Rio - A Polícia Civil realiza, nesta terça-feira, operação para desarticular uma quadrilha que explora casas de prostituição e a facilitação para prostituição de menores de 18 anos em São Gonçalo e Maricá, na Região Metropolitana. São, ao todo, seis mandados de prisão preventiva e 10 de busca e apreensão, expedidos pela 2ª Vara Criminal de São Gonçalo. Duas pessoas foram presas, entre elas o ex-policial civil Alzemar da Conceição dos Anjos, que liderava o esquema criminoso.
A operação Saigon II é um desdobramento da ação desta segunda-feira, que combateu o jogo do bicho em São Gonçalo. Durante as investigações, que durou um ano e meio, foram descobertas as ligações de policiais com o crime na região, inclusive com prostituição infantil.
Segundo as investigações, a organização criminosa liderada por Alzemar atuava de forma estruturalmente ordenada e com divisão de tarefas em duas casas de prostituições em São Gonçalo e outra em Maricá, com o objetivo de obter, direta e indiretamente, vantagem financeira. Um terceiro espaço funcionava em São Gonçalo e estava desativado. O ex-policial, expulso em 2017 por envolvimento com prostituição, foi preso no bairro Trindade.
Alzemar cuidava de todo o funcionamento da atividade ilícita, contratando as garotas de programa, controlando a parte financeira, determinando as funções dos demais denunciados, cuidando dos pagamentos dos salários, "programas", de comissões e da compra de bens de consumo para o exercício da atividade fim.
O ex-policial era lotado na 127ª DP, em Búzios, até ano passado e já atuou em diversas distritais nos mais de 20 anos de Polícia Civil. Ele era conhecido por colegas na instituição como "Cafetão", por conta de sua ligação com casas de prostituição e chegou a ser arrolado como testemunha em uma das batidas em um dos espaços, já que até então não se sabia do seu real envolvimento.
Também foi presa Jaqueline Nascimento de Almeida Santos. Segundo a polícia, ela fazia parte da quadrilha, mas também se prostituía. Sua função era aliciar mulheres e menores para fazer programas, com a promessa de que "mudariam de vida". Os presos na operação estão sendo levados para a Corregedoria da Polícia Civil, no Centro do Rio. Outras denunciadas são Rose Moura da Silva e Viviane de Oliveira Alcântara, que com Jaqueline eram gerentes das casas, entre outras funções.
O filho do ex-policial Alzemar, que ainda não teve o nome divulgado, ocupa um cargo de gerência na quadrilha, respondendo diretamente ao pai. Abaixo de "Cafetão" ficava José Goulart Feijó Maia, o Dinho, responsável pela parte administrativa da atividade criminosa e apontado como o "faz tudo". Ela fazia o transporte das garotas para as casas de prostituição, remanejamento delas entre as boates e negociação de bens de consumo para os estabelecimentos.
Menores eram chamadas de 'sapatinhos pequenos'
A Corregedoria da Polícia Civil descobriu que o grupo aliciava menores carentes de São Gonçalo e região — com a promessa de uma vida melhor. No entanto, ao chegarem aos locais as vítimas se deparavam com outro tipo de realidade: a exploração sexual e até agressões físicas e verbais.
"Percebemos, durante as investigações, que as vítimas contraiam dívidas e eles dificultavam suas saídas de lá. Uma delas, inclusive, no mês passado, chegou a ficar 20 dias em cárcere privado. Eles mantinham as vítimas em condições subumanas", disse Cristiano Maia, sub-corregedor da Polícia Civil. "É triste, mas a Polícia Civil vai continuar cortando na própria carne", avisou, sobre a prisão do ex-policial.
Para dificultar a identificação da exploração sexual de meninas de 16 e 17 anos, os integrantes da quadrilha se referia as adolescentes como "sapatinhos pequenos". Menores e mulheres eram obrigadas a se prostituirem e até eram ameaçadas caso quisessem sair das casas.
Durante um ano e meio, a quadrilha foi monitorada pelos policiais e pelo MP. Em determinado dia do ano passado, a Corregedoria flagrou o momento em que uma mulher, que acabará de ser aliciada, chegando a uma das casas de prostituição.
A denúncia narra ocasiões em que Alzemar alerta seus comparsas sobre a presença de policiais da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) na região, os orientando a retirar as menores da sua casa de prostituição. A quadrilha também usava armas de fogo para intimidar quem representasse qualquer ameaça.
Espaços com péssimas condições
Nos locais, os agentes encontraram péssimas condições de higiene e as exploradas dividiam o espaço com obras. Em uma delas, um aviso intimidada as meninas. "Cada nojenta é responsável pela limpeza e higiene do seu quarto", diz um trecho do aviso, escrito com caneta em um pedaço de papel e colado na parede. Também foi encontrado em uma das casas uma pequena central de monitoramento, onde eles controlavam quem entrava e quem saía.
"Elas eram mantidas em condições subumanas. O que se viu lá foi um local em que o ser humano não poderia sobreviver naquilo", disse o promotor Antonio Pessanha, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Rio, responsável pela denúncia.
A ação é realizada pela Polícia Civil, através da Corregedoria Interna (Coinpol), em conjunto com a Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Estado de Segurança e o Ministério Público do Rio (MPRJ).