Claudia CataldiDIVULGAÇÃO

Não faz tanto tempo assim a fotografia era uma arte envolta em mistério e paciência. Dependente de câmeras analógicas carregadas com filmes Kodak, exigia que aguardássemos ansiosamente por sua revelação, sem a possibilidade de visão instantânea do resultado. Esse processo, embora encantador à sua maneira, limitava nossa capacidade de interagir diretamente com a imagem capturada. A espera era parte do encanto, mas também uma barreira que nos distanciava do imediatismo e da gratificação súbita.
Com a chegada das câmeras digitais e, posteriormente, dos smartphones, a maneira como encaramos e vivemos a fotografia passou por uma transformação radical. Não apenas conseguimos ver e selecionar nossas fotos imediatamente, mas também nos tornamos os principais sujeitos de nossas próprias lentes. O advento das selfies revolucionou nossa relação com a fotografia. Antes, a ideia de virar a câmera para si mesmo era praticamente inexistente. A fotografia era uma janela para o mundo, uma forma de capturar o que estava ao nosso redor, e não necessariamente de nos colocar no centro da imagem.
Essa mudança não é apenas tecnológica, mas cultural. As selfies, ( no Brasil 93 milhões de selfies são tiradas todos os dias. Fonte: Express VPN), representam uma nova maneira de nos vermos e nos apresentarmos ao mundo. Elas são um reflexo de uma sociedade cada vez mais focada no indivíduo, na autoexpressão e na autovalidação. Passamos a com um simples clique, compartilhar nossa imagem com o mundo inteiro, recebendo feedback quase imediato através de curtidas e comentários. Essa dinâmica alterou profundamente nossa percepção de identidade e autoimagem.
A facilidade com que tiramos e compartilhamos fotos transformou a fotografia em uma nova forma de comunicação. Momentos antes considerados triviais agora são imortalizados e compartilhados. As refeições, os passeios, os encontros com amigos – tudo se tornou um cenário potencial para uma fotografia que pode ser editada, aprimorada e postada nas redes sociais. A fotografia deixou de ser apenas uma arte para se tornar uma linguagem universal, acessível a todos e usada para narrar vidas em tempo real.
Porém, essa nova forma de viver a fotografia também levanta questões sobre autenticidade e presença. Estamos realmente vivendo o momento ou apenas capturando-o para exibição? A incessante busca pela foto perfeita pode nos distrair da experiência em si, transformando momentos significativos em simples oportunidades para a criação de conteúdo.
Ainda assim, não há como negar o poder transformador da fotografia moderna. Ela nos permite revisitar instantaneamente memórias, compartilhar experiências e conectar-nos com pessoas em outros continentes. A fotografia se tornou uma parte intrínseca de nossa narrativa pessoal e coletiva, moldando a maneira como vemos o mundo e como o mundo nos vê.
A forma de registrar sentimentos e a vida também mudou dramaticamente. A paciência de outrora deu lugar à instantaneidade, e a janela para o mundo se transformou em um espelho. Vivemos em um tempo onde a fotografia é tanto um reflexo de nossa identidade quanto uma ferramenta para explorá-la. E se formos atentos o suficiente para usar a modernidade em nosso favor, podemos aceitar o desafio moderno de, ao olharmos nossa foto, buscarmos ver além de nossa imagem, explorando justamente o que existe de mais belo, dentro de nós!
* Claudia Cataldi é Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais, formada em Jornalismo, Publicidade, Tecnologia em Processamento de Dados e Direito