Márcio Ayer é presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio do Rio de JaneiroDivulgação

A redução da jornada sem corte de salários é uma luta histórica da classe trabalhadora mundial, impulsionada nos últimos anos pelas profundas transformações demográficas e tecnológicas da revolução digital. A Espanha, por exemplo, aprovou agora em fevereiro a redução de 40 para 37,5 horas na jornada semanal, medida que vai beneficiar mais de 12 milhões de trabalhadores do comércio, alimentação e agricultura.

Alguns países já adotaram jornadas de trabalho reduzidas, de quatro dias na semana, como a Bélgica e o Chile, e vários outros estudam seriamente a mudança, como Holanda, Reino Unido, Portugal, Islândia e Noruega. O debate também ganha força no Brasil, mas avança com dificuldades devido às características do nosso mercado, marcado pela informalidade, precariedade e investimentos insuficientes em desenvolvimento e inovação.

A pesquisa 'Escala 6x1 e redução da jornada de trabalho', apresentada recentemente pelo Dieese, trouxe importantes elementos para a discussão. Ficamos sabendo, por exemplo, que dos 110 milhões de trabalhadores que compõem a População Economicamente Ativa (PEA) do Brasil, metade tem jornadas superiores a 40 horas semanais. Um percentual que varia de 49%, entre os que têm carteira assinada, a 54,51%, entre os informais.

Dentre os assalariados, não por acaso, os que trabalham mais de 40 horas semanais são exatamente os mais jovens (76% têm até 29 anos) e os que não foram além do ensino fundamental (80%). A maioria ganha até dois salários mínimos (76%) e trabalha na iniciativa privada (84%), em empresas com até 100 funcionários (85%), sobretudo no comércio, na indústria de transformação ou em atividades administrativas.

Outro estudo, do Observatório Social do Estado Brasileiro, revela quais profissões concentram o maior número de vínculos formais acima de 40 horas semanais no Estado do Rio. São elas as dos repositores de mercadorias, atendentes de lojas e mercados, operadores de caixa, vendedores do comércio varejista, auxiliares de escritório, assistentes administrativos, faxineiros e motoristas de caminhão.

Subrepresentado na política, o perfil do profissional que trabalha acima de 40 horas faz com que a pauta tenha dificuldades adicionais para avançar no Congresso. Ainda assim, há iniciativas legislativas importantes para acabar com a escala de seis dias de trabalho por apenas uma folga semanal – denominada escala 6x1.

O atual limite da jornada no Brasil, fixado em 44 horas semanais, é totalmente incompatível com o equilíbrio entre trabalho e vida privada, comprometendo a saúde física e emocional dos trabalhadores. Quadro que tem piorado ainda mais com o surgimento de tecnologias que substituem trabalhadores em grande número, acirrando ainda mais a concentração de renda e as desigualdades sociais.

Nada justifica que a ganância e o lucro estejam à frente do bem-estar e da saúde das pessoas. Felizmente, os benefícios da redução de jornada sem corte de salários têm sido comprovados na prática e de forma inegável. Quem está empregado ganha mais qualidade de vida. Quem está fora do mercado é favorecido com novos empregos. Quem emprega tem ganhos de produtividade. E a sociedade como um todo é beneficiada com o aumento da massa salarial, do consumo e do bem-estar da população, fatores que estimulam o desenvolvimento econômico do país.
* Márcio Ayer é presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio do Rio de Janeiro