Bernardo Egas é ambientalista e ex-secretário do Meio Ambiente do município do Rio de JaneiroDivulgação

Os recentes incêndios florestais, que vêm ocorrendo Brasil afora, apenas comprovam a influência das mudanças climáticas em nosso dia a dia. Enquanto o país enfrenta a pior seca da história, o fogo se alastra por diversos biomas, da Amazônia ao Pantanal. Dados do World Weather Attribution (WWA), um grupo de cientistas de diferentes países que investiga os efeitos das mudanças climáticas sobre o clima extremo, indicam que o mês de junho no Brasil foi o mais seco, quente e ventoso desde o início dos registros, em 1979.
A ONG World Resources Institute relata que os incêndios florestais estão piorando por todo o mundo, destruindo duas vezes mais árvores do que há 20 anos. E, de acordo com relatório do Programa Ambiental da ONU, a ocorrência desses incêndios deverá aumentar em 30% até 2050.
O recente estudo “Green spaces provide substantial but unequal urban cooling globally“, publicado em Nature Communications, destaca ainda uma outra questão: a falta de infraestrutura verde e seus efeitos desiguais no resfriamento urbano nas cidades do Sul Global - que é o caso do Brasil. De acordo com a pesquisa, as cidades do Sul Global - têm apenas dois terços da capacidade de resfriamento das cidades do Norte Global.
O dado é alarmante, especialmente para cidades como o Rio de Janeiro, que enfrentam um calor intenso e crescente devido ao efeito de "ilha de calor urbano". O estudo revela que a vegetação urbana pode reduzir a temperatura da superfície em até 3°C durante as estações quentes, já que árvores e outras plantas agem como reguladores do clima ao absorverem dióxido de carbono e liberarem vapor no ar através de um processo chamado evapotranspiração. Esse é um diferencial que pode ser significativo em condições extremas.
A pesquisa, conduzida por uma equipe internacional de pesquisadores, mostrou que a quantidade e a qualidade da vegetação urbana são fundamentais para o resfriamento das cidades. Cidades em regiões tropicais e subtropicais, como o Rio de Janeiro, frequentemente têm capacidade de resfriamento mais fraca. Isso se deve à menor quantidade e eficiência dos espaços verdes, exacerbando o impacto do calor extremo em áreas mais vulneráveis da cidade, como as comunidades mais pobres.
A disparidade no resfriamento urbano não é apenas uma questão de conforto, mas também de saúde e segurança. A falta de áreas verdes adequadas aumenta o risco de doenças relacionadas ao calor e pode ter consequências fatais para os moradores. Em um cenário onde as temperaturas continuam a subir, é imperativo que as políticas públicas abordem essas desigualdades e promovam soluções de resfriamento eficazes para todos os cidadãos.
Para melhorar a qualidade de vida dos cariocas, é preciso fomentar a expansão e gestão eficiente de espaços verdes na cidade. Precisamos de políticas públicas que promovam uma arborização urbana mais equitativa e inclusiva, garantindo que todos os bairros e comunidades, independentemente de sua renda ou localização geográfica, tenham acesso a áreas verdes e espaços arborizados. Além disso, acredito que iniciativas de jardins verticais e telhados verdes possam ser uma solução inovadora para áreas densamente urbanizadas.
Diante da importância do assunto, a criação de ações que incentivem a expansão da infraestrutura verde e a proteção dos espaços existentes deveriam ser um compromisso de cada político com o cidadão carioca. Somente com políticas públicas cada vez mais assertivas, vamos avançar neste quesito, garantindo que o Rio de Janeiro não apenas enfrente o desafio do calor extremo de maneira mais equitativa, mas também se torne um exemplo, de como cidades do Sul Global podem se adaptar e prosperar em um clima em
mudança. É voltando nosso olhar para a questão ambiental que conseguiremos proteger, de forma efetiva, a saúde pública e promover um futuro mais saudável para todos.
*Bernardo Egas é ambientalista e ex-secretário do Meio Ambiente do município do Rio de Janeiro