encontros na minha vida me fazem querer cessar o que impede irmãos meus de também encontrarem um selo de paz para escreverem suas cartas.
As crianças que morreram e morrem nas guerras não puderam e não podem escrever cartas... e sequer conheceram, conhecem o selo da paz.